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Breve análise da tradição liberal no Brasil

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O liberalismo brasileiro, como tradição de longa data na política nacional, tem alguns princípios comuns que se estabeleceram com o tempo, mas que parecem infelizmente ter sido esquecidos na nova geração liberal.

Com o intuito de divulgar o liberalismo nacional, suas figuras históricas e suas ideias, estabelecemos aqui os cinco princípios basilares do liberalismo brasileiro através de seus dois séculos de tradição.

1- Democrático, sempre: a tradição liberal brasileira, desde sua primeira estruturação teórica na mão do filósofo, nascido português e naturalizado brasileiro, Silvestre Pinheiro Ferreira, coloca-se em defesa da representação democrática geral.

Silvestre Pinheiro Ferreira foi o inspirador das reformas constitucionais da década de 1840 no Brasil, que criaram o parlamento brasileiro imperial que registrou o maior período de estabilidade democrática da história do país.

Inspirado na concepção de John Locke sobre a representação do poder, o liberalismo brasileiro durante o período imperial desfrutou de amplos debates nos partidos Liberal e Conservador, sobre concepções democráticas gerais. Figuras como o Visconde de Uruguai, Marquês de Paraná, Zacarias de Góes e Vasconcelos, pelo partido Conservador, e Joaquim Nabuco, Diogo Feijó, Marquês de Olinda e José Saraiva pelo partido Liberal, participaram desses debates.

As defesas foram solidificadas em figuras posteriores da República, tais como o excepcional jurista Ruy Barbosa, árduo opositor das oligarquias do sudeste e pivô da Campanha Civilista; e Armando de Sales Oliveira, fundador da União Democrática Brasileira, importante opositor da radicalização que o Brasil viveu na Era Vargas e que inspiraria grande parte do liberalismo brasileiro durante a Democracia de 1946.

Neste período em particular, a ascensão de figuras da UDN como Milton Campos, Carlos Lacerda, Pedro Aleixo e o Brigadeiro Eduardo Gomes, inspiradas pela luta de Armando de Sales Oliveira, foi fundamental para a defesa democrática geral durante o período de aparelhamento contínuo dos aliados de Getúlio Vargas, dispostos a manter o país em suas mãos por meio da interferência estatal – embora seja cauteloso pontuar que houve uma associação, que o futuro pontuou ser um erro, dos liberais no primeiro momento do golpe militar de 1964.

Nos períodos subsequentes, figuras como Roberto Campos, Marco Maciel, José Guilherme Merquior, José Osvaldo de Meira Penna e Miguel Reale seguiram árduos defensores da democracia e da preservação dos direitos de representação liberal.

Mesmo que no período alguns liberais de linha mais austríaca, como Henry Maksoud e Donald Stewart Jr, defendessem uma linha próxima à demarquia de Hayek, a defesa da democracia aos moldes da democracia liberal clássica era majoritária, constituindo como padrão a defesa de democracia liberal no Brasil e no liberalismo brasileiro.

2- O eterno combate ao patrimonialismo: herança portuguesa dos tempos do Marquês do Pombal, o liberalismo brasileiro sempre apontou diretamente o patrimonialismo como o maior mal da sociedade brasileira.

Elevado à condição de destaque máximo pelo sociólogo Raymundo Faoro pela sua excepcional obra Os Donos do Poder, o patrimonialismo é a concepção em que aqueles que exercem o poder no Estado brasileiro habituam-se a pensar que o poder pode e deve ser usado em benefício pessoal, sempre que for o caso.

Ruy Barbosa, através de suas denúncias na tribuna do Senado, sempre acusou as oligarquias políticas da época de uma abusiva relação de apego ao poder a ponto de recusar reformas democráticas e fraudar eleições.

Meira Penna descreve que uma das razões de ter se tornado um liberal derivam de suas experiências no começo da carreira como embaixador brasileiro ainda na Era Vargas, quando incompetentes, em geral, eram escolhidos para embaixadas brasileiras apenas por apadrinhamento político.

O problema pouco mudou desde então, sendo ainda hoje um dos maiores problemas da Nova República, com membros do poder que abusam do mesmo, com tentativas de aparelhamento do Estado, roubo do dinheiro público e uma preservação de oligarquias locais por meio do populismo e do nepotismo.

3- A economia fiscalmente responsável: Mantra de quase sempre, é praxe afirmar que, com pouquíssimas exceções históricas, como o período do Encilhamento de Ruy Barbosa, o liberalismo econômico é avesso a heterodoxias no campo econômico em geral.

No caso de Ruy Barbosa ainda é perdoável compreender, dado que em seu tempo a economia era uma novidade em desenvolvimento; mas, após as progressivas melhorias do campo do conhecimento, é possível afirmar que, na generalidade dos fatos, os liberais pautam noções econômicas em evidências.

Experiências “fora da caixinha” sempre foram objeto de desprezo pelo seu excesso de tentativas nas políticas públicas brasileiras, principalmente por mandatários antiliberais.

4- Anticomunista e antifascista: o comunismo não chegaria ao Brasil até os anos 10 do século XX e o fascismo até os anos 30. Porém, desde seu surgimento, a oposição sistemática aos dois colossos totalitários sempre esteve presente.

Armando de Sales Oliveira se apresentava como a opção de oposição ao Integralismo, movimento brasileiro com forte marca fascista, e aos membros do PCB, sendo crítico contumaz de ambos.

Durante o período da democracia de 46, a UDN e seus principais líderes sempre foram contundentes em críticas ao autoritarismo varguista. enquanto se opunham à opção do comunismo e sua tentativa de se apresentar como defensora da liberdade.

No século XX, com a derrocada do sistema soviético e da queda do comunismo, variantes do progressismo que cultuam suas figuras passam por baixo da crítica liberal e a necessidade de refazer a crítica ao desarranjo coletivista com capa de progresso dos direitos sociais.

5- Não se aliar ao autoritarismo, qualquer que seja: muito mais um objetivo para o futuro do que uma tradição, e por motivos óbvios.

O liberalismo brasileiro eventualmente cometeu o erro de aliar-se a autoritários acreditando que romper com o status quo da sociedade iria beneficiá-los – e sempre foi um engano.

Em 1889, a união aos positivistas brasileiros contra a monarquia dominada por barões da propriedade rural projetou uma esperança jamais cumprida. Com dois marechais no poder e subsequentes políticos das elites escravistas, nem mesmo o solitário governo de conciliação de Prudente de Morais conseguiu salvar a República de prosseguir com autoritarismo e patrimonialismo.

Como consequência, a aliança com os castilhistas gaúchos em 1930 contra a República, posteriormente chamada República Velha, veio de uma esperança em que a Revolução de 1930 pudesse romper em definitivo com os vícios apodrecidos, quando, além de isso não ocorrer, o cenário somente tornou pior, visto que Getúlio Vargas se tornou o protótipo de ditador inspirado nos autoritarismos vigentes no mundo naquele momento.

Nem mesmo a queda de Getúlio mudaria o cenário, dado que o ex-ditador e seus asseclas prosseguiram como membros da elite política brasileira nos idos da democracia de 1946 – o que levou a derradeira associação que quase aniquilou o liberalismo da política nacional, a associação aos militares de 1964.

A ditadura militar, com intuito de romper com o Estado varguista, foi apenas uma reedição do Estado Novo de Vargas com pequenas mudanças substanciais, sendo a mais relevante o sumiço do personalismo. Por outro lado, o liberalismo escanteado fora suprimido pelo estatismo e pelo projeto desenvolvimentista, levando a uma supressão da qual por muito pouco o liberalismo escapou vivo.

Hoje, após três associações escusas com autoritários, a lição deve ser sempre aprendida para evitar que o liberalismo seja morto em definitivo.

Pois, como dizia o lema da UDN: o preço da liberdade é a eterna vigilância.

*Artigo publicado originalmente na página Liberalismo Brazuca no Facebook.

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