A gritaria por trás da PEC 241: interesses concentrados e custos dispersos
A gritaria do PT e seus esbirros em torno da aprovação em 1º turno da PEC do teto dos gastos é enorme. Chegam ao absurdo de dizer que é hora de o governo gastar mais, não menos, apesar de todas as evidências da falência do estado tupiniquim. A senadora Vanessa Grazziotin, por exemplo, em artigo hoje na Folha de São Paulo, escreve que “saúde, educação, assistência social, ciência e tecnologia, esporte, habitação, saneamento, segurança, cultura, agricultura, indústria, meio ambiente, turismo, o Poder Judiciário, o Ministério Público, bem como a política de aumento real do salário mínimo e programas como Bolsa Família, Luz para Todos, Mais Médicos, etc. estarão comprometidos e mesmo inviabilizados.
Esse novo regime fiscal, se aprovado, destruirá as bases do modelo de cidadania alcançado em 1988. Não por acaso, a PGR e o próprio STJ se manifestaram contra a proposta por ser inconstitucional. E nem poderia ser diferente, na medida em que nasce de um governo ilegítimo, fruto de um “tropeço da democracia”, que pretende definir uma política de Estado para os próximos 20 anos.”
O fato concreto é que, ou a senadora mente propositadamente ou está muito mal informada e sequer leu o texto da PEC. Nenhum gasto social será extinto ou congelado. Apenas não poderá aumentar mais do que a inflação. Longe de mim afirmar que a PEC é perfeita. Nenhuma obra humana, por motivos óbvios, é perfeita. O texto da PEC 241 tem problemas e apontá-los de forma construtiva é uma obrigação daqueles que sonham com um país melhor. Por outro lado, rechaçá-la, pura e simplesmente, é coisa de quem está perdendo privilégios, tem muito a perder com ela ou simplesmente não sabe o que está dizendo.
Como bem resumiu o professor Carlos Melo, do Insper, em excelente artigo no Estadão:
A vida é assim: meio besta; sociedade é o reino da escassez. Uma banana pode ser repartida em infinitas partes, mas rapidamente as cotas tornam-se insuficientes, desagradam a todos. Sociedade é conflito. O mais importante é distinguir a natureza dos interesses que se conflitam: gerais ou específicos?
Este é justamente o momento em que o Brasil vive: depois da bonança das commodities e da indiscriminada distribuição de ilusória felicidade – do Bolsa Família, ao Bolsa Empresário e ao Bolsa Miami –, a escassez se impõe. Não há como tergiversar, nem procrastinar: a água sobe pelos fundilhos, há que se aprender a nadar. O tempo da ilusão se esgota: é preciso saber quem perde e quem ganha com a mudança dos ventos.
(…)
Preservadas e aperfeiçoadas políticas públicas – o que nem sempre implica em aumento de gastos — os efeitos mais duros da inevitável agenda reformista não atingem necessariamente aos mais necessitados. As bolsas em risco não são as Bolsas Família, mas bolsas de algumas elites do funcionalismo e da variedade de grupos de pressão, minoritários em relação ao grosso da população, mas que abocanham a maior parte do bolo. Interesses menores, com poder de pressão, presos à sinecuras públicas: carreiras de Estado, grupos privados de saúde, grupos particulares de educação, empreiteiras, montadoras e sindicatos afins em regimes automotivos; os compulsórios impostos sindicais – de patrões e empregados –, as isenções, os incentivos fiscais… Enfim, as tetas que o clientelismo e o corporativismo desenvolveram.
Enfrentá-los implica numa guerra desigual: os realmente necessitados são desorganizados, pouco ou nada compreendem do que se trata. O status quo, postado em máquinas, têm acesso a autoridades, se comunicam bem e sabem exatamente o que não admitem perder. Transformam espaços institucionais que ocupam em trincheiras de onde questionam a constitucionalidade de medidas; mobilizam massas, garantem espaços de mídia; submetem a opinião pública.
Ao fim e ao cabo, é isso que temos por trás da gritaria: interesses concentrados contra custos dispersos. Mas o que cansa mesmo é a defesa ardente e muitas vezes irrefletida que uma cambada de vaquinhas de presépio faz desses interesses, que na maioria das vezes nem são os seus. O que essa gente engajada não enxerga (ou finge não enxergar em nome de uma ideologia) é que só há três maneiras de financiar o (aumento) do gasto público: (1) mais impostos (acho que disso nem a turma do mimimi gosta, né?), (2) aumento da dívida (que significa mais impostos no futuro e mais juros para os odiados “rentistas” no presente) e (3) emissão de moeda acima do crescimento do PIB (o que gera inflação – o pior dos impostos, como dizia Milton Friedman, pois reduz a renda do cidadão sem nem mesmo ter sido legislado).