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Sobre ganância, egoísmo e interesse próprio no capitalismo

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Desde que o personagem de Gordon Gekko, no filme Wall Street, proferiu a famosa frase “A ganância é boa!”, alimentou o mito difuso e amplamente repetido de que o capitalismo é baseado na ganância. A mensagem subjacente do diretor socialista Oliver Stone é que, se o capitalismo é movido por um desejo pecaminoso (ganância), então ele deve ser rejeitado como um sistema imoral.

Tal equívoco também prevalece no mundo cristão, onde pregadores como o Papa Francisco insistem que o princípio da ganância é intrínseco ao moderno sistema capitalista. Não por acaso, muitos cristãos bem-intencionados, com uma preocupação genuína pela caridade e a solidariedade, se veem atraídos pela retórica anticapitalista de líderes como Francisco.

Não é de admirar, portanto, que muitas pessoas hesitem em abraçar o capitalismo, enquanto os cristãos em particular têm dificuldade em entender como um sistema alimentado pela ganância pode ser compatível com os princípios bíblicos.

No entanto, a afirmação de que somos movidos apenas pelo egoísmo, e que isso é uma coisa boa, é completamente equivocada. A ganância nunca é boa. Mas antes de cairmos na esparrela sobre sistemas econômicos alternativos, devemos entender que nenhum sistema pode contornar a natureza humana, por isso a cobiça e o egoísmo terão sempre um papel em qualquer estrutura social. Que tipo de papel será esse dependerá de cada estrutura particular.

Como as transações comerciais dependem fundamentalmente de confiança e cooperação, a ganância incontida tem potencial para minar qualquer sistema econômico. O capitalismo, porém, canaliza a ganância para fins produtivos, fornecendo meios para os indivíduos obterem lucros através da produção e da troca, em vez do roubo e da pilhagem. A ganância, por assim dizer, é menos destrutiva sob o capitalismo.

Entretanto, há um grave erro conceitual que acaba colaborando para minar a boa imagem do capitalismo. Trata-se da interpretação equivocada do conceito de “interesse próprio”.

Foi Adam Smith quem argumentou: “Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que devemos esperar nosso jantar, mas do seu cuidado com os próprios interesses.” O interesse próprio também desempenha um papel de protagonista nos trabalhos de John Locke e David Hume, mas nenhum desses filósofos o enxergou como sinônimo de egoísmo ou ganância.

Em vez disso, eles entenderam que o interesse próprio era a motivação subjacente à maioria das ações humanas. O interesse próprio não é em si mesmo imoral.

Por outro lado, como o capitalismo é baseado no interesse próprio, isso significa que as pessoas só se envolvem em transações econômicas quando estas são mutuamente benéficas. Assim, quando Adam Smith compra carne do açougueiro, ele o faz por acreditar que a carne é mais valiosa para ele do que o dinheiro que paga por ela. Ele não é forçado a comer ou comprar a carne. Ele compra porque isso lhe é benéfico. Da mesma forma, o açougueiro também vende a carne de bom grado. Ele vende a carne porque acredita que o dinheiro é mais valioso do que a carne que está vendendo.

O interesse próprio, corretamente concebido, portanto, diz respeito à autopreservação, à responsabilidade e ao aumento da qualidade de vida. É o interesse próprio que nos motiva a levantar e ir trabalhar, cuidar de nosso lar, cuidar de nossos filhos, buscar educação, escovar os dentes, malhar na academia e seguir ordens médicas. O desejo natural e o motivo central da ação humana é simplesmente melhorar a nossa condição.

Não há nada de errado em buscar reconhecimento por um trabalho bem feito, na esperança de uma promoção, desde que isso seja feito sem prejudicar os colegas de trabalho. Não há nada de errado em acumular riqueza, nem tampouco poupar economias em investimentos financeiros a juros.

Somente quando entendemos o interesse próprio dessa maneira, somos capazes de entender a justiça, a moral, a ética, a economia e as relações comerciais sob o capitalismo. O argumento de que este é baseado na ganância é um “espantalho”, que além de ser impreciso, sugere que os sistemas alternativos são de alguma forma melhores. Corrigir esse mal-entendido é um importante passo para a união dos valores cristãos e da livre iniciativa.

Em resumo, a ganância busca o benefício próprio às custas dos outros. É uma parte da natureza humana – um fato reconhecido e atenuado pelo capitalismo. Contudo, uma economia capitalista não é baseada na ganância ou no egoísmo, mas no interesse próprio.

 

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João Luiz Mauad

João Luiz Mauad

João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta do Povo.

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