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O que é governo? – Breve análise da obra “Segundo tratado sobre o governo” de John Locke

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Certa vez, um filho pequeno de um amigo lhe perguntou: “Pai, o que é o governo?” Mas ele respondeu algo de bate pronto para se livrar do questionamento simples, mas profundo. Ao me contar este caso, pensei que, de fato, sendo um engenheiro, eu não saberia como responder àquele questionamento. Graças a John Locke, por um livro escrito no século XVII (Segundo Tratado sobre o Governo Civil), podemos entender o que é o governo civil.

O conceito de direito natural

O primeiro conceito tratado no livro é o do direito natural. Não é um direito tratado em constituições ou leis. É a condição natural de perfeita liberdade na qual cada homem possa ditar suas ações e desfrutar de seus bens da forma que entender, sem depender da vontade de outro. Trata-se do conceito de liberdade – e liberdade não como licenciosidade, pois o fato de sermos naturalmente livres, iguais e independentes não nos consente o direto de fazer mal ao próximo, atentando contra sua saúde e liberdade, ou seus bens.

Tendo estes conceitos firmados, John Locke discorre que todo homem deveria ser impedido de violar os direitos do outro, pois o direito natural deve ser respeitado para que haja garantia da paz. Quando este direito é violado, o infrator confessa viver de acordo com outra lei que não a da razão. Todos nós, naturalmente, queremos usufruir das ações e bens, frutos do nosso trabalho.

Porém, para o homem desfrutar das suas ações e de seus bens, este deve ter a propriedade deles. Somente se torna proprietário dos bens aquele que lhes dedicou seu trabalho. Locke traz o conceito de que é o próprio trabalho que estabelece os diversos valores de cada coisa e é devido ao trabalho que devemos a maior parte de todos os produtos úteis.

O direito à propriedade

Ciente de que todo homem tem naturalmente o direito a essa liberdade, ele tem um poder inato de buscar preservar sua propriedade, ou seja, sua vida, sua liberdade e seus bens. Então, buscando viver uma vida confortável e pacífica, esse homem aceita viver em sociedade e, neste ambiente, terá maior segurança contra aqueles que não fazem parte dela.

Logo, o grande objetivo que os homens têm quando entram na sociedade sob jugo de um governo é poder aproveitar seus bens em paz e em segurança, e o principal instrumento e os meios para que isso ocorra são as leis estabelecidas nessa sociedade. “O homem delega poder aos governantes para que, então, ele possa conduzir a preservação de si mesmo e de toda humanidade. Para que a finalidade e a medida desse poder, quando nas mãos de cada homem no estado de natureza, visem à preservação de toda a sociedade, isto é, de toda a humanidade em termos gerais, o poder não pode ter qualquer outra finalidade ou medida, quando nas mãos dos magistrados, exceto o de preservar os membros da sociedade em suas vidas, liberdades e posses.”

Em síntese, o homem, quando vive em uma sociedade, estabelece um contrato social, realizando consentimentos individuais e dando poderes ao governo para que sejam feitas leis e regras que funcionem como guardas ou limites das propriedades de todos os membros da sociedade. Ou seja, respondendo ao nosso colega, o governo são aqueles representantes da sociedade que escolhemos conscientemente (alguns nem tanto) para que possam preservar os membros desta sociedade em suas vidas, liberdades e posses. Nada mais que isso.

A intervenção do governo, segundo John Locke

Quando fora deste foco, o governo irá interferir em áreas de suas vidas e de suas posses em que não houve seu consentimento! Um estupro moral! Podemos citar diversos casos em nossa história recente no Brasil em que fomos literalmente saqueados por aqueles que deveriam ser guardiões de nossas vidas, liberdades e posses – traidores divinizados por aqueles que querem vida mansa sem esforço do trabalho. Conforme escreve Locke, “quando as pessoas são levadas à miséria, e se veem expostas ao mau uso do poder arbitrário, por mais que falem, seus governantes são filhos de Júpiter, e, portanto, sagrados e divinos, autorizados oriundos do céu. Geralmente, maltratado e sem direitos, o povo estará pronto em qualquer ocasião para livrar de uma carga que pesa demais sobre seus ombros.”

Espero que estejamos prontos, tendo lucidez e razão para exercer nosso direito natural, usufruir dos bens de nosso trabalho – e ainda, como conhecedores incipientes como este engenheiro que vos fala, entender e lutar por governos livres que entendam que seu simples papel é preservar a vida, a propriedade e liberdade.

Breves citações que ilustram os pontos centrais da obra

Pág. 29. “Para entendermos exatamente o que é o direito de poder político derivá-lo da origem, precisamos considerar a condição natural de todos os homens; ou seja, uma condição de perfeita liberdade que os possibilite ditar suas ações, e dispor de seus bens e pessoas como bem entenderem, e dentro dos limites do direito natural, sem pedir autorização nem depender da vontade de qualquer outro homem.”

Pág. 30. “Mas, embora esse seja um estado de liberdade, não é um estado de licença. Ainda que o homem desfrute da total liberdade de dispor de seus bens ou de si mesmo, não é livre para causar a própria destruição nem a de qualquer criatura que lhe pertença, exceto por algum motivo mais nobre que a sua própria conservação, O estado de natureza é com posto por um direito natural que favorece todos os homens. A razão que ensina a toda humanidade, que dela tira proveito, pois, por sermos todos iguais e independentes, não devemos fazer mal ao próximo, atentando contra sua saúde e liberdade, ou seus bens.”

