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Quando o bom senso de dona Regina calou os intelectualoides globais

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Os seres humanos já conseguem perscrutar um átomo até quase a sua última substância visível ou detectável, já saímos do globo terrestre em busca de novos mundos, novas possibilidades e até mesmo de novas vidas, tudo isso muito bem delineado em sistemas intrincados de cálculos e inferências lógicas. Entretanto, esses mesmos seres humanos inteligentíssimos, por vezes, relativizam coisas banais do dia a dia e minam os próprios princípios régios e universais que possibilitaram seu desenvolvimento científico e tecnológico. Como dizia Scott Randall Paine, comentando o pensamento de Chesterton: o cientista moderno “foi ensinado a fixar sua imaginação confusa nos bilhões de átomos sobre os quais se senta, e a esquecer a cadeira” (PAINE, 2008, p. 49).

Em nossa era o chamado senso comum se tornou sinônimo de inverdade ou de conhecimento sem bases confiáveis, mas podemos admitir que o senso comum é o conhecimento que mantém a sociedade minimamente organizada. Do direito natural apenas podemos ter intuições, inclinações e percepções primárias daquilo que é certo e errado, o “bom” só o conhecemos através da moral, que por sua vez não é passível de testes laboratoriais e revisões anatômicas. Entretanto, o senso comum que diz que matar um feto no ventre materno é um mau, não é impossível de ser racionalizado e defendido com premissas e conclusões lógicas.

Princípios como o da democracia e o da liberdade são conceitos sustentados por tradições, hábitos, e contratos sociais, e não por descobertas científicas e nem por algoritmos colossais — o que não invalida, por sua vez, a sua realidade e necessidade na humanidade. Ninguém em sã consciência negaria o princípio da liberdade de expressão como pilar de uma sociedade sadia, assim como não aprovaria que o seu filho de 4 anos mantivesse relações sexuais com o seu vizinho; ainda sim, tais verdades não passaram pelo crivo científico de Descartes e nem por nenhum laboratório da NASA para se tornarem princípios incontestes e basilares.

E é bom afirmar: longe de mim querer contrapor ciência — ou conhecimento acadêmico — e senso comum, ambos são extremamente necessários e, justamente por serem necessários, devem conviver em harmonia. Há como intelectuais se nutrirem das benesses do senso comum, assim como as donas de casa da ciência moderna. O que eu exponho aqui é a importância do senso comum contra um intelectualismo ideológico; contra o conhecimento acadêmico utilizado de modo parcial e vadio.

Tendo isso em mente, a questão a ser debatida é: como os intelectuais progressistas sempre tendem à vergonha justamente por ostentarem um discurso de soberba academicista pautada num cientificismo de feira. Um fato extremamente ilustrativo aconteceu no programa Encontro, da Rede Globo. Dona Regina, uma senhora já idosa e por isso mesmo experiente, participou da plateia do referido programa, e, chamada a opinar sobre a temática da criança exposta ao homem nu no MAM (Museu de Arte Moderna), sem demora demonstrou sua insatisfação com o crime lá cometido, deixando, assim, uma gama de atores e pseudointelectuais globais num vexame vistoso diante das câmeras. Atores e atrizes esses que defendiam abertamente a exposição e o ato da mãe de expor a filha de 5 anos ao homem nu.

Como não é preciso nenhum doutorado em Harvard — nem um título de livre docência em Oxford — para notar o absurdo do abuso infantil que ali ocorreu, dona Regina deu sua opinião contrária à exposição da criança à nudez adulta, afirmando tão somente o óbvio, ou seja, que a criança não estava preparada para tal situação. Os participantes de palco do programa ficaram visivelmente irritados com a opinião da senhora; Bruno Ferrari, artista global, que visivelmente estava incomodado para não dizer enraivecido, questionou dona Regina sobre qual o absurdo que a criança foi exposta, a senhora voltou a responder com a lógica, com o senso comum básico que nos diz que uma criança de cinco anos não deve ser exposta à nudez o à pornografia.

