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O consenso ataca novamente – e flerta com o golpismo

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A barulhenta capa da Revista Época esta semana revelou um claro interesse em aproveitar a entrevista de Joesley Batista para reforçar a narrativa de que o presidente da República, Michel Temer, é o grande vilão do Brasil – alguém que, à época do mensalão e do começo do grande esquema de assalto à Petrobrás revelado pela Lava Jato, sequer era vice-presidente.

Realmente, uma narrativa esdrúxula. Nada é mais criminoso nessa história toda que o lulopetismo – uma excrescência populista e autoritária que alinhou o Brasil a toda a escória internacional e nos pôs a braços com a recessão e a decadência. Não foi Temer quem financiou as ditaduras latino-americanas. Não foi Temer quem defendeu o tempo inteiro a censura desavergonhada da imprensa sob o pretexto da “democratização da mídia”. Não foi Temer quem insuflou o “exército de Stédile”. Não foi o PMDB o partido de Celso Daniel.

Perdendo a narrativa dos anos 80 de ser o partido da ética, o PT de Lula se agarra à retórica da “justiça social”, exibindo-se como o partido que representa o “povo”, mesmo que, detalhe insignificante, seja corrupto como os outros – e na verdade muito mais, pois além de empresas estatais e máquina pública, corrompeu a alma do país, e também intentou promover o máximo retrocesso de nossas aspirações republicanas.

Nada disso torna Temer inocente. Disse e repito: continuo na dúvida quanto às suas condições porvindouras de governabilidade, as reformas tendem a ser aprovadas com muita timidez e o que pesa contra ele é, sim, muito grave, independentemente de motivações partidárias de Rodrigo Janot na seleção ou tratamento de seus alvos. Não pretendo admitir um nível de tolerância “tupiniquim”; quero uma civilização digna onde imoralidades e inadequações sejam tratadas pelo nome, à revelia de circunstâncias. Não voltei atrás nisso, nem voltarei.

Contudo, Temer é uma face menos daninha de um sistema muito mais profissional e amplo do que ele próprio: aquele a que o colunista da Revista Amálgama Elton Flaubert já chamava de “consenso social democrata”: a ortodoxia política, cultural e institucional da Nova República pós-1988. O que vemos a essa altura é que o consenso se articula para atacar de novo, com a única intenção de preservar o Brasil em seu círculo, preso às suas rédeas, proibido de respirar outros ares.

É assim que já pululam manchetes nos jornais de que o ícone tucano Fernando Henrique Cardoso estaria admitindo aliança com o PT de Lula para pedir as famigeradas “eleições diretas” para agora. As investidas estariam sendo bem recebidas. Não seria a primeira vez; a briga entre PT e PSDB há muito é uma briga de comadres, um grande engodo em que ambos se enfrentam para se legitimarem mutuamente e deslegitimarem o que houver para além. Uniram-se contra Collor nas eleições de 89. As diferenças, como a oposição petista à Constituinte e ao Plano Real, se apagam quando se trata de defender essa espécie de “ethos fabricado” que lhes interessa.

O texto de FHC no jornal O Globo flerta perigosamente com o golpismo oportunista, o que não vinha sendo de seu feitio. Embora casuístico e forçado pelos interesses imediatos, o que é próprio de populismos bolivarianos e não de democracias liberais maduras, o pedido de uma emenda constitucional para eleições diretas não é considerado, por óbvio, inconstitucional. Porém, FHC não se limita a considerar a ideia interessante, o que já seria estar de acordo com o petismo – em um apelo por uma modificação em cima do laço, pouco viável politicamente, que demandaria um gasto imprevisto em meio a um clima de terra arrasada e turbulência, e em que mais adequado seria dar algum respiro à economia.

Mais que isso. O tucano diz que seria um gesto de grandeza de Temer pedir eleições gerais, pois se não houver “aceitação generalizada” da “validade” da lei, “as ruas pedirão a ruptura da regra vigente exigindo antecipação do voto” (!). As ruas, no caso, certamente os “movimentos sociais” aparelhados pelo petismo, que são os que bradam aos quatro ventos por essa solução imediata. FHC, naturalmente, sabe que o presidente da República não tem o poder de convocar eleição alguma. Quer, no entanto, que como chefe de Estado e Governo, ele reivindique o descumprimento da regra constitucional, fazendo o que deseja o PT. Ora, se desmoralizado ele já está, quanto mais para uma manobra dessa envergadura!

O texto de Fernando Henrique nos parece irresponsável. Do ponto de vista do poderoso “consenso”, esse mesmo que ainda nos cabe romper, talvez não seja. Não faz muito tempo, o próprio Temer sinalizou que poderia conversar com Lula “em prol do país”, não é mesmo? O “consenso” é agradável, até o momento em que ele te engole.

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Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

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