Por que é uma falácia das grandes afirmar que existe uma “cultura do feminicídio” em vigor no Brasil?
A morte da advogada Paranaense Tatiane, arremessada da sacada do apartamento onde morava pelo marido (assim concluiu a perícia realizada), serviu como estopim para que outros casos de assassinatos de mulheres dentro do próprio lar, ocorridos Brasil afora em datas recentes, passassem a ocupar, com bastante destaque, parcela considerável das pautas dos noticiários.
Criou-se, assim, o sentimento generalizado de que nossa sociedade tornou-se um lugar extremamente perigoso para mulheres nos últimos tempos, como se o sexo feminino fosse um fator que elevasse as chances de morrer de forma violenta em nosso país.
Só que as estatísticas de homicídios não ajudam muito essa teoria a parar de pé.
Para que essa denúncia pudesse ao menos sonhar em ser válida, duas condições mínimas deveriam ser preenchidas: 1) Mais mulheres do que homens deveriam ser assassinadas anualmente; 2) As vítimas preferenciais dos criminosos do sexo masculino condenados por homicídio deveriam ser mulheres.
Só que nem uma coisa nem outra encontram respaldo na realidade: segundo o anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 56.962 homens foram assassinados em 2016 (92,4% do total). No mesmo período, 4.657 mulheres foram assassinadas (7,6% do total). Ou seja, 13 homens e 01 mulher são mortos a cada duas horas, em média. Além disso, 96,3% dos homicidas identificados são homens, e suas vítimas preferenciais são outros homens (85,9%).
Quer dizer, é uma falácia das grandes afirmar que existe uma “cultura do feminicídio” em vigor no Brasil. O que há é muita criminalidade e impunidade que tornam a experiência de viver em nosso país uma aventura perigosa para qualquer pessoa, independente do sexo.
A essa altura, alguém pode estar imaginando que um recorte nesses dados que venha a enfocar apenas a violência doméstica poderia trazer à tona um quadro diferente, quem sabe.
Mas aqui é que a coisa fica interessante de vez: homens são aproximadamente 80% dos vitimados por assassinatos ocorridos dentro do lar. Segundo os dados oficiais do Governo colhidos pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM/Datasus/MS), do total de 8.770 homicídios por violência doméstica que ocorreram em 2016 no Brasil, morreram quase quatro vezes mais homens do que mulheres.
Há um detalhe oculto nesses números de violência familiar que auxilia sobremaneira na elucidação da questão: eles incluem atos perpetrados entre pessoas com os mais diversos laços afetivos, como pais contra filhos e vice-versa. Ou seja, uma filha que mata o genitor idoso ou uma mãe que espanca um filho pequeno até a morte compõe este levantamento juntamente com os crimes cometidos entre cônjuges – nos quais, aí sim, observa-se a predominância da mulher como vítima (60,8%).
Vale dizer: a regra geral observada na violência doméstica é a lei do mais forte. Contra um marido da mesma faixa etária, a mulher tende a sair em desvantagem, mas a situação tende a equilibrar-se ou mesmo inverter-se quando ela enfrenta irmãos, filhos, pais ou outros indivíduos com quem conviva.
O que nos leva à forçosa conclusão de que não são o machismo ou o patriarcalismo que levam mais homens a matarem suas parceiras do que o inverso, mas sim o fato de que eles são geralmente capazes de dar cabo da vida delas com as próprias mãos (exatamente como ocorreu no brutal crime em Guarapuava/PR), façanha essa quase impossível para elas, ainda que estejam possuídas por um ódio mortal de seus companheiros.
Reforçando este argumento, observa-se que as agressões sofridas por homens cometidas por suas parceiras apresentam duas características importantes: 90% das mulheres que foram denunciadas por seus parceiros haviam sido previamente agredidas por eles e estavam apenas reagindo ou praticando vingança; e a quase totalidade delas usou algum objeto como arma – facas, tesouras, etc.
Isto é, a mulher costuma figurar em posição de hipossuficiência física perante o homem com quem divide teto, a menos que uma arma torne a disputa mais justa – entenderam a importância de um spray de pimenta, um aparelho de choque ou mesmo uma pistola dividirem espaço com o batom nas bolsas femininas?
Os crimes domésticos contra mulheres, com toda certeza, chocam muito pelo cenário de terror que constituem: onde acreditávamos haver amor conjugal, uma vida é ceifada; mas nem por isso eles são um problema social mais grave do que todos os demais assassinatos que vitimam inocentes indiscriminadamente a toda hora.
Um bom comparativo são os padres católicos envolvidos em pedofilia: o número de registros do tipo é bastante baixo quando o comparamos com a frequência deste mesmo delito entre outros profissionais que lidam com crianças (como cuidadores de creches e treinadores esportivos), mas espanta muito saber que um sacerdote cometeu um ato que contraria tão frontalmente a doutrina de sua religião.
O que não faz sentido é querer atribuir aos homens em geral a culpa por atitudes individuais de quaisquer assassinos, seja qual for a natureza e a motivação dos crimes praticados.
Em suma: era previsível que aqueles que adotam rotineiramente a estratégia de jogar os membros da sociedade uns contra os outros não iriam nem mesmo esperar o cadáver de Tatiane ser sepultado para em cima da desgraça alheia fazer proselitismo ideológico, visando amealhar capital político e forjar justificativas para a expansão do aparato estatal (secretarias, delegacias e outros órgãos especializados na violência contra a mulher) e para a destinação de verbas públicas para coletivos feministas. Só que uma análise mais acurada põe por terra essa narrativa e expõe a canalhice de quem vive de criar oportunidades para “se dar bem” à custa do sofrimento de terceiros.
Permitir que existam categorias especiais de cidadãos cuja vida seja mais ou menos protegida pela lei é semear a discórdia e fazer o jogo dos políticos profissionais que adoram prometer tratamento privilegiado em troca de votos. “Matar alguém”, conduta tipificada no artigo 121 do Código Penal, deve ser castigada com rigor, não importando as características da vítima.
Que não se perca de vista em meio à histeria e à distorção dos fatos: violência de qualquer espécie só pode ser amenizada com punição adequada aos violadores da legislação criminal. Duvido que o assassino de Tatiane fique mais de cinco ou seis anos encarcerado em regime fechado antes de voltar às ruas e reiniciar sua vida. Alguém tem dúvida de que essa leniência do Estado para com um facínora cruel destes não é um convite para que novos episódios do gênero ocorram?
É claro que também ajudaria muito a evitar que novos casos como o de Tatiane se repetissem resgatar a noção cavalheiresca de que em uma mulher não se bate nem com uma flor, mas suspeito que este nível de conservadorismo provoque repulsa nesta geração tão moderninha…
Em tempo: costumo ouvir frequentemente que a educação é o melhor remédio contra a violência, e que “cadeia não resolve”. Pois saibam que Luis Felipe Manvailer, algoz de Tatiane, era professor de Biologia em uma instituição de ensino superior. Não se engane: intelecto e caráter são coisas bem diferentes….
BANCOS DE DADOS CONSULTADOS:
http://www.forumseguranca.org.br/publicacoes/10o-anuario-brasileiro-de-seguranca-publica/