Brasil brasileiro: como construir uma mentalidade de riqueza se a escassez vem de cima?

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O Bolsa Família completou, em 2024, vinte anos de existência. Com isso, seria a renda percebida pelos beneficiários um estímulo ao fracasso?

Criado em 2004 pelo governo Lula com a finalidade de reduzir a desigualdade social e promover a inclusão de milhões de famílias em situação de vulnerabilidade, através do combate da pobreza, o Bolsa Família se tornou permanente como um programa de renda mínima destinado a suprir necessidades básicas como alimentação, saúde e educação. De lá para cá, os governantes estenderam o programa, fundamentados em pesquisas que registraram a queda da pobreza na infância e também no fato de ser um calibrador econômico, baseado na premissa de que mais dinheiro em circulação movimenta a economia.

Longe de refletir sobre os índices de redução de pobreza ou a eficiência do programa, cuja ideia é também defendida por liberais como Hayek e Friedman e que possui pontos positivos e negativos, o que se pretende é refletir sobre os efeitos maléficos do uso dessas receitas com jogos de azar, especialmente o tigrinho.

De acordo com a pesquisa Datafolha divulgada em janeiro de 2014, 17% dos beneficiários do Bolsa Família disseram apostar ou já terem feito apostas esportivas online. Desse percentual, quase um terço (30%) relata gastar ou ter gastado mais de R$ 100 por mês. Por certo, uma parte dos beneficiários utiliza o valor para sustento. Porém, a outra parcela, que talvez se baseie na visão de dinheiro fácil do próprio programa, não segue os mesmos ditames.

Contudo, o Bolsa Família não resolve o problema sistêmico da pobreza, causado pelo próprio Estado. Ao revés, estimula o ciclo vicioso em que famílias numerosas (por escolha ou falta de controle de natalidade) são remuneradas por filhos e não por melhoria das condições de moradia, saúde ou por produtividade escolar.

E em que quebra-cabeça se encontra a peça do jogo do tigrinho? Indubitavelmente, no fato de que beneficiários sem ética desviam a finalidade do dinheiro público, mesmo conhecendo as regras. Trata-se de uma mentalidade de indivíduos que transferem a responsabilidade ao acreditar e seguir falsas promessas.

Está claro que a raiz dos males não é só o dinheiro, mas o amor ao dinheiro fácil, caminho contrário aos que querem construir uma sociedade baseada no livre mercado, em que se assume o risco do fracasso, mas também do consequente retorno financeiro ao atender adequadamente o mercado, exercendo a liberdade e iniciativa privada, como bem escreveu Mises em A Ação Humana:

“Numa sociedade regida pelos princípios do mercado livre, não há a menor analogia entre a participação em jogos e a condução de negócios. O jogador de cartas ganha dinheiro de seu antagonista servindo-se de habilidades e astúcias. O empresário ganha dinheiro fornecendo aos consumidores os bens que desejam adquirir. Pode haver uma analogia entre o jogador de cartas e o blefista. Não há necessidade de aprofundamento neste assunto. Quem considerar a condução de negócios como trapaça está na pista errada.”

De outra forma, tem-se uma ilegalidade dos que praticam e apostam o Bolsa Família nos jogos do tigrinho, usando dinheiro público e cometendo crime contra si, acreditando em ilusões de dinheiro fácil e rejeitando a responsabilidade individual.

O fato de receber um benefício assistencial do governo e utilizá-lo em uma aposta, baseando esse tradeoff exclusivamente sobre o retorno financeiro (esforços mínimos, lucros máximos), demonstra mentalidade anticapitalista e como o fracasso está arraigado na população brasileira. A construção de uma sociedade baseada na liberdade econômica e no mérito demanda mais do que programas assistenciais.

A solução brasileira está, primeiro, na visão de menos Estado e, quem sabe, na mudança total do programa, para que o foco seja o desenvolvimento de autonomia intelectual e educacional, para que as escolhas individuais se baseiem no longo prazo, não no curto prazo.

É necessário um esforço integrado que valorize a educação financeira, o incentivo ao empreendedorismo e a criação de oportunidades que ampliem a autonomia dos cidadãos.

Deve-se buscar um equilíbrio entre a proteção social e a promoção de uma mentalidade capitalista ética e responsável, em que o risco e o retorno sejam frutos do esforço e da iniciativa individual. Apenas assim será possível reverter o círculo vicioso de dependência e criar as bases para uma sociedade mais próspera e justa.

*Efigenia Brasilino é associada II do Instituto Líderes do Amanhã. 

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