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Bloco “Porão do Dops” e o ativismo seletivo do Ministério Público

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A notícia tem um quê anedótico, mas isso tem sido a regra no país, então, para combinar com a época de Carnaval, vamos “sambar conforme a música” e reproduzi-la: um grupo declarado “de direita” em São Paulo fundou um bloco de Carnaval chamado “Porão do Dops” – uma clara referência ao famoso Departamento de Ordem Política e Social, que vigorou na ditadura do Estado Novo e no regime militar -, com imagens do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra no material de divulgação, marcando sua apresentação para o próximo dia 10. Por curioso e pitoresco que seja, não é esse fato em si o que intriga. É a atitude do Ministério Público frente ao caso.

Alegando que o evento enaltece a tortura, os promotores de Justiça Beatriz Fonseca e Eduardo Valério entraram com ação civil pública contra os responsáveis pelo bloco. O pedido de liminar foi negado. Ainda bem. Pode parecer um detalhe, mas o episódio é apenas um elemento de um fenômeno que vem se multiplicando perigosamente: o insustentável ativismo judicial. Sabemos muito bem a favor de quem e contra quem: a esquerda passa sempre ilesa.

Foi exatamente o que deixou nas entrelinhas (ou nem tão nas entrelinhas assim) a juíza que negou o pedido, Daniela Pazzeto Meneghine Conceição. Vale muito a pena apreciar alguns dos seus argumentos: “A utilização da censura prévia como meio de coibir a manifestação de pensamento não se coaduna com o Estado Democrático de Direito”. Lembrou também que as figuras dos militares como Ustra não foram sequer reconhecidas oficialmente como autoras de crimes, em razão da Lei da Anistia. Mais adiante: “O Poder Judiciário não tem, em regra, esse poder censório prévio de limitar e de suprimir o direito fundamental da liberdade de expressão e da liberdade de pensamento, conforme busca o MP. (…) A se permitir que o Judiciário se arrogue num poder que não tem, seria afrontar a harmonização dos poderes e também seria violar a razoabilidade e proporcionalidade buscada a fim de se equilibrar direitos fundamentais, para que eles convivam harmonicamente”. Disse ainda que só há exceção, imposta pela lei, à divulgação do nazismo. Aí vem a parte mais interessante:

“No mais, a apresentação do bloco se dará nos dias de carnaval, em que a manifestação popular se dá por meio de atividades artísticas que comumente são baseadas em fatos históricos do Brasil e do Mundo, tal como vem ocorrendo nos últimos cinco anos com apresentação do ‘Bloco Soviético’, mesmo porque muitas vezes as manifestações assumem até caráter jocoso e até crítico do período a que se visa retratar”.

A juíza está de parabéns pela excepcional lembrança. Pouco importa, no exame do acontecimento e da decisão da juíza, nossa opinião sobre o movimento de 31 de março ou os governos pós-1964, que já externamos noutras ocasiões. O ponto aqui é bem outro: o ativismo judicial do Ministério Público não visava outra coisa senão silenciar a expressão de quem o incomodava, não tendo tido suas suscetibilidades atingidas por algo de gênero, no mínimo – para sermos generosos – “similar”, conquanto, na prática, muito pior. Não há como comparar de maneira proporcionalmente sensata o genocida regime soviético com o regime militar brasileiro, contudo, essa abominação da história da humanidade por cinco anos foi cantada em prosa e verso pelos foliões nas ruas de São Paulo como se fora uma brincadeira de criança. Ora, por que investir contra o bloco em homenagem aos velhos “milicos” e deixar correr ilesa uma folia momesco-stalinista?

O argumento da juíza não apenas é definitivo, como precisa ser ressaltado pela exposição precisa que dá a esse problema que se torna cada vez mais preocupante, digno da nossa atenção. Se o Judiciário se investir o direito de “proibir” pautas, ao arbítrio da Constituição e da lei, é a representação política, base do sistema que pretendemos ver regendo nossa organização social, que se coloca em jogo.

Nada mais ridículo, portanto, que a tentativa de contra argumentação da revista Carta Capital – nada, melhor dizendo, além da própria revista, naturalmente, cujo valor já é de todos nós conhecido. A “brilhante” redação da publicação pontuou, vejam só, que o Bloco Soviético, ao contrário do “Porão do Dops”, nunca ligou “sua imagem às atrocidades contra os direitos humanos cometidas nos regimes comunistas”.

Apesar do absurdo, vamos ocupar um pouco de nosso precioso tempo para rebater essa “pseudo-revista” cujo único uso concebível é como papel higiênico (melhor não, pois pode oferecer risco à saúde!). Primeiro ponto: é mentira. Nem sequer precisamos de muito esforço para encontrar uma demonstração cabal disso. Ao declarar, em dezembro de 2017, que não desfilaria em 2018, disse o bloco: “Dessa forma, em meio a tantas indefinições dessa gestão (a de João Doria), optamos por não sair com o Bloco Soviético em 2018. Nossas forças estão exauridas e precisamos de um ano no Gulag para readquirirmos energia”. Alguém acredita, sinceramente, que os gulags, os terríveis campos de trabalhos forçados stalinistas, não estão associados “às atrocidades contra os direitos humanos cometidas nos regimes comunistas”? Porão do Dops, jamais, mas fazer piada com o Gulag pode? Faz algum sentido?

Por outro lado, encontrar uma citação ou uma letra de marchinha exaltando a matança, a tortura, os campos de concentração ou qualquer outro dos horrores da ditadura comunista soviética não seria minimamente necessário para desmontar a objeção desqualificada da Carta Capital. Eles publicariam o mesmo posicionamento caso alguém fizesse um Bloco “Bünker do Terceiro Reich”, marchando nas ruas com exóticas suásticas e saudando o Führer? Já imagino a desculpa: “Não, vocês não entenderam. O bloco não tem nada a ver com os campos de concentração ou os milhões de vítimas de Hitler, entre judeus, ciganos e outras ‘minorias’. Não exaltamos o ódio nem nada disso. Apenas achamos o nacional-socialismo uma linda ideologia! É só Carnaval”.

Homenagear a União Soviética e o comunismo é uma vergonha e uma afronta a todas as suas vítimas. Não se vê o Ministério Público querendo proibir o Bloco Soviético. Nem se vê o MP querendo impedir que se faça um filme exaltando o terrorista Carlos Marighella, por exemplo, como nitidamente Wagner Moura está fazendo. Nem sustentamos que se deveria tentar censurá-los, frise-se; mas então, deixem o “Porão do Dops” desfilar!

 

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Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

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