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A regulação de agências reguladoras

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No início de maio de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou requerimento para um Projeto de Decreto Legislativo, o PDL 94/22, com a proposta de suspender o reajuste tarifário, no valor de 24%, a ser realizado na distribuidora de energia Enel-CE. A proposta segue agora para análise e deliberação pelo Senado. O ponto peculiar dessa situação é que o reajuste da distribuidora foi chancelado justamente por uma das principais agências reguladoras do governo federal: a Aneel.
Iniciado na segunda metade da década de 1980, o processo de privatização de empresas estatais, que se arrasta até os dias atuais, foi responsável por inaugurar diversas agências reguladoras, que possuíam a premissa de manter algum controle estatal sobre tais mercados, agora entregues à iniciativa privada. Ao contrário do setor de telefonia, regulado pela Anatel, em que é possível ter ampla concorrência em um mesmo perímetro, o setor elétrico apresenta dinâmica diferente.

No setor elétrico, devido ao alto investimento para construir e manter a infraestrutura necessária, as empresas envolvidas obtêm concessões que podem durar décadas, para que no longo prazo consigam rentabilizar seus investimentos. Essa característica tira do consumidor a possibilidade de escolher a empresa que o atenderá, tal como um monopólio. Para evitar os efeitos danosos dessa prática, a Aneel se tornou uma das mais implacáveis agências reguladoras. O que nem todo consumidor sabe é que a Aneel exige constantes evoluções das empresas do segmento, fazendo com que busquem melhores níveis de eficiência e de qualidade de energia, por exemplo, sempre penalizando empresas de performance pior que seus respectivos pares. Para que cada real investido pela empresa de energia possa ser repassado ao consumidor, uma série de critérios técnicos devem ser atendidos, e todo sobre-preço, derivado de ineficiência ou má gestão de fornecedores, por exemplo, é glosado pela agência. Essa soma de fatores, por si só, já demonstra que a revisão aplicada no Ceará não é fruto de desperdícios ao longo da cadeia produtiva.

Um outro ponto nem tão conhecido é o modelo de negócio do setor elétrico em si, que pode ser segregado em três principais etapas: geração, transmissão e distribuição. Este último apresenta um importante papel, sendo responsável por arrecadar e repassar os custos produtivos das etapas anteriores. Ou seja, ao arrecadar os valores faturados nas contas de luz, as distribuidoras fazem os devidos repasses de recursos para as transmissoras e geradoras, retendo apenas 20% do total, conforme apurado pela XP Investimentos. Logo, ao impedir o reajuste nas distribuidoras, o governo concentra o prejuízo de sua ação apenas na ponta final da cadeia.

Ainda de acordo com a XP, os investimentos nesse setor totalizaram cerca de 136 bilhões de reais na última década (2010 a 2019), representando importante soma na geração de riqueza e empregos para a população, além dos benefícios decorrentes de melhorias nas redes de energia elétrica. Ao tentar regular esse mercado, já altamente regulado, e com objetivos puramente populistas, o governo reforça a insegurança jurídica do país, correndo sempre o risco de provocar êxodo de capital e colocar as concessões à mercê, eventualmente, de empresas menos eficientes.

Portanto, além dos malefícios inerentes de qualquer intervenção estatal, esse ato se mostra, antes de mais nada, muito imprudente, ao prejudicar fortemente o retorno financeiro da iniciativa privada do setor elétrico. Vale lembrar que, no passado, outras intervenções governamentais semelhantes trouxeram impactos. Em 2012, durante o governo da presidente Dilma Rousseff, uma iniciativa para controlar os preços de geração de energia trouxe grande prejuízo ao setor elétrico, sendo repassado posteriormente justamente ao consumidor final. Na ocasião, para conter o aumento de custos de geração ocasionado por uma crise hídrica, o governo publicou a Medida Provisória 579, que limitou artificialmente as tarifas da cadeia produtora. Agora, o desfecho não será diferente, caso tal lei seja levada adiante. O reajuste a ser feito no Ceará se mostrou um ato inicialmente chancelado pelo governo, mas que corre risco de ser revisado pela própria entidade, inaugurando um novo segmento: o de regulação de agências reguladoras.

Gabriel Barbosa é colaborador no Instituto Líderes do Amanhã.

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