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Paulo Guedes perdeu a chance de ficar calado

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Não é exagero dizer que Paulo Guedes é o ministro mais importante do governo Bolsonaro. É também o principal fiador do “liberalismo econômico” do governo.   Pelo que consta, nunca foi de uma vertente ideológica bolsonarista. Talvez seja um resultado da convivência com certos quadros, talvez suas leituras políticas já fossem problemáticas anteriormente, mas o que importa é que no que tange ao comentário sobre o AI-5, Paulo Guedes perdeu uma boa chance de ficar calado.

Realmente não estou interessado nas interpretações do que quis ou não quis dizer o ministro. Não é preciso acreditar que ele estivesse defendendo um novo AI-5, tal como fez Eduardo Bolsonaro, para ver a coisa como absurda. Se foi só uma análise, que guardasse para si ou escrevesse em seu diário. Se não tem um diário, que arranjasse um e passasse a registrar nele seus pensamentos pitorescos com potencial de gerar controvérsias desnecessárias ao invés de nos presentear com eles. “Ah, mas Paulo Guedes está fazendo um bom trabalho como ministro”. E daí? Isso o torna imune a críticas?

Se tem uma coisa que é realmente cansativa sobre o governo Bolsonaro e sobre os bolsonaristas de uma forma geral, é essa rotina de alguém do governo ou da família do presidente falar alguma besteira, os jornais replicarem a besteira em sua literalidade e os asseclas mais fiéis tecerem suas análises de botequim, “interpretando” o que fulano quis ou não quis dizer. É como se fosse uma espécie de teologia bolsonarista em que os fiéis, tentando nos poupar das barbaridades literais de suas escrituras, nos dissessem que tudo não passa de alegorias e que no fundo eles quiseram dizer outra coisa.

A primeira coisa a se notar é que o que eles quiseram dizer tem relevância secundária e o que é compreendido tem relevância primária. É assim que política funciona. Mesmo que o ministro não tenha tendências autoritárias, com 11 meses de casa ele já deveria ter o bom-senso de saber que a mera menção ao AI-5 causaria um imenso furor. E não é um furor dos “isentões”, dos que fazem tempestade em copo d’água por pouca coisa, porque não é pouca coisa, afinal, o ministro mais importante realmente falou sobre um AI-5 e, pior, numa notória referência a declaração anterior do zero 3 do presidente. Claro que seria difícil esperar esse bom senso quando ele falta também a outros membros do governo, que até acusações sem provas de que há laboratórios de metanfetamina nas universidades públicas fazem.

Claro que por dizer o que considero o óbvio me coloco como alvo dos bolsonaristas mais frenéticos. Vão dizer que é porque os liberais são “inocentes”, não entendem a guerra de narrativas da esquerda e que até mesmo jogam o jogo dela ao criticar o governo. Essa turma, que gosta tanto de falar em narrativas e em preservar a boa imagem do governo, deveria ser a primeira a enxergar o nível de munição gratuita que declarações como a do Guedes dão à esquerda e o quanto que “passar pano” nessas declarações dá ainda mais munição. 

Não pretendo me juntar à horda de conselheiros do presidente e seus quadros. Nada contra, mas é questão de estilo. Acredito mais no poder da crítica do que do conselho “tapinha no ombro” e que, ao meu ver, passa uma mensagem de leniência com ações reprováveis. Porrada (não literal, please) é mais eficiente que conselhos subservientes.

Agora, tratando do que o ministro “quis dizer”, ele divagava sobre a possibilidade de a esquerda ir para as ruas e fazer quebradeira. Foi o mesmo cenário pintado por Eduardo Bolsonaro em sua estúpida fala sobre o AI-5 como possibilidade de resposta. Primeiro de tudo, o Chile não é aqui. Sequer estão ocorrendo protestos contra o governo, tampouco protestos violentos. Segundo, se estivessem realmente quebrando tudo nas ruas, um novo AI-5 nunca, repito, nunca, seria uma resposta. Quem fala nesses termos ignora, deliberadamente, que a lei não é silente sobre o que se fazer em uma situação de quebra-quebra. Paulo Guedes de fato não defendeu o AI-5 como resposta, mas Eduardo o fez, e Guedes naturalizou essa visão ao dizer “Não se assustem se alguém pedir o AI-5”.

Não sei a troco de quê, mas o governo, presidente incluído, vem apostando num cenário de protestos violentos que já contam até com “medidas preventivas”, como o projeto de aumento do escopo de excludente de ilicitude enviado ao ingresso, do qual provavelmente tratarei em artigo à parte, mas que de maneira perigosa traz sim uma “licença para matar”. Bolsonaro defendeu o excludente de ilicitude em ações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) contra “protestos”: “Protesto é uma coisa, vandalismo, terrorismo são completamente diferentes. Incendiar bancos, invadir ministério, isso aí não é protesto. E se o Congresso nos der o que gente quer, esse protesto vai ser impedido de ser feito. O Congresso é que vai dizer se nós devemos combater esses atos terroristas ou não”. Nessa fala o presidente não falou de AI-5, mas defendeu também a criação de medidas adicionais – e temerárias – às já existentes na lei para combater um problema que é até então fantasmagórico. Na visão do presidente, e que parece estar fazendo escola dentro do governo, a lei e as forças de segurança são incapazes de lidar com alguns baderneiros, que reitero, por enquanto só existem na cabeça de alguns. Se precisamos de um estado de exceção para lidar com vândalos mascarados, que Deus nos acuda se um dia entrarmos em guerra.

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Gabriel Wilhelms

Gabriel Wilhelms

Graduado em Música e Economia, atua como articulista político nas horas vagas. Atuou como colunista do Jornal em Foco de 2017 a meados de 2019. Colunista do Instituto Liberal desde agosto de 2019.

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