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A LÓGICA DOS RESGATES

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Nivaldo Cordeiro*

Quem lê os jornais do dia fica impressionado com as cifras dos bailouts (resgates) anunciadas em toda parte, principalmente nos EUA. As noticias normalmente são dadas em tons neutros, como se tais medidas governamentais fossem meras opções técnicas e supostamente tomadas em prol do bem comum. Sempre são usadas metáforas médicas nessas ocasiões, aquelas relativas a operações cirúrgicas de cunho inevitável. Uma falsificação. A imprensa assim cumpre o seu papel de esconder os fatos reais da opinião pública noticiando-os de forma enganosa.

 

O fato é que tais resgates estão longe de ser consenso entre os economistas e não podem ser considerados meras ferramentas de administração pública, mesmo que aparentemente a classe política pareça, em sua grande maioria, concordar com eles. Na verdade o que se está vendo é um mega assalto ao Tesouro para beneficiar minorias que dispõem de lobbies consolidados nos meios políticos. Foram ultrapassados todos os limites éticos. Trata-se uma transferência instantânea de riqueza dos contribuintes para particulares, nada mais. Os políticos lucram com os votos, suas estruturas de poder ficam mais consolidadas e os recursos financeiros, nem sempre republicanos, são-lhes doados para campanhas políticas e outros destinos.

 

Perder de vista essa realidade é fugir ao essencial. Na verdade a crise serviu de biombo para esconder o que de fato se passa. Interesses inconfessos passaram a ser legitimados pelos governantes. Fortunas estão sendo produzidas da noite para o dia como que por passe de mágica. Não há nenhuma “coragem política” nessas ações, nem inovação, nem perícia técnica. Há perfídia contra o contribuinte-eleitor que não tem os meios de compreender como e porque se move o Estado, o que motiva a classe política que decide e o que maquina a tecnoburocracia que implementa as decisões. Por trás do academicismo traduzido em falsos duelos semânticos entre seguidores de Keynes, Friedman e Marx o que se vê é o puro e simples roubo do dinheiro público para a manutenção de interesses extravagantes, contrários ao bem comum.

 

Tudo votado no Congresso, noticiado e aclamado em nome da salvação do sistema econômico. O cinismo dessa gente é de enojar. É como se o Estado tivesse adquirido a faculdade de produzir recursos e de anular as perdas econômicas resultantes de sua própria incúria. É como se o Estado não fosse ele mesmo o autor da crise.

 

Nem mesmo a nacionalização dos bancos pode ser considerada uma medida de saneamento compatível com o bem-estar geral e indispensável ao bom funcionamento da economia. Quando muito seria aceitável a garantia aos depositantes, não dos interesses dos acionistas dos bancos. O que se está vendo mundialmente é uma orgia de apropriação privada do dinheiro público suportada pela retórica anti-crise. Um logro que só pode enganar aos observadores mais desatentos.

 

O resultado disso será a transformação da crise – ela mesma seríssima – em uma muito pior, mais profunda e duradoura. A necessária desinflação dos preços dos ativos e das commodities poderá ser seguida de uma inflação catastrófica e, pior, a perda de um referencial mundial de moeda a que o dólar tem servido. É enamorar-se do caos achar que o poder de Estado pode ficar completamente desconectado da ética, lógica e da boa ciência econômica. A má administração do Estado cobrará seu preço em breve tempo.

 

Estamos vendo um caso clínico de loucura coletiva só compatível com aqueles vividos nos anos Trinta. Toda gente passou a viver em um mundo paralelo “como se assim fosse”. Eleitores apóiam – basta recordar como se deu a eleição de Barack Obama, o campeão de prometer tudo a todos, de graça – políticos querem e burocratas realizam, todos de costas para a realidade das coisas. Estamos sentados em barris de pólvoras cujo pavio foi aceso. Será questão de tempo a explosão.

 

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A eleição de José Sarney e de Michel Temer para a presidência das duas casas do Congresso é uma cristalina mensagem de que o Centrão já enxergou o novo príncipe e que já percebeu que a era Lula está se aproximando do fim. Foi uma derrota esmagadora do PT e uma vitória do provável sucessor. Se não houver qualquer fato novo a agenda política de 2010 está pronta. Quem viver verá.

* Economista, articulista [ www.nivaldocordeiro.org ]

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

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