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O livre comércio e a perspectiva internacional angelliana

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O presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Woodrow Wilson, em seu famigerado plano de paz, conhecido como “Programa dos 14 pontos”, enuncia a ideia de que o livre comércio poderia ser importante para os países no pós-Primeira Guerra Mundial.

Vale ressaltar o ponto de número dois, que fala sobre a livre navegação, uma vez que, no século XIX, ainda existia certo monopólio marítimo de algumas nações, como por exemplo, na Inglaterra, com a Companhia Britânica das Índias Orientais. Outro ponto que merece ser analisado de maneira mais aprofundada é o ponto de número três, que fala sobre a remoção de todas as barreiras econômicas e o estabelecimento de igualdade de condições de comércio entre todas as nações consentâneas à paz e à sua manutenção. Portanto, Wilson defendia uma visão competitiva de comércio, o que até, de certo modo, iria totalmente contra as ideias posteriores de seu partido, que adotou o intervencionismo protecionista keynesiano (de 1ª geração) com a ascensão do presidente Franklin Delano Roosevelt, em 1933, no que, inclusive, foi chamado pelo economista norte-americano Paul Krugman de “A longa era dourada”, em seu livro A Consciência de um Liberal.

Ralph Norman Angell também vai seguir um caminho parecido com o de Woodrow Wilson, com o rechaçamento de uma visão realista de que os Estados Nacionais deveriam mostrar sua força militar para obter sucesso comercial e econômico, pregando a paz e contrariando essa vertente. Inclusive, a perspectiva angelliana vai afirmar que existem países que podem até não participar de tratados, ou que participaram de guerras, que foram derrotados, e que saíram melhores economicamente do que aqueles que se sagraram vencedores, como é o caso da Guerra Franco-Prussiana, em que a França teve que gastar muito para vencer.

Aliás, para o autor, o comércio internacional precisa ser livre e também é necessário que os países tenham relações diplomáticas mais abertas, além de considerarem o multilateralismo ou a cooperação como algo fundamental. Conforme Angell, a economia mediaria às relações internacionais e os acordos diplomáticos entre os países, substituindo a visão militar que rondava a mentalidade de muitas nações no início do século XX. Angell, em 1910, ano em que seu livro mais famoso, A Grande Ilusão, foi publicado, antecipava muitos dos valores que hoje fazem parte da sociedade internacional, inclusive citados pelo autor Eiti Sato, como uma mudança na visão internacional da “Alta Política”, ou seja, do apego aos valores militares e à resolução de conflitos através de uma visão de segurança, para a “Baixa Política”, que ocupava um lugar secundário nas relações internacionais e que tem valores mais debatidos atualmente, como competitividade econômica, direitos humanos, resolução de conflitos étnicos ou religiosos, combate ao narcotráfico, etc.

Os valores que Angell descreveu em seu livro demoraram a ganhar espaço nas relações internacionais. O intelectual, logo após a publicação de seu livro, viu duas guerras mundiais e outros conflitos armados que mudaram a história de diversos países. Apesar também do esforço de Wilson na criação da Liga das Nações, em 1919, e da criação do “Programa dos 14 pontos”, os conceitos liberais só foram ganhar espaço no pós-Segunda Guerra Mundial, com a criação da ONU (Organização das Nações Unidas), dos direitos humanos e, sobretudo na Europa, com a criação da União Europeia, mentalizada pelos ordoliberais alemães, com a unificação de diversos acordos econômicos europeus que foram importantíssimos para o crescimento e o desenvolvimento econômico de muitas nações, sendo o pontapé inicial disso a famigerada ‘União Europeia de Pagamentos (EPU)’, que visava a trazer uma maior conversibilidade monetária entre os países europeus. Ademais, a própria ONU fortaleceu essa ideia com a criação da OMC (Organização Mundial do Comércio), para ser uma espécie de mediadora entre as relações comerciais entre os países envolvidos.

Inclusive, os valores comerciais imaginados por Angell e Wilson ainda no início do século XX se concretizaram nesse período do pós-Segunda Guerra Mundial, visto que, com a criação de várias organizações voltadas para o assunto que visavam a liberalizar as trocas de bens, o comércio internacional foi muito beneficiado, tendo crescimento constante de 1950 até os anos 2000. Isso também é evidenciado pelo ministro da economia da Alemanha Ocidental, Ludwig Erhard, em seu livro Prosperidade Através da Competição. Portanto, foram aproximadamente 50 anos de crescimento e desenvolvimento do comércio exterior mentalizado pela livre comercialização de bens. Apenas após a crise financeira de 2008, o comércio internacional passou a ter uma redução nas suas trocas e, consequentemente, uma menor produtividade dentro das nações participantes desse mercado. Essa menor realização de trocas comerciais transnacionais se deve a uma política protecionista adotada pelos grandes blocos econômicos, dentre eles a própria União Europeia (contrariando sua formação histórica, que buscava a liberalização comercial) e outros atores importantes no comércio internacional, como os EUA e alguns países asiáticos, a exemplo do Japão e da Coreia do Sul. O economista norte-americano Gregory Mankiw menciona que o comércio entre as nações pode ser bom para todos, uma vez que, com a adesão a esse mercado, os países aumentam sua competitividade interna e externa, o que consequentemente resulta numa maior produtividade, gerando, portanto, um crescimento econômico generalizado.

Desse modo, Norman Angell estava correto em muitas das suas proposições ilustradas em seu livro A Grande Ilusão, já que, mesmo com a morosidade na adesão de suas ideias, tivemos o que é conhecido como “Paz Duradoura” (algo muito valorizado, inclusive, pela União Europeia), que mescla a redução militar ou de guerras com a mudança da visão belicista para uma visão econômica, o que ajudou as nações a crescerem e também se desenvolverem. Para Angell, a guerra e a ocupação/expansionismo territorial não são responsáveis pelo crescimento e desenvolvimento de uma nação. Angell ressalta, como dito anteriormente, a cooperação e o diálogo entre os países e, somada a isso, uma estratégia de políticas econômicas e sociais. Foi dessa forma que a Europa, por exemplo, se recuperou da guerra. O economista francês Michel Albert reitera essa visão com a definição de duas espécies de Capitalismo, que são o Capitalismo Renano e o Capitalismo Anglo-Americano. Tanto o modelo renano de economia quanto o modelo anglo-americano, buscavam a integração econômica mundial, aliada ao crescimento econômico oriundo da liberdade e da competitividade; tanto que, durante as décadas de 1960, 1970 e 1980, houve uma grande expansão da globalização financeira no mundo, muito por causa da visão de liberalização comercial empreendida logo no pós-Segunda Guerra Mundial.

*Kayque Lazzarini cursou Ciências Econômicas na FACESP/FECAP (Faculdade de Ciências Econômicas de São Paulo) e cursa Relações Internacionais na FECAP (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado). Trabalhou como redator sênior no site Torcedores.com e também atuou de forma independente no blog ‘Orgulho de ser Lusa’ e ‘Rubro-Verde Mídia’. É Coordenador local do Students For Liberty Brasil (SFLