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Liberdade e Felicidade

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O IBOPE divulgou recentemente uma pesquisa cujo resultado é intrigante para alguns: 71% dos brasileiros consideram boa a vida que levam.  Para muitos, especialmente para quem costuma avaliar a felicidade alheia em função de parâmetros objetivos, quando não de seus próprios parâmetros subjetivos, este índice pode parecer absurdo. Afinal, como uma população majoritariamente ignorante, com uma renda per capita baixa, desprovida de segurança, saneamento básico ou assistência de saúde digna pode considerar-se feliz?  Como é que um favelado, morando em condições de extrema insalubridade, pode considerar-se satisfeito? 

Erasmo de Rotterdam explicou esta aparente contradição, em seu magnífico “Elogio da Loucura”: “Acreditar que a felicidade do homem está nas coisas mesmas é levar a extravagância ao extremo.  Somente a fantasia nos faz felizes.  Tudo, no mundo, é tão obscuro e variável que é impossível saber alguma coisa ao certo…; ou, se alguém consegue saber alguma coisa, é quase sempre em detrimento da felicidade da vida.  Enfim, o homem é feito de maneira que as fantasias lhe causam muito mais impressão que a verdade.” 

Ignorando as lições de Erasmo, muitos ainda enxergam a vida como se os seres humanos tivessem os mesmos gostos, as mesmas ambições, aflições e interesses.   Não se conformam que a felicidade seja um conceito exclusivamente subjetivo e individual, que não pode ser dada de presente ou imposta a ninguém, mas deve, necessariamente, ser buscada por cada um e, para que isso seja possível, é preciso que haja liberdade.

Lembrei de Erasmo ao verificar, dia desses, que a recepcionista do escritório, cujo salário é bem menor que o meu, tinha em mãos um smartfone de última geração – muito mais moderno e cheio de (in)utilidades que o meu próprio.  Embora deva estar pagando o seu “brinquedo” em um monte de prestações, além de arcar com os altíssimos juros praticados pelo comércio e as respectivas tarifas da operadora, parecia realmente satisfeita.

Provavelmente, vai deixar de consumir, por um bom tempo, itens que, a meu juízo, seriam muito mais necessários.  Eu, no seu lugar, economizaria tudo que pudesse para a educação dos filhos.  Cheguei a pensar em sugerir a ela que tentasse poupar um pouco do salário todo mês, para eventuais necessidades, pois nunca se sabe o dia de amanhã.  Mas desisti.  Provavelmente, meus “conselhos” soariam como interferência indevida em sua vida, até porque nossa relação é de patrão e empregado.  Além disso, deduzi naquele mesmo momento que o que a faz feliz é muito diferente de tudo que eu possa sequer imaginar.

Como bem ensinou John Stuart Mill em seu Ensaio sobre a Liberdade, Os seres humanos devem mutuamente ajudar-se a distinguir o melhor do pior e animar-se à escolha do primeiro e à recusa do segundo. Devem sempre achar-se entregues a um mútuo estímulo do exercício crescente das mais altas faculdades, e da crescente orientação dos sentimentos e desígnios para objetos e contemplações sábios, e não tolos, que elevem, e não que degradem. Não assiste, porém, a uma pessoa, ou a qualquer número de pessoas, autoridade alguma para dizer a outra, de idade madura, que não deve fazer da sua vida, em seu próprio beneficio, o que decidiu fazer.”

(…) “Consiste esse princípio em que a única finalidade justificativa da intervenção dos homens,  individual e coletivamente, na liberdade de ação de outrem, é a auto-proteção. O único propósito com o qual se legitima o exercício do poder sobre algum membro de uma comunidade civilizada contra a sua vontade, é impedir dano a outrem. (…) O individuo não pode, legitimamente, ser compelido a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, porque tal seja melhor para ele, porque tal o faça mais feliz, porque na opinião dos outros tal seja sábio ou reto”.

Por tudo isso, é espantoso que alguns iluminados, não raro imbuídos das melhores intenções, se arvorem a querer fazer escolhas pelos outros, proibindo ou autorizando, através da mão pesada do Estado, apenas aquilo que consideram bom ou sensato, de acordo com os seus próprios valores.  É o caso, por exemplo, da proibição às drogas, à prostituição, ou das famigeradas regulamentações que proíbem o endividamento pessoal além de determinado percentual da renda, ou limitam o número de prestações do crédito ao consumidor.  Em resumo, o Estado não existe para ser babá de ninguém.  Seu foco, ao contrário, deveria ser justamente garantir a liberdade dos indivíduos, inclusive para fazer escolhas erradas.

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João Luiz Mauad

João Luiz Mauad

João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta do Povo.

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