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Resenha do livro “As Seis Lições”, de Ludwig von Mises

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O livro As Seis Lições de Ludwig von Mises é um compilado de textos transcritos de suas palestras ministradas durante sua visita na Universidade de Buenos Aires, na Argentina, em 1959. Os textos foram desenvolvidos através de notas coletadas por sua esposa, Margit von Mises, e englobam uma série de assuntos que elucidam suas posições frente aos diversos temas da época correlacionados à sociedade. Em cada um dos capítulos, sua visão sobre o tema, com a respectiva crítica, é desenrolada, totalizando uma obra simples e rápida, mas deveras relevante e necessária frente aos desafios atuais e da época em que foi escrita. A obra configura-se também como uma introdução obrigatória àqueles que almejam um conhecimento mais teórico sobre os benefícios dos princípios liberais dentro de uma sociedade.

No primeiro capítulo, o autor elucida os preceitos do capitalismo moderno. Segundo ele, o sistema originado no século XVIII na Inglaterra possui como pilar fundador a migração populacional do campo para a cidade, o êxodo rural. Na obra, os benefícios do início da produção industrial em larga escala não são poupados, como o ganho significativo na qualidade de vida e de pessoas em seu território devido ao aumento de produtividade trazido pela modernização dos processos produtivos. Outro ponto muito importante é a paridade entre trabalhador e consumidor. O autor repete diversas vezes que os proprietários das grandes corporações atuais são escravos do mercado consumidor, composto também por seus empregados.

Não obstante, o que se nota na sociedade atual é apenas parcialmente o caso. Com o advento da democracia representativa, os empresários passam a ser, também, agentes políticos para pressionar aqueles que, supostamente, representam o povo na confecção das leis do país a fim de obter benefícios frente a seus concorrentes. Esse fenômeno também é abordado pelo autor, ao discorrer sobre o uso indevido das instituições públicas. Evidentemente, em países ou ramos em que o estado se ausenta da interferência nas relações econômicas, sua tese é verificada. Grandes empresas atuais, como Apple, Microsoft, Google, Ford, Tesla etc., são gigantes em seu mercado, majoritariamente, devido ao valoroso serviço prestado por elas. É inimaginável o atual questionamento, por exemplo, do acúmulo de capital dos proprietários dessas empresas frente aos aumentos de produtividade e qualidade de vida proporcionados por elas.

Um fenômeno moderno não previsto pelo autor, no entanto, é o chamado por alguns de capitalismo woke. O que se observa atualmente no Ocidente é um movimento de grandes empresas para a imposição unilateral e antimercado de uma cultura não representativa da sociedade, ou melhor, dos consumidores, mesmo que, algumas vezes, ela sofra perdas de faturamento. Razões para esse fenômeno são diversas, mas a principal é a captação de capital humano oriundo da elite acadêmica, onde essas ideias, de novo, distantes da sociedade, são cultivadas. O futuro dessas empresas ainda é incerto, uma vez que muitos fatores estão envolvidos, como a manutenção da qualidade do serviço prestado, a despeito da tentativa de imposição cultural, especulação financeira do sucesso dessas políticas ou falência da empresa.

Embora tais críticas possam ser feitas ao capitalismo, a sua alternativa direta, o socialismo, é, de fato, algo infinitamente mais catastrófico. O autor tece críticas ao planejamento central promovido por um estado, uma vez que, mesmo que todos os governantes tivessem boas intenções, é impossível que uma parcela limitada da população tenha conhecimento profundo sobre todos os processos sociais para, assim, regulá-los. No entanto, há, atualmente, casos de países desenvolvidos como os Estados Unidos e a Europa ocidental que atingiram um elevado padrão de vida com certo grau de protecionismo econômico. A dúvida principal é: atingiram tal patamar por conta ou apesar desse protecionismo? Em seu livro, Mises explica como o investimento externo é fundamental para elevar o capital investido de uma empresa e, assim, aumentar sua produtividade. Alguns autores argumentam que os lucros serão, naturalmente, de propriedade de estrangeiros, e defendem o tal protecionismo para o desenvolvimento de uma indústria nacional.

