O mito da isenção de opinião
Há alguns anos, ouço com muita frequência a reclamação de que não existe mais isenção. As escolas não são mais isentas, os jornais não são mais isentos, a cultura não é mais isenta. No entanto, acredito que isso seja uma grande balela criada pela contemporaneidade. Afinal, ninguém nunca foi isento.
Quando Millôr Fernandes cunhou a frase “Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados”, já definia o verdadeiro caráter da inexistência da neutralidade. Pois sua constatação era clara: a imprensa só pode ser legítima quando questiona tudo o que um governo faz, por mais que concorde com ele. Do contrário, é propaganda gratuita de um produto a ser vendido, como em um armazém qualquer.
Quanto às demais coisas? Ora, todo ser humano, com o mínimo de inteligência operando nas condições ideais, cria opinião e visão sobre um tema geral, e é assim que escolas e cultura também escapam da suposta neutralidade que, segundo alguns, existia.
Retorne ao passado e assista filmes sobre cada período histórico, principalmente de Hollywood, e analise o contexto em que foram criados. Nos anos 1960 os filmes do 007 eram grandes armas de propaganda cultural contra a URSS, e o que há de errado? Nada, mas não há isenção alguma, e sim uma nítida propaganda em favor do capitalismo.
Nas escolas, o caso entra num litígio. Sim, devemos usar a educação para ensinar a verdade, mas o que é a verdade? Matérias como português e matemática se saem bem em muitos aspectos, afinal cálculos e conjuntura da linguagem são bem estabelecidas, mas, e na história? Terreno difícil e espinhoso.
Claro que não é crime prezar pela qualidade em todos os temas, afinal hoje nossa imprensa, cultura e educação fazem trabalhos terríveis no que se propõem a fazer e criam uma espiral de má qualidade, mas isso não está diretamente ligada a algum tipo de isenção, e sim a como fazer seu papel bem articulado dentro de cada nicho.
Afinal, não só imprensa, mas cultura e educação deveriam trabalhar como oposição, mas oposição de ideias, exposição de pontos de vista, e principalmente, liberdade para atuar como se acredita ser o melhor.