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Ministra Ellen, tenha dó!

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Colaboradores

15.02.07

 

Ministra Ellen, tenha dó!

 

 

Marcio David Mattos*

 

 

Em seu sensível e humano comentário sobre a morte do menino João Hélio, a Exma. Sra. Ministra Ellen Gracie, presidente do Supremo Tribunal Federal fez uma afirmação capaz de deixar Eichmann corado de vergonha. De acordo com Sua Excelência, não devemos discutir , muito menos aprovar leis no calor da emoção com os fatos recentes, sob um clima de tensão . Assim, se igualou ao carrasco nazista que, do alto de sua função burocrática, jamais questionou o sistema que permitia o morticínio de judeus, sob a alegação de que ele era apenas um funcionário do Estado, cumprindo sua função de servir ao país. Ellen e Eichmann representam aquilo que o filósofo Olavo de Carvalho denominou de “paralaxe cognitiva”, isto é, o eixo da experiência real se descola do pensamento de tal forma que o próprio indivíduo não sobreviveria se aplicado com rigor todo o raciocínio que ele constrói abstratamente. Só assim é possível entender que a presidente do STF diga uma asneira tão grande com ares de maturidade e “razão de Estado” no melhor estilo maquiavélico. Ora, se as leis não podem ser discutidas e modificadas quando deixam de cumprir a função mesma para as quais foram criadas, quando o serão? E, no caso específico, somente uma barbárie como esta pode acordar a sociedade para o estado caótico da violência em nosso país, mobilizando o Congresso e o Executivo a assumirem a parte que lhes cabe, legislar e punir, penalizar. Para isto que o Estado existe primariamente, como o sabe qualquer calouro de Direito – para proteger os cidadãos uns dos outros e todos dos estrangeiros. O descumprimento desta função sempre levará a fatos bárbaros e comovedores. E é justamente aí que se deve rediscutir o papel do Estado seja na formulação das leis, no julgamento dos infratores ou na execução das penas. Mas a ministra Ellen não ignora tais coisas. Ela sabe perfeitamente bem. Seu problema é de total ausência de coerência entre o que ela diz e a vida real da pessoa física Dona Ellen, esta sim esperando que também as leis sejam modificadas quando a barbárie bater à sua porta. Imagine se após o 11 de setembro tudo que um membro da Suprema corte dos EUA tivesse para dizer a respeito fosse: “foi um fato terrível, inconcebível e inacreditável, mas não devemos discutir modificações na legislação sob o impacto da emoção”. É até difícil imaginar tal cena, pois antes de se tornar um membro da mais alta corte do país, o sujeito é um indivíduo e cidadão e não deixa em casa sua humanidade e cidadania quando vai ocupar um cargo público. É isso mesmo que significa o termo integridade – ser inteiro. No Brasil, o mal que nos assola diariamente nos jornais é a total separação que o sujeito faz ao ocupar um cargo importante entre a sua experiência como indivíduo real e seus comentários desconexos, como se fosse um deus, alheio a qualquer fenômeno que ocorre no tempo e no espaço.

    Imagino que a prerrogativa que tem o magistrado de apenas se manifestar nos autos do processo, no caso da Ministra Ellen, deveria ser um dever! Não tendo nada de humano e real para dizer no caso do menino João Hélio, o melhor que tem a fazer é calar-se. A menos que recupere a sua condição humana e passe a pensar o mundo e a realidade a partir de sua própria experiência real de indivíduo e cidadã. E que não deixe em casa sua humanidade e cidadania ao se dirigir diariamente ao Supremo Tribunal Federal. Eichmann era um excelente funcionário público, mas totalmente incapaz de perceber a realidade ao seu redor do ponto de vista humano, pois utilizava um óculos teórico que deformava a si mesmo e aos demais. Tinha uma perfeita visão de uma realidade imperfeita.

Não queremos que a Ministra Ellen deixe de exercer suas funções de magistrado. Queremos que ela seja humana. A morte brutal e bárbara do menino João tem que te comover, Ministra, tanto ou mais do que aos cidadãos comuns, pois a senhora está em posição de autoridade. Tenha paciência sim, lucidez também, responsabilidade e clareza sim mas, Ministra, tenha dó!

 

 

                    

*Márcio David Mattos é     economista, membro do Instituto Liberal.

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

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