Outra crítica tecida pelo autor é o controle individual exercido pelo estado em um regime socialista. O que inicialmente é um controle material, de preços, alimentos e produtos, torna-se, posteriormente, um controle de ideias. Em todas as experiências já vistas pela sociedade de implementação parcial de um regime socialista, o que se observa é o oposto dos benefícios prometidos por seus idealizadores. A riqueza é concentrada nas mãos de poucos, a qualidade de vida é baixíssima e o controle sobre as liberdades humanas é mais restrito em relação aos países mais capitalistas. Os imorais que argumentam que sua execução não foi correta arriscam a população mundial a ser cobaia de experimentos cuja probabilidade de fracasso é altíssima.

Assim como problemas na implementação dos ideais socialistas não são, oportunamente, objeto de discussão de seus intelectuais, é praticamente impossível encontrar um exemplo de sucesso no mundo da completa aplicação de um livre mercado. Mesmo os países mais capitalistas do mundo possuem serviços controlados pelo estado, como infraestrutura, segurança e educação. Em seu livro, Mises cita apenas a segurança como algo que o estado deveria prover, mas, até os dias de hoje, não foi verificado nenhum país que operasse dessa maneira.

Ao citar o intervencionismo, Mises deixa clara a gradual transição do capitalismo para o socialismo. É claro que os países hoje que intervêm em algum setor na economia, na maioria das vezes, estão longe de se tornarem socialistas. No entanto, é um passo em sua direção e, na maioria das vezes, perigoso. Em termos atuais, o controle dos preços dos aluguéis em Berlim fracassou. O controle cambial do peso argentino fracassou. O controle (subsídio) do preço da gasolina em 2022 pelo governo realizado criou uma dívida enorme aos brasileiros. É evidente que o controle de preços é total ou deficitário. No caso de uma empresa privada, para não cortar a produção, o controle de preços deve atingir toda a cadeia produtiva (o que teria efeitos catastróficos) ou, no caso de uma empresa pública, ser diluído entre a população, incluindo aqueles que não se beneficiam desse serviço.

Essas más condutas de países em sua economia possuem duas consequências diretas e indiretas: queda do investimento externo e inflação. O primeiro está diretamente ligado à produtividade da cadeia produtiva de um país (ainda que os lucros sejam de estrangeiros) e promovem, de maneira geral, o aumento da qualidade de vida. Mises argumenta que uma estabilidade econômica, jurídica e social é necessária para isso acontecer. De fato, muitas mudanças de leis trabalhistas, tributárias, inflação ou até mesmo a falta de segurança física dos cidadãos são fenômenos presentes no Brasil que afastam investimento estrangeiro.

Esse problema é, também, fruto da democracia representativa em que vivemos. Mises denomina os chamados “grupos de pressão” como aqueles que almejam algum privilégio para sua classe, independentemente do governo eleito. Esses governantes também podem, eventualmente, priorizar certa parcela da sociedade (incluindo eles mesmos), gerando inflação. É comum e fácil hoje um governo emitir mais moeda, diluindo aqueles que possuem uma quantidade nominal dela. No entanto, seus efeitos não são imediatos e privilegiam os primeiros a recebê-la, como o governo ou setores específicos da sociedade.

De maneira geral, o livro aborda conceitos extremamente relevantes na sociedade atual. Embora escrito em 1959, problemas como inflação, distribuição de renda, socialismo e capitalismo circulam de maneira intensa o debate político em todos os países até hoje. O livro aborda cada um desses temas de maneira superficial, uma vez que o conteúdo é apenas uma transcrição das ideias principais do autor durante as suas palestras em Buenos Aires, o que enseja uma fácil leitura e compreensão. Cada um de seus capítulos constitui, majoritariamente, uma visão conservadora e lógica sobre os processos sociais analisados.

Referências:

MISES, L. von. As Seis Lições. MISES: Interdisciplinary Journal of Philosophy, Law and Economics, São Paulo, v. 1, n. 1, p. 271–274, 2018. DOI: 10.30800/mises.2013.v1.225. Disponível em: https://www.misesjournal.org.br/misesjournal/article/view/225. Acesso em: 22 mar. 2024.

*João Pedro Dias Nunes é graduando em Engenharia Mecânica na Universidade de São Paulo e associado ao IFL Jovem SP. Email para contato: nunesjpd@gmail.com

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