Taxa de juros e cultura do gasto no Brasil
BERNARDO SANTORO*
A notícia de que a taxa de juros SELIC aumentou mais meio porcento neste mês, indo a 9,5% ao mês e fazendo o Brasil ter a maior taxa de juros real do mundo é uma notícia importante e nem um pouco surpreendente, visto que o governo brasileiro tem por hábito tentar controlar a inflação através de suas consequências, e não de suas causas.
Tem algo que deve ser focado nesse problema: a criação de uma cultura brasileira do consumo feita pelo governo. Vou escrever esse texto em linguagem simples e didática.
A taxa de juros é quanto custa para alguém pegar um empréstimo, e quanto maior a quantidade de dinheiro disponível para empréstimo, mais barato ele fica. Funciona aqui a lei de escassez como em qualquer outro produto. Quanto mais tem dele, mais barato seu valor.
Em uma sociedade muito rica em que várias pessoas poupam dinheiro, o empréstimo tem taxa de juros baixo, pois tem mais gente querendo emprestar dinheiro que pegar emprestado. Essa competição ajuda o consumidor a conseguir dinheiro barato.
Já em uma sociedade pobre, onde não tem muito dinheiro disponível para empréstimos, os juros são altos, pois tem mais gente querendo pegar dinheiro emprestado que emprestando.
O Brasil é um desses casos. A falta de poupança no Brasil está intimamente ligada à sua pobreza. Como sobra pouco no fim do mês, brasileiros não conseguem poupar muito. E o Brasil, dado o seu baixíssimo PIB per capita, aliado à sua tradicional desigualdade social, é marcado por um imenso contingente de pobres não-poupadores.
Mas esse é só um lado da história. Além da nossa pobreza, tem outro fator histórico que compeliu e compele brasileiros a gastar todo o seu dinheiro ao invés de poupar algum para o futuro: a inflação.
As pessoas conhecem inflação como o aumento geral de preços. No popular, “está tudo muito mais caro”! E o único jeito de TUDO estar mais caro é se alguma coisa que influencia em todos os preços estiver diferente. A única coisa que está em praticamente todas as transações comerciais é o dinheiro. Portanto, 99,9% das causas da inflação está no governo, quando ele aumenta a quantidade de dinheiro na economia, diretamente (através do Banco Central) ou indiretamente (através dos bancos estatais e privados).
Lembro que dinheiro é um produto como outro qualquer, onde funciona a lei de escassez, e se tem muito dinheiro circulando, seu valor unitário diminui. Se tem pouco, ele valoriza. A inflação é exatamente isso: o governo valorizando ou desvalorizando dinheiro através da regulação da sua quantidade.
O Brasil é, historicamente, um país inflacionista. O governo criava dinheiro para pagar suas contas, desvalorizando o dinheiro de todo mundo. O povo brasileiro, diante dessa realidade, passou a gastar todo o salário assim que recebesse, pois sabia que se guardasse o dinheiro, no dia seguinte o governo o desvalorizaria para pagar suas próprias contas.
Então o governo acabou por criar uma cultura de gasto frenético no Brasil por causa da inflação. O povo, que já era pobre, se não gastasse tudo imediatamente, ficaria mais pobre depois. A cultura do consumo imediato criada pelo governo ao longo de décadas cobrou seu preço, e o brasileiro simplesmente não tem o hábito de poupar.
Isso tem um efeito devastador na taxa de juros. Como vimos mais acima, sem poupança não tem dinheiro para ser emprestado, então o custo do dinheiro sobe. É natural que em uma economia com pouca poupança, como a brasileira, as taxas de juros sejam altas, justamente para estimular as pessoas a serem poupadoras.
Quando o governo resolve diminuir de maneira violenta e artificial a taxa de juros, tal como fez durante muito tempo, as pessoas passam a poupar cada vez menos e a gastar cada vez mais, dilapidando as reservas de poupança e aumentando, assim, a quantidade de dinheiro circulante, o que gerou o efeito inflacionário, mas deu às pessoas a sensação de maior bem-estar.
Além da poupança nacional, o governo começou a gastar também poupança internacional através de empréstimos e investimentos estrangeiros, aumentando assim nossa dívida.
Toda essa ação política nos levou aonde estamos agora, com a riqueza nacional exaurida e aumento da dívida interna e externa. Com isso o governo se viu obrigado novamente a aumentar os juros, de forma a ver se consegue aumentar a poupança nacional e frear a inflação. E é isso que está por trás desse aumento de ontem.
O grande problema é que o próprio governo já criou essa cultura do gasto desmedido no povo. Como querer agora que os brasileiros ajam de maneira distinta da que foram treinados a fazer durante várias gerações?
E o que é pior: bastará a poupança nacional se restabelecer um pouquinho para o governo entrar na onda de gastança com juros baixos outra vez. Afinal, a cada dois anos tem eleição e as pessoas precisam se sentir bem para votar na gangue de plantão.
*DIRETOR DO INSTITUTO LIBERAL