Pág. 31. “E que todos os homens sejam impedidos de violar os direitos ou de causar qualquer mal ao próximo; e que o direito natural seja respeitado, garantindo a paz e a preservação de toda a humanidade; a execução direito natural fica, dessa forma, na mão de cada homem, permitindo que os ofensores da lei sejam punidos de acordo com suas violações.”

Pág. 31. “A reparação e a punição são os dois únicos motivos que permitem que uma pessoa faça legalmente mal à outra. Ao violar o direito natural, o infrator confessa viver de acordo com outra lei que não a da razão e a da igualdade.”

Pág. 38. “O estado de natureza caracteriza- pela situação em que os homens vivem de acordo com a razão, sem um superior que lhes seja comum no planeta com autoridade para proferir julgamentos entre eles.

Pág. 44. “Embora a Terra e todas as criaturas inferiores sejam comuns a todos os homens, cada um é proprietário de si mesmo; e nenhum homem tem qualquer direito sobre outro homem, salvo sobre si mesmo.

Pág. 45. “Embora a água da fonte seja de todos, quem pode duvidar que a do jarro pertença tão somente àquele que a tirou? Foi o trabalho desse homem que tirou a água das mãos da natureza, em que ela era comum e pertencia igualmente a todas as pessoas, transformando-se em seu proprietário…Portanto, essa lei da razão faz com que o cervo seja de propriedade do indígena que o matou; transforma em proprietário dos bens aquele que lhes dedicou seu trabalho, mesmo antes que tais bens fossem comuns a todos.”

Pág. 51. “É o próprio trabalho que estabelece os diversos valores de cada coisa”

Pág. 52. “Verificamos que o valor que o trabalho agrega excede o valor das coisas in natura, ou seja, o trabalho é o responsável por grande parte das coisas que nos são agradáveis neste mundo.”

Pág. 53. “Ou seja, é ao trabalho que devemos a maior parte de todos os produtos úteis”

Pág.63. “Portanto, nascemos livres e racionais, mas temporariamente inaptos a exercer essas condições. A idade traz com ela a liberdade e também, a razão.”

Pág. 77 “O homem nasceu, como já provado, com direito à liberdade perfeita e ao gozo livre de todos os direitos e privilégios da lei natural, assim como com qualquer outro homem ou grupo de homens no mundo. Ele tem um poder inato não apenas para preservar sua propriedade, ou seja, sua vida, liberdade e bens, contra danos e ataques promovidos por outros homens, mas também para julgar e punir as brechas da lei nos outros”

Pág. 78. “Quando um homem entra na sociedade civil, e se torna membro de uma comunidade civil, renuncia a seu poder para punir transgressões contra o direito natural, no prosseguimento de seu próprio julgamento.”

Pág. 83. “Nenhum homem na sociedade civil pode ser imune às leis vigentes”

Pág.87 “Os homens são, como já foi dito aqui, todos livres, iguais e independentes por natureza, nenhum homem pode ser demovido dessa condição, e sujeito ao poder político de outrem, sem o seu consentimento. A única forma pela qual alguém pode recusar sua própria liberdade natural e prender-se às limitações da sociedade civil é aceitando fazer parte de uma comunidade, com outros homens; para que juntos possam buscar uma vida mais confortável e pacífica, que permita que desfrutem de seus bens, e que proporcione uma maior segurança contra aqueles que não façam parte dela.”

Pág. 101 “A finalidade maior e principal de os homens se unirem em comunidades civis, de acordo com o jugo de um governo, é a preservação de suas propriedades.”

Pág. 107 “A grande finalidade que os homens tem quando entram na sociedade é poder aproveitar de seus bens em paz e em segurança, e o principal instrumento e os meios para isso são as leis estabelecidas nessa sociedade.”

Pág. 114 “Em primeiro lugar, os governantes devem atuar por meio de leis estabelecidas e promulgadas, não podendo alterá-las em casos particulares. Em segundo lugar, tais leis devem ser definidas visando ao bem do povo. Em terceiro lugar, o legislativo não deve aumentar impostos sobre as propriedades do povo, sem seu consentimento, que é concedido diretamente pelo próprio povo. Em quarto lugar, o legislativo não deve nem pode transferir o poder de fazer leis a quaisquer outras pessoas.”

Pág. 134 “O homem delega poder aos governantes para que, então, ele possa conduzir a preservação de si mesmo e de toda humanidade. Para que a finalidade e a medida desse poder, quando nas mãos de cada homem no estado de natureza, visem à preservação de toda a sociedade, isto é, de toda a humanidade em termos gerais, o poder não pode ter qualquer outra finalidade ou medida, quando nas mãos dos magistrados, exceto o de preservar os membros da sociedade em suas vidas, liberdades e posses.

Pág. 162. “A razão pela qual os homens decidem viver em sociedade e a preservação de sua propriedade. E o proposito pelo qual escolhem e autorizam o legislativo é o de que sejam feitas leis e regras que funcionem como guardas ou limites das propriedades de todos os membros da sociedade.”

Pág. 164 “Quando as pessoas são levadas à miséria, e se veem expostas ao mau uso do poder arbitrário, por mais que falem, seus governantes são filhos de Júpiter, e, portanto, sagrados e divinos, autorizados oriundos do céu. Geralmente, maltratado e sem direitos, o povo estará pronto em qualquer ocasião para livrar de uma carga que pesa demais sobre seus ombros.”

*Alberto Souza Vieira é Associado do Instituto Líderes do Amanhã.

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