Dona Regina mostrou em rede nacional aquilo que os intelectuais de TV não sabiam mais que existia, isto é: o senso básico de pudor, moral e ética. Princípios esses que gerenciam o mundo real, aquele mundo que fica fora dos sets de filmagens de novela, aquele mundo real que se ausenta das reportagens do Fantástico. Dona Regina escancarou para os artistas, principalmente para Andreia Horta, a principal debatedora de Dona Regina naquele breve momento, que o mundo fora da Rede Globo não é aquele palacete de miragens utópicas no qual os artistas se chafurdam ao gravarem suas novelas.

O senso comum, aquele conhecimento legado através das heranças e experiências históricas guardadas por tradições, conceitos filosóficos e sociais. Tal conhecimento é mais que um mero “sentimento” (senso), é uma constatação racional da realidade; é mais que meramente “comum”, é basilar, é primevo. O que Dona Regina trouxe para o mundo das fadas da Globo, foi a realidade, aquela realidade que extrapola as paredes dos museus progressistas e os portões do Projac.

O mundo da Dona Regina pode ser entendido como aquele em que as realidades duras do dia a dia pautam suas decisões e escolhas, o mundo de Andreia Horta e Bruno Ferrari parece ser aquele em que antes da realidade em si vem os escritos de seus gurus, militâncias e roteiros de novela; no primeiro temos a realidade tal como ela se apresenta, e noutro temos a apresentação daquilo que quer ser realidade. Tais artistas “têm o objetivo perfeitamente definido de destruir certas ideias que, na opinião deles, se tornam estreitas de mais para o mundo, e sem as quais, em nossa opinião, o mundo sucumbiria” (CHESTERTON, 1946, p. 25).

O senso comum de dona Regina é o direito pleno e democrático daqueles que ontem construíram os alicerces da civilização e hoje querem falar e ter suas opiniões levadas a sério. O senso comum é justamente isso, as vozes dos mais velhos em favor dos nascituros, a necromancia social que nos permite, entre outras coisas, contar com a sabedoria daqueles que conhecem melhor sobre o que é cuidar de uma casa ou de um país. O senso comum, por fim, é o porta-voz da moralidade social, é o filete de sanidade que mantém a comunidade humana minimamente possível. Se hoje mostramos um homem nu a uma criança de cinco anos, qual o impedimento moral e ético teremos a oferecer contra aquele que com essa criança queira se relacionar sexualmente? A moral social é uma porta que quando destrancada dificilmente será novamente fechada. Como conclusão, darei voz ao maior pensador do século XX, Gilbert Keith Chesterton, um homem que, sobre o senso comum, tinha um conhecimento num grau colossal:

“Não é fácil citar uma coisa da qual se possa dizer que dela depende toda a enorme complexidade da vida humana. Mas, se de alguma coisa depende, é dessa frágil corda estendida entre as colinas esquecidas do ontem e as invisíveis montanhas do amanhã. Neste fio solitário e vibrátil estão penduradas todas as coisas, desde o Armageddon até o almanaque, desde uma revolução bem sucedida até um bilhete de volta. E é esse fio solitário que o Bárbaro golpeia pesadamente com um sabre, que felizmente já está bastante embotado” (CHESTERTON, 1946, p. 25)

Uma sociedade deve ser julgada através do tratamento que ela oferece aos mais velhos e às crianças. No Brasil, aos velhos nós damos o desprezo e a indiferença; às crianças, por sua vez, oferecemos as portas da pedofilia escancaradas e a confusão sexual como brinquedos de berçário. A corda — senso comum — que jaz amarrada entre as colinas do ontem e as montanhas do hoje, estão sendo arrancadas por uma parte da população a fim de se confeccionar uma forca na qual todos nós seremos oferecidos em expiação artística no palco da bizarrice, se assim permitirmos.

Referências:

CHESTERTON, G. K. A barbaria de Berlim, Rio de Janeiro: Livraria Agir, 1946

CHESTERTON, G. K. Ortodoxia, Campinas: Ecclesiae, 2013

PAINE, Scott Randall. Chesterton e o universo. Brasília DF: Editora UNB, 2008

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Pedro Henrique Alves

Pedro Henrique Alves

Filósofo, colunista do Instituto Liberal, ensaísta do Jornal Gazeta do Povo e editor na LVM Editora.

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