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O Rio está atrás das grades – e temos que pagar a fiança

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Sou fluminense (no gentílico e no futebol!), sou carioca e não tenho, nem jamais tive, qualquer vergonha disso, tampouco a intenção de fazer as malas e partir daqui. Em nenhum lugar me sinto mais à vontade que na minha Ilha do Governador, um pedacinho de terra cercado de água em plena e majestosa Baía de Guanabara; poucas coisas me aprazem mais que frequentar a quadra da escola de samba no fim de semana e não tenho muita objeção a fazer quando me convidam a sentir o frescor do mar no quiosque da praia. Ah, e é claro, eu também puxo o “esse” – eles dizem, pelo menos.

Porém, uma sociedade não pode ser feita apenas de suas artes, sua cultura popular, as belezas naturais e urbanísticas à sua volta e, principalmente, uma civilização não se faz apenas de suas diversões.

As grandes porções territoriais controladas pela criminalidade; as endeusadas “favelas”, onde os meliantes mais abjetos estabeleceram seus feudos e travam suas batalhas campais, ao arrepio da lei e da ordem – lei e ordem essas que por vezes procuramos sem encontrar; os quase 120 policiais mortos, cujos nomes rapidamente são esquecidos; a corrupção na própria polícia em associações espúrias com parlamentares e traficantes, figurando nos noticiários através das declarações algo precipitadas de um ministro da Justiça, mas em cuja substancialidade nenhum cidadão têm dificuldades de acreditar; a segunda taxa mais alta de desemprego do país e a situação calamitosa das contas do governo; tudo isso depois de anos de euforia descompensada com grandes eventos esportivos internacionais mostra que nosso modelo é um retumbante fracasso. A quarta-feira, dia 23, trouxe uma novidade: o Rio fracassado foi parar atrás das grades.

Com exceção da petista Benedita da Silva – minha santa Aquerupita! – e do atual governador, o inexpressivo e acuado Pezão, todos os governadores do Rio de Janeiro de 1999 até hoje, no momento em que escrevo estas linhas, estão presos – Anthony Garotinho, Rosinha Garotinho e Sérgio Cabral Filho. Na cadeia ainda estão os presidentes da Assembleia Legislativa do estado no mesmo período – o próprio Cabral, Paulo Mello e o poderoso chefão Jorge Picciani -, bem como a maioria dos membros do Tribunal de Contas do Estado.  

Também à exceção do governo tucano de Marcello Alencar – que, no entanto, também era egresso do PDT -, todos os grupos políticos que controlaram o nosso estado no período são e foram integrantes ou se apoiaram na sigla de Brizola (bem como na escola política que ele e Darcy Ribeiro, com seu “socialismo moreno”, estabeleceram para o Rio) ou no PMDB. Rachados, brigados, denunciando-se mutuamente, não importa; não são muito diferentes. O isolamento da sociedade hoje os iguala ainda mais.

Não parece nada equivocado dizer que, desde que Chagas Freitas, ainda no regime militar, brincava com a máquina pública e o clientelismo para dar as cartas, só o que fazemos é mudar o tom das mesmas cores, ou vestir com os mesmos trajes e adornos de populismo e caciquismo alguns poucos nomes diferentes. São muitas décadas, é muito tempo, não é nada fácil de mudar. Contudo, esse pode ser o benefício do ponto de saturação a que parecemos ter chegado. Desfilam sob os nossos olhos acusações de corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa – até com braço armado! -, evasão de divisas, crimes eleitorais… Ninguém aguenta mais essa situação, é o que dizemos todos os dias. Se ninguém efetivamente aguenta mais, é a hora de fazer algo a respeito, ou então esta hora jamais chegará.

O Rio de Janeiro é uma terra governada por bandidos. Disse certa vez, com muita generosidade, a manchete da Tribuna da Imprensa de Carlos Lacerda – provavelmente o melhor governador que a região da cidade do Rio, então Estado da Guanabara, jamais teve – que o brasileiro é “um povo honrado governado por ladrões”. É uma forte sentença para mexer com os brios de uma Cidade Maravilhosa que se apaixonou pela própria maravilha e cegou-se para tudo o mais, se nós cariocas a aplicarmos especificamente a nós e, por extensão, ao resto do estado, mas não creio que seja, ao menos não hoje, tão verdadeira. Onde está essa honra? Persistirá alguma? Na verdade, a manchete falha ao dissociar nossa gente do sistema que nos governa. Não somos inocentes. É do nosso seio que todos eles saíram – e muitos entre nós os mantém por lá em troca de agrados pouco republicanos.

Sei bem que a hora é de evitar messianismos e de entender que precisamos, mesmo nacionalmente, de reformas na máquina pública, reformas na legislação eleitoral, reformas de sistema político e tudo o mais, bem como reconhecer que ideias precisam ser enfatizadas e não o personalismo de “salvadores da pátria”. Contudo, não creio ser o dissonante ao dizer que agendas são levadas adiante por pessoas e o Rio de Janeiro precisa mais do que nunca de que façamos uma mudança genuína naqueles que ocupam postos de comando – as eleições estão logo ali.

Sei bem também que as opções alternativas têm sido não menos lamentáveis que aquelas que mantemos no poder. Sei bem que não é o caso de trocar o velho por um velho travestido de novo, que na realidade representa uma versão modernizada do radicalismo que caracterizava o lulopetismo, endossando um modelo estatizante ultrapassado e que só tenderia a potencializar a crise econômica e a corrupção. Não é o caso de abandonar nossos oligarcas clientelistas e populistas para colocar no lugar aqueles que acreditam – ou fingem acreditar – que socialismo e liberdade podem dar as mãos. Contudo, alguma mudança precisa ocorrer.

Se nossos líderes também são um reflexo do que nos permitimos tornar, quero crer que é de nós, é da sociedade civil, que poderá vir uma saída. Precisamos gerar uma nova ordem de líderes. E precisamos de um candidato que preste já, para 2018. Precisamos de um candidato para o governo estadual, e de candidatos a deputados, que digam a verdade, mesmo que ela doa. Precisamos de candidatos que não troquem nosso bem-estar por festas caras feitas para superfaturar obras. Precisamos de candidatos que deem à segurança pública e à criminalidade o tratamento inteligente, eficiente, mas por isso mesmo duro e implacável que aguardamos por estas bandas desde a política nefasta do brizolismo.

Precisamos criar esses candidatos; enquanto não fazemos isso, não começaremos a pagar a fiança – afinal, junto com Garotinho, Cabral, Picciani e cia., estamos todos nós, cariocas e fluminenses, dentro de uma cela de tristeza, trancafiados na prisão do desânimo e da falta de perspectiva. Nossa sociedade é responsável. Eu acredito que nosso crime é afiançável. Vamos arregaçar as mangas para comprar de volta a nossa liberdade e nosso direito de querer dias melhores. Alguém se apresenta para a missão?

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Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

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