O estratégico diferente e a tática da mesmice
Sou quase um sexagenário. Nos livros em que estudei, estratégia significava ser distintivo, ofertando uma solução exclusiva e melhor para os problemas dos consumidores. Como professor, minha primeira aula – 01 – contempla a estratégia como, fundamentalmente, ser diferente dos demais competidores, aportando sempre a surpresa, e, se possível, com algo que seja inovador e útil.
Porém, os tempos mudam e, nesta era moderna e progressista, as coisas parecem ter se transformado… Muito embora muitos “especialistas” por aí reputem – e confundam – tecnologias em geral com estratégia, sem dúvida, acreditava-se que tais tecnologias dotariam as empresas de maior capacidade e vigor para satisfazerem seus clientes com valor distintivo, superior e, portanto, sendo, pelo menos, um pouco mais difícil de ser reproduzido pelos concorrentes. Isso as conduziria a uma lucratividade maior.
A triste ironia a que chego é a de que a estratégia “trancou-se no armário”, desaparecendo a surpresa estratégica do diferente, mesmo num mundo com inúmeras e inovadoras capacidades tecnológicas. Pouca gente questiona. Na verdade, as ferramentas tecnológicas têm protagonizado a supremacia da tática sobre a estratégia, homogeneizando as iniciativas empresariais, enquanto as tornam cada vez mais iguais.
Jocosamente, a capacidade de acessar os gostos e os comportamentos dos consumidores, as ferramentas eletrônicas de contato com os clientes, as táticas e os métodos de previsão de tendências, deixaram todas as organizações praticamente iguais, operando no reino da mesmice. Por exemplo, na propalada “fast-fashion”, a Zara se notabilizou por sua capacidade de lançar rapidamente roupas com designs mais ousados, não só alinhados com as tendências, mas ela própria criando essas tendências, a preços mais competitivos, globalmente. Os computadores e a internet que suportaram a estratégia da Zara em seu trabalho criativo tornaram todos os concorrentes muito parecidos, resultando em menor criatividade e em escassez de surpresa estratégica. Na verdade, todas as empresas parecem as mesmas, já que umas copiam das outras.
Neste mundo progressista, todas as organizações aparentam serem nobres, bondosas e iguais, independentemente do negócio em que se encontram. Entretanto, parece que elas esqueceram que clientes diferentes valorizam e compram distintas espécies de valor. Evidente que nem todos os consumidores, de fato, pagam e valorizam pelo foco de ofertas competitivas em públicos da comunidade LGBTQIA+. Pelo menos as áreas de RH e Marketing não ficam nem um pouco desconfortáveis com tal foco; a nova ortodoxia é a visão desse grupo.
Ou eu que sou um “old fashioned”! As tecnologias da informação e a “nova cultura” não só impulsionam, mas também pressionam pela conformidade e pela mesmice! Lamentável a situação de que até mesmo a busca por eficiência no curto prazo, na questão de redução de custos, force as empresas a preterir o estratégico pelo tático.
Até com a hiper-polarização política, embora os lados sejam distintos, o comportamento e o produto da bílis são praticamente os mesmos.
Penso que a era da padronização, do tático e da mesmice terá que amainar… Estratégia tem a ver com as escolhas a respeito do futuro, mas que se fazem no presente, uma vez que precisa-se investir e construir desde já. É essencial trabalhar para construir os recursos e as capacidades que gerarão as novas soluções para os problemas dos clientes dentro de um determinado negócio, e que devem surpreender os consumidores.
Essa capacidade estratégica de surpreender depende da capacidade de tornar o imaginado possível de acontecer. Evidente que as escolhas estratégicas contemplam riscos, porém, faz parte do processo estratégico calcular tais riscos e estar preparado para um eventual insucesso.
Estratégia é, com certeza, muito distinto da atual e farta mesmice. Estratégia é criar uma proposta de valor única e superior, que os clientes percebem e pagam por ser diferente. Por sua vez, a organização ganha mais dinheiro.
Para isso, os executivos precisam estar desconfortáveis com o momento e, pelo contrário, confortáveis em serem imprevisíveis!
Exigem-se conhecimentos, experiência, ousadia, planejamento, conhecimento tácito de mercado e gerenciamento de riscos. Diversamente da “moderna” homogeneização, é necessário “tirar do armário empresarial” os instintos criativos, as ideias e o conhecimento estratégico dos indivíduos, a fim de que o diferente e a surpresa estratégica possam enriquecer os consumidores e as empresas.