O Brasil converteu-se num Navio Fantasma

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O Brasil converteu-se num Navio Fantasma. A cúpula do Estado brasileiro, que deveria zelar pelo bem da Nação e de todos os brasileiros, passou a cuidar, exclusivamente, da sua própria segurança e da forma em que o Presidente da República pode-se perpetuar no poder, se reelegendo Presidente nas eleições do próximo ano. A nossa cúpula política assemelha-se à tripulação do Navio Fantasma que navega por águas tenebrosas, olhando, do alto da ponte, para a linha do horizonte, sem tomar conhecimento do que se passa nos andares de baixo e nos porões da imensa embarcação. Ora, são poucos os que têm acesso à ponte da Nave, ocupada pela cúpula política da nossa República, entregue a novo projeto autoritário, presidido pelo STF e pelo presidente da República.

Trata-se de um autoritarismo pretensamente esclarecido e integrado pela alta Magistratura e pelos seus asseclas do PT no Congresso e na máquina pública inchada, corrupta e improdutiva. Mas, vamos convir que a enorme embarcação que transporta 210 milhões de brasileiros, perdeu o rumo. Os altos dirigentes só olham para si mesmos, para o seu partido e para os que tenham caído no canto de sereia da propaganda oficial. A preocupação única do Lula, nestes tempos de desconfiança generalizada, em face de um mundo cada vez mais complexo e agitado, é se reeleger em 2026. Perspectiva cega que trará muitos males ao Brasil. Não importa o que precise ser feito para o bem, não da Nação, mas da Tripulação. Se for necessário se aliar ao crime organizado, em alguma das variantes que apresenta hoje mais possibilidade de sucesso nas urnas, o reincidente candidato corre para lá. Não interessa, ao nosso Presidente, tomar a decisão que mais beneficie aos cidadãos.

No caso da segurança pública do Rio de Janeiro, Lula ficou irritado porque o Governador Cláudio Castro, fazendo uso da autoridade que lhe foi conferida por lei, colocou as forças policiais no combate direto à criminalidade (como, aliás, a opinião pública desejava), reagindo ao poder do Comando Vermelho, que passou a ameaçar a população do Estado do Rio de Janeiro, pondo em sério risco a vida das pessoas. A operação chefiada pelo corajoso governador à frente das forças policiais, no complexo da Penha e do Alemão, colocou um limite legal às pretensões dessa facção criminosa, de pôr em risco a segurança e a vida dos cariocas, a fim de garantir a sua liberdade de movimento na definitiva implantação do comércio da morte.

A corajosíssima e muito bem planejada incursão do BOPE e da Polícia Civil do Rio de Janeiro, embora não tivesse contado com a ajuda das Forças Armadas (por explícita decisão do Lula, que não quis garantir a decretação da Operação da Lei e da Ordem), foi uma ação exitosa do Governador e das forças policiais, que sofreram infelizmente quatro mortes e que infringiram aos traficantes 113 baixas, dada a agressividade e a farta munição, bem como o armamento pesado utilizado pelos meliantes. Tratou-se de uma operação de guerra urbana. Lula, paradoxalmente e sem nenhuma justificativa, criticou a operação chamando-a de “carnificina”, quando, como Presidente da República, lhe cabiam minimamente duas obrigações: apoiar o governador no cumprimento da missão constitucional de garantir a vida das pessoas ameaçadas e se solidarizar com os quatro heróicos policiais, que perderam a vida em defesa dos cidadãos do Rio de Janeiro.

Ora, sabemos que a luta das facções criminosas é no sentido de tornar refém das suas pretensões o Brasil inteiro. Como acontece hoje no estado do Rio de Janeiro, no caso da rivalidade entre o Comando Vermelho e o Primeiro Comando da Capital, Lula privilegiou, por enquanto, as pretensões dos traficantes cariocas. O cálculo de probabilidades criminosas imagina a conquista de um apoio ulterior dos dois mega grupos meliantes. Se para garantir a simpatia do CV foi necessário, primeiro, apoiar a sua presença no estado do Rio, se colocando contra a política repressiva do Governador, esperamos que não se concretize a segunda alternativa de contar com a simpatia do narcotráfico paulista. Mais adiante, temo eu, virá a negociação cabulosa para garantir o apoio do PCC, o qual, segundo os analistas, é a menina dos olhos petistas. Torço para que mais desgraças não aconteçam aos já castigados cidadãos cariocas.

Vendo as desgraças brasileiras, com o nosso país ficando refém do crime organizado, relembro o que meus irmãos, que moravam, assim como eu, em Medellín, na Colômbia, nos anos setenta do século passado, me diziam, quando lhes comentava o projeto de me mudar com a família para o Brasil: “por que não pensas em emigrar para o Canadá, que é muito mais seguro?” Eles, temerosos do rumo que estava tomando na Colômbia a guerra contra os cartéis, com Pablo Escobar castigando os cidadãos com terrorismo na sua forma mais brutal de carros bomba explodindo no centro das grandes cidades, preparavam a emigração para o país do Norte.

Vim para o Brasil, fugindo da guerra dos cartéis colombianos no início de 1979. Quando, nos anos 90, os meus irmãos se firmaram em Toronto e fui visita-los pela primeira vez, me diziam, criticando fraternalmente a minha decisão de vir para o Brasil: “você, que é o intelectual da família, emigrou para o lugar errado”. Achei exagero. Mas, passados os anos, com a guerra das drogas que, a partir do violento populismo socialista do primeiro governo de Leonel Brizola se instalou no Rio de Janeiro, passei a pensar que talvez os meus familiares tivessem razão, especialmente agora, vendo os desdobramentos cruéis que o populismo do “socialismo moreno” brizolista impôs ao Estado do Rio, tendo sido continuado pelo populismo dos novos “donos do poder” (o STF e o PT), após o golpe palaciano de 2022 que descondenou Lula, a fim de colocá-lo como presidente do Brasil.

Lembro-me de que, no verão de 2018, na visita que fiz com a família a Toronto, vendo as incertezas que pairavam no Brasil, com a deposição da Dilma e as dúvidas que pairavam no governo de transição de Michel Temer, falei com os meus irmãos que, agora, aparecia uma esperança no horizonte do Brasil, com a nova candidatura que se firmava, a de Jair Bolsonaro, para as eleições que teriam lugar em outubro desse ano. Nem imaginava que, no início de 2019, eu iria formar parte do primeiro gabinete do governo de Bolsonaro, como Ministro da Educação.

Os primeiros cem dias do novo governo foram balizados pela esperança de uma forma mais republicana de gestão da coisa pública, o governo prestando contas regulares à população e com respeito total pela tripartição de poderes e pelos direitos básicos à segurança de todos e à liberdade de expressão. Bolsonaro combateu, com força, o descontrole do gasto público no ciclo petista, bem como a corrupção em todas as suas manifestações. No MEC fiz ajustes básicos para poder gerir com claridade a pasta da Educação, excluindo os elementos que, se aproveitando da mudança, pretendiam colocar o Ministério a serviço dos seus interesses clientelistas. Na parte correspondente à economia, Bolsonaro deu novos ares ao crescimento econômico, tendo controlado gastos desnecessários e estabelecendo uma rigorosa política de austeridade. A tradicional frota de jatinhos da FAB, posta durante os governos petistas a serviço dos Ministérios, passou a ficar em Brasília, tendo os funcionários, mesmo os ministros, de usar os voos comerciais nos seus deslocamentos. Viagens em jatinhos da FAB, só em casos de urgência. Ganhou o governo em credibilidade com o corte de gastos desnecessários.

Com a manipulação jurídica que, em 2022, colocou Lula no poder, tendo-o isentado de todos os cargos que o tinham conduzido à cadeia, num processo judicial confuso e cheio de incoerências, o panorama brasileiro entrou novamente em ares de cerração e na zona de turbulência que estamos enfrentando. Queira Deus que consigamos encontrar o rumo perdido para este enorme e amado Brasil que, como estão as coisas, virou um Navio Fantasma…

Felizmente, a oposição liberal e conservadora no Congresso está fazendo o seu papel, em que pese a perseguição de Alexandre de Moraes contra os mais ativos congressistas. E os governadores de importantes Estados como São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Paraná e Santa Catarina, fecham fileiras de solidariedade ao redor do corajoso governador do Rio de Janeiro. Constituem todos eles uma poderosa oposição que, com certeza, nas eleições do ano próximo farão valer a sua palavra e a sua força.

*Artigo publicado originalmente no site do autor.

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Ricardo Vélez-Rodríguez

Ricardo Vélez-Rodríguez

Membro da Academia Brasileira de Filosofia e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, professor de Filosofia, aposentado pela Universidade Federal de Juiz de Fora e ex-Ministro da Educação.

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