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O uso dos pardos como curingas em nosso baralho racial

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Vemos nas manchetes que pela primeira vez na história os negros são maioria nas universidades públicas, representando um percentual de 50,3%. O número chama a atenção, então decido “cavar” mais um pouco, apenas para descobrir o que já sabia quando li as manchetes: o percentual de 50,3% é o somatório de pretos e pardos, que, por alguma razão, para o IBGE compõem a chamada população negra. O número está presente no estudo Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil do IBGE.

 A estatística induz ao erro, levando a crer que mais da metade das vagas são ocupadas por pretos, quando na verdade o são na maior parte por pardos. O mesmo acontece com a população brasileira, afinal, quantas vezes ouvimos por aí que mais da metade da população é formada por negros? A pegadinha é que a parcela realmente formada pelos que se declaram pretos é bem menos expressiva. Conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – PNAD Contínua de 2018, 43,1% se declaravam brancos, 46,5% pardos e somente 9,3% pretos; esses três grupos respondem por 99% da população brasileira, sendo o restante composto por outras etnias. O uso do termo “negro” para abarcar pretos e pardos pode parecer uma sutileza de menor importância, mas na verdade esse fato altera todas as conclusões que podem ser tiradas da estatística.

Como podemos notar, os pardos, que representam diferentes tipos de miscigenações – brancos com pretos, brancos com indígenas ou pretos com indígenas, entre outras – perfazem a maioria da população brasileira, revelando nada mais, nada menos do que a miscigenação histórica que atuou na formação da civilização brasileira. Portanto, as tentativas de traçar uma linha arbitrária entre pretos e brancos e de advogar o faturamento de pretensas dívidas históricas entre uns e outros encontram na própria “mistureba” do brasileiro um empecilho. É aí que entram os pardos, ora dando peso em números para alguns argumentos, ora para outros, servindo como verdadeiros curingas no baralho racial que é o brasil.

 Não que eu acuse o IBGE de fraudar as estatísticas, mas o instituto toma mão de uma definição que me parece bem infeliz e que abre margem para o uso manipulativo, servindo, intencionalmente ou não, como um aliado da desinformação, sobretudo porque, segundo o próprio enquadramento do IBGE, pretos e pardos são categorias distintas juntamente com brancos, amarelos e indígenas. Podemos notar que certos militantes, visando a exagerar e dramatizar seus argumentos, tendem a transformar os pardos em pretos em presídios – subsidiando narrativas como a do encarceramento em massa da população negra – e em brancos nas universidades – sugerindo que estes sejam ambientes de amostra da segregação racial. Ironicamente, o estudo do IBGE contrapõe o argumento. Aliás, o que o estudo revela é que, assim como uma parcela expressiva da população brasileira, os pardos também são significativos nas universidades

O estudo, como sugerido pelo nome visa a apontar “desigualdades” entre brancos e negros (pretos e pardos). O problema é que, se considerarmos que há mais pardos do que brancos, essas estatísticas não traçam um cenário realista da população brasileira. Poderíamos usar a estratégia do presídio e inverter a lógica, somando pardos com brancos, o que seria igualmente irrealista para os argumentos sustentados, já que a maioria da população continuaria sendo miscigenada.

Juntando as duas categorias como se fossem a mesma coisa, o estudo chega a conclusões como a de que a população de pessoas desocupadas é de 64,2% dos “negros” contra 34,2% de brancos, ou de que o rendimento médio real habitual de pessoas ocupadas é de R$3.282 para os brancos contra R$2.082 para os negros em ocupações formais, e de R$1.814 para os brancos contra R$1.050 para os negros em ocupações informais.

Alguém poderia arguir que, se ao invés de somados aos pretos, os pardos fossem somados aos brancos, alguns números poderiam ser ainda mais alarmantes em termos de “desigualdade” para a população de pretos, mas aí que está o X da questão, pois, como vimos, estes perfazem menos de 10% da população brasileira, o que obviamente explicaria menor peso percentual em universidades, por exemplo. Talvez por isso haja um fetiche tão grande em colocar os pardos na conta, pois se a “população negra” resultante é de mais da metade da população, então isso daria peso à estratégia de se cobrar a mesma fatia de presença e participação em diferentes contextos, o que se personifica muitas vezes em políticas públicas (feitas com dinheiro público), como no caso das cotas raciais.

Não vejo sentido em classificar os pardos como negros e vejo menos sentido ainda em usá-los para pintar um cenário de maior desigualdade racial quando estes são justamente os que melhor demonstram a miscigenação do povo brasileiro, a mistura de cores e etnias que é obstáculo para as tentativas de polarizar negros (pretos) e brancos, sobretudo quando políticas públicas serão paridas a partir daí.

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Gabriel Wilhelms

Gabriel Wilhelms

Graduado em Música e Economia, atua como articulista político nas horas vagas. Atuou como colunista do Jornal em Foco de 2017 a meados de 2019. Colunista do Instituto Liberal desde agosto de 2019.

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