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“Brasil: A Última Cruzada” – A revalorização dos heróis da pátria Brasil

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Nesta semana, a informação de que a série Brasil: A Última Cruzada, série de seis episódios produzidos pelo Brasil Paralelo, seria transmitida pela TV Escola causou um certo rebuliço nas redes sociais. Enquanto alguns influenciadores comemoraram a notícia, outros criticaram, alegando que seria “propaganda ideológica” e uma peça de revisionismo histórico.

Primeiramente, a série A Última Cruzada NÃO É, de forma alguma, uma produção revisionista. Ela carrega um claro viés ideológico? Sim; mas ela distorce fatos para favorecer a causa direitista? Não. Caso a resposta da segunda pergunta fosse sim, aí sim seria revisionismo histórico (como dizer que o Golpe de 1964 não foi um golpe, e sim uma contrarrevolução, por exemplo).

Dito isso, falemos da série em si. Não preciso dizer o quão esteticamente brilhante a série é; quem costuma acompanhar as produções do Brasil Paralelo sabe muito bem disso. Sobre o conteúdo, posso dizer sem sombra de dúvidas: essa é a produção audiovisual mais importante que a direita brasileira produziu sobre a história do Brasil. O resgate que a série faz sobre personagens pouco lembrados ou até mesmo desprezados pelo “mainstream” histórico brasileiro, como José Bonifácio e Princesa Isabel, é de uma grande importância se quisermos manter a memória cultural viva.

A série se divide em seis episódios. O primeiro episódio serve como um prelúdio, é a história antes de 1500. O episódio conta como o povo ibérico resistiu à invasão moura em suas terras e retrata principalmente a expansão e o fortalecimento do Império Português, com a chegada ao poder de Dom João I da Dinastia de Avis, em 1385. Na era Avis, Portugal, que até então era considerada “a terra do fim do mundo”, se torna uma das nações mais poderosas do século XV e se lança ao mar em busca do Novo Mundo, em um período que ficaria conhecido como “As Grandes Navegações”.

Um ponto muito importante a se retratar nesse episódio é a visão da descoberta do Brasil. Como diz o historiador Thomas Giulliano, “na lógica portuguesa não existe casualidade quando se acredita na providência. O português tradicionalista não se importa se chegou a determinado local sem querer ou por querer: ele acredita que está ali por um motivo, e esse motivo é missionário”. Isso é algo que dá para perceber na carta de Pero Vaz de Caminha.

Além disso, como bem lembrou o atual presidente da Biblioteca Nacional Rafael Nogueira, “não faz sentido a tese de que Portugal desbravou o mar apenas para procurar especiarias, é um desconhecimento do que era Portugal na época”. Luiz Phelippe de Bragança diz o seguinte: “Você não lança um navio ao mar, rumo ao desconhecido, para encontrar apenas o Pau-Brasa, você vai em busca de um objetivo maior, um novo mundo, a “Terra Prometida””.

Para não estragar a experiência de quem ainda não assistiu à série, não irei dar tantos spoilers; eu me limitarei a comentar o que eu considero mais pertinente. O segundo episódio se situa entre 1500 e a era pombalina (segunda metade do século XVIII). Retrata a Ordem dos Jesuítas e a expansão territorial encabeçada pelos bandeirantes. O ponto importante é mostrar a formação do que chamamos de povo brasileiro. Carregamos uma vasta história e somos, por essência, frutos da mistura de três povos: do índio, que habitava a “Terra Prometida” antes da descoberta dos portugueses em 1500; do português que desbravou o oceano e o desconhecido para chegar ao Brasil e o negro que chegou ao nosso chão pela mazela da escravidão.

Os episódios que considero mais importantes para promover o resgate da historiografia brasileira são os episódios 3, 4 e 5. São os episódios que considero como a chave fundamental para que possamos resgatar o sentimento de orgulho de ser brasileiro.

O episódio 3 se situa entre o início da Revolução Francesa (1789) e o retorno de Dom João VI a Portugal (1820). O episódio serve para nos dar uma outra visão de Dom João VI. A imagem que se cristalizou no imaginário popular é a de um governante covarde e bufão, sendo que na realidade as coisas não são “preto no branco” como o ensino da história tenta mostrar. Uma nova era se iniciava na Europa, uma era que marcou o fim do absolutismo monárquico e do mundo ocidental como conhecíamos. O fim da Revolução marcou a ascensão de Napoleão Bonaparte, que passou a subjugar outros países europeus, destronando reis e pondo fim às dinastias. O próximo alvo de Napoleão era Portugal, que se recusara a boicotar a Inglaterra. Em uma tática para salvar a Dinastia dos Bragança, Dom João VI levou toda a Família Real para o Rio de Janeiro, deixando Napoleão “a ver navios”. Anos depois, Bonaparte reconheceu que o monarca português foi a única pessoa que o conseguira enganar.

A chegada da Corte ao Brasil mudaria para sempre a história da Nação. O Brasil passara a abrigar não apenas a Corte Portuguesa, mas sim um dos últimos resquícios da civilização ocidental como a conhecíamos. O episódio se encerra com a difícil decisão de Dom João, que teve de abdicar da convivência com o filho e da própria felicidade para voltar a Portugal.

O episódio 4 é o episódio mais emocionante da série. É o episódio que retrata a independência do Brasil e o Primeiro Reinado, tendo foco em três grandes personagens: Dom Pedro I, José Bonifácio e a Princesa Leopoldina.

A síntese do episódio se encontra na carta que Bonifácio escreveu para Pedro I:

“Senhor, as cortes ordenaram a minha prisão por obediência a vossa alteza, e no seu ódio imenso de perseguição atingiram também aquele que preza em voz servir com lealdade e a dedicação do mais fiel amigo e súdito.

O momento não comporta mais delongas ou condescendências, a revolução já está preparada para o dia de sua partida; se parte, temos a revolução no Brasil contra Portugal, e Portugal, atualmente não tem recursos para subjugar um levante que é preparado publicamente para não dizer quase visivelmente.

Se fica, tem vossa alteza contra si o povo de Portugal, a vingança das cortes, e direi até, a deserdação que dizem já estar combinada.

Ministro fiel que arrisquei tudo por minha pátria e pelo meu príncipe, servo obedientíssimo do senhor Dom João VI que as cortes tem na sua detestável coação; Eu como ministro, aconselho a vossa alteza, que fique e faça do Brasil um reino feliz, separado de Portugal, que é hoje escravo das cortes despóticas.

Senhor, ninguém mais do que sua esposa deseja a sua felicidade, e ela lhe diz em carta que com esta será entregue, que vossa alteza deve ficar e fazer a felicidade do povo brasileiro que o deseja como seu soberano, sem ligações de obediência às despóticas cortes portuguesas que querem a escravidão do Brasil e a humilhação do seu adorado príncipe regente.

Fique é o que todos pedem ao magnânimo príncipe que é vossa alteza, para o orgulho e felicidade do Brasil.

E se não ficar, correrão rios de sangue, nessa grande e nobre terra, tão querida do seu real pai, que já não governa em Portugal por opressão das cortes, nesta terra que tanto estima vossa alteza e a quem tanto vossa alteza estima.”

O episódio 4 retrata a ascensão, a decadência e a redenção moral de Dom Pedro I. A ascensão pelo fato de ter liderado a luta pela independência da nossa pátria; a decadência pelas inúmeras brigas com Bonifácio e o sofrimento que ele causou a Leopoldina devido ao caso extraconjugal com Domitila de Castro, a Marquesa de Santos; e a redenção que ele deu à sua vida após perder Leopoldina e o seu retorno a Portugal, para impedir o triunfo do tirano irmão, o príncipe Miguel. A melhor frase que define o primeiro monarca brasileiro foi dita por Bonifácio a Dom Pedro II: “Dom Pedro não morreu. Apenas homens ordinários morrem, heróis não”.

O episódio 5 é o que me motivou a escrever este artigo. O episódio retrata o Segundo Reinado e traz uma peça importante para a história do Brasil: a Princesa Isabel. A princesa que lutou com unhas e dentes pela abolição da escravatura e que sacrificou tudo para pôr fim ao nefasto regime escravagista.

E é por isso que me causa asco ver o quanto a esquerda brasileira tenta, a todo custo, destruir e subjugar a importância da Princesa a esta nação. A nação que esqueceu o legado de André Rebouças, José do Patrocínio, negros abolicionistas e monarquistas, em prol de uma ideologia que busca recriar a historiografia através da artificialidade e da mentira. A nação que não estuda o Segundo Reinado e que, quando chega na Sapucaí, canta a plenos pulmões o verso “Não veio do céu nem das mãos de Isabel” acreditando que são conhecedores da “real” história brasileira.

Essa é a nossa missão. É preciso devolver a figuras como Bonifácio, Princesa Isabel, Dom Pedro I, Carlos Gomes e Joaquim Nabuco o protagonismo que eles merecem. Não dá mais para relegá-los ao esquecimento, como vem sendo feito nos dias de hoje. O Brasil possui uma história riquíssima. Está na hora de valorizá-la. Dar o reconhecimento àqueles que realmente merecem.

O que nos leva ao último episódio, que retrata a Era Vargas. O “Pai dos Pobres”, retratado até hoje pela jurássica esquerda brasileira como um exemplo a ser seguido, foi o mais perverso governante que o país já teve, cujo “Estado Novo” causou desastrosos legados que permeiam até hoje a sociedade. Aqui valem parênteses. No episódio, Rafael Nogueira comenta o seguinte: “Naquele momento, o Getúlio quer construir um novo Brasil, mas com base em outros elos; quais elos? Por exemplo, o carnaval e o futebol. Bom, eu não tenho nada contra as duas coisas, mas se você precisa tirar os valores principais, que são os valores identitários, e no lugar deles você precisa colocar um esporte e um evento festivo, que é quase uma válvula de escape para o povo brasileiro, de fato você está rebaixando o povo.”

De fato, apagar toda a identidade nacional que levou anos para se desenvolver é prejudicial para o que entendemos como cultura brasileira. Todavia, um evento esportivo como o futebol e um evento festivo como o carnaval ainda assim possuem uma grande importância na sociedade brasileira. Uma cultura rica e diversificada como a nossa poderia muito bem abrigar o melhor que produzimos na nossa “belle époque” (século XIX) juntamente com o que conseguimos desenvolver no século XX. O carnaval é mais que apenas um evento festivo: é uma marca cultural derivada do samba, estilo tipicamente brasileiro surgido no quintal da casa de Tia Ciata. Fora a importância que ele trouxe para a valorização de figuras negras como Xica da Silva e Chico Rei. Então, o carnaval é uma adição na constelação cultural do brasileiro. Quanto à importância do futebol, trago o prefácio que Gilberto Freyre escreveu para o livro “O Negro no Futebol Brasileiro”, de Mário Filho (1947):

“Creio não dizer novidade nenhuma repetindo que por trás da instituição considerável que o futebol tornou-se em nosso país se condensam e se acumulam, há anos, velhas energias psíquicas e impulsos irracionais do homem brasileiro, em busca da sublimação. Essa sublimação estava outrora apenas na oportunidade para feitos heroicos ou ações admiráveis que o Exército, a Marinha e as Revoluções mais ou menos patrióticas abriam aos brasileiros brancos e, principalmente, mestiços ou de cor, mais transbordantes de energias animais ou de impulsos irracionais.

Dessas energias e desses impulsos, alguns eram de sentido sadista, outros masoquista. Uns exibicionistas, outros narcisistas. O que, honestamente reconhecido – pois tais elementos se encontram à raiz de algumas das mais belas expressões de bravura, de heroísmo e de valor até hoje praticadas pelos homens de qualquer cor, condição ou cultura – não importa em desconhecer-se a grandeza ou a beleza desses feitos sob a forma das sublimações que atingiram.

Isto quando essas energias ou esses impulsos, em vez de assim se sublimarem ou de se satisfazerem com os esportes ou os quase-esportes rurais dos dias de festa, ou dos dias comuns, dominantes no Brasil patriarcal – as cavalhadas, as corridas atrás de bois, as caçadas, as pessoas, as noites inteiras de samba ou de dança extenuante, as largas caminhadas pelos sertões, a caça aos índios ou aos negros fugidos, a fuga dos negros aos feitores ou à melancolia da rotina agradaria dos engenhos e fazendas – não se degradaram moral ou socialmente em proezas como as do cangaço ou nos rabos-de-arraia da capoeiragem, célebres na história da sociedade brasileira. Espécies de esportes inteiramente irracionais.

O futebol teria numa sociedade como a brasileira, em grande parte formada de elementos primitivos em sua cultura, uma importância toda especial que só agora vai sendo estudada sob critério sociológico ou para-sociológico. E era natural que tomasse aqui o caráter particularmente brasileiro que tomou. Pois tornou-se o meio de expressão, moral e socialmente aprovado pela nossa gente – pelo Governo, pela Igreja, pela Opinião Pública, pelo Belo Sexo, pela Imprensa – de energias psíquicas e de impulsos irracionais que sem o desenvolvimento do futebol – ou de algum equivalente de futebol – na verdadeira instituição nacional que é hoje, entre nós, teriam provavelmente assumido formas de expressão violentamente contrárias à moralidade dominante em nosso meio.

O cangaceirismo teria provavelmente evoluído para um como gangsterismo urbano, com São Paulo degradada numa sub-Chicago de Al Capones ítalo-brasileiros. A capoeiragem, livre de Sampaio Ferraz, teria provavelmente voltado a enfrentar a polícia das cidades sob a forma de conflitos mais sérios que os antigos entre valentes dos morros e guardas-civis das avenidas, agora asfaltadas. O samba teria se conservado tão particularmente primitivo, africano, irracional que suas modernas estilizações seriam desconhecidas, com prejuízo para a nossa cultura e para o seu vigor híbrido. A malandragem também teria se conservado inteiramente um mal ou uma inconveniência.

O desenvolvimento do futebol, não num esporte igual aos outros, mas numa verdadeira instituição brasileira, tornou possível a sublimação de vários daqueles elementos irracionais de nossa formação social e de cultura. A capoeiragem e o samba, por exemplo, estão presentes de tal forma no estilo brasileiro de jogar futebol que de um jogador um tanto álgido como Domingos, admirável em seu modo de jogar mas quase sem floreios – os floreios barrocos tão do gosto brasileiro –, um crítico da argúcia de Mario Filho pode dizer que ele está para o nosso futebol como Machado de Assis para a nossa literatura, isto é, na situação de uma espécie de inglês desgarrado entre tropicais.

Em moderna linguagem sociológica, na situação de um apolíneo entre dionisíacos. O que não quer dizer que deixe de haver alguma coisa de concentradamente brasileiro no jogo de Domingos como existe alguma coisa de concentradamente brasileiro na literatura de Machado. Apenas há num e noutro um domínio sobre si mesmos que só os clássicos – que são, por definição, apolíneos – possuem de modo absoluto ou quase absoluto, em contraste com os românticos mais livremente criadores.

Mas vá alguém estudar o fundo de Domingos ou a literatura de Machado que encontrará decerto nas raízes de cada um, dando-lhes autenticidade brasileira, um pouco de samba, um pouco de molecagem baiana e até um pouco de capoeiragem pernambucana ou malandragem carioca. Com esses resíduos é que o futebol brasileiro afastou-se do bem ordenado original britânico para tornar-se a dança cheia de surpresas irracionais e de variações dionisíacas que é. A dança dançada baianamente por um Leônidas; e por um Domingos, com uma impassibilidade que talvez acuse sugestões ou influências ameríndias sobre sua personalidade ou sua formação. Mas, de qualquer forma, dança.

Sublimando tanto do que é mais primitivo, mais jovem, mais elementar, em nossa cultura, era natural que o futebol, no Brasil, ao engrandecer-se em instituição nacional, engrandecesse também o negro, o descendente de negro, o mulato, o cafuso, o mestiço. E entre os meios mais recentes – isto é, dos últimos vinte ou trinta anos – de ascensão social do negro ou do mulato ou do cafuso no Brasil, nenhum excede, em importância, ao futebol.”

O episódio mostra outra figura importante para a liberdade de nossa nação: Carlos Lacerda. O jornalista, sempre retratado como um canalha golpista pelos livros de história, foi o principal opositor de Vargas nos anos 1950. O bastião da liberdade contra a tirania.

A série A Última Cruzada é a série que te faz ter orgulho de ser brasileiro. Apesar de todos os problemas, devemos nos orgulhar de quem lutou pela nossa nação, de quem contribuiu muito pelo fortalecimento de nossa cultura. Essa é uma série a que todos deveriam assistir; mesmo não concordando com o viés, é sempre interessante observar outros pontos de vista dos acontecimentos. Está na hora de devolver aos verdadeiros heróis da pátria o seu merecido lugar de destaque.

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Erick Silva

Erick Silva

É graduando em Administração pela UFRRJ e ex-coordenador local do SFL Brasil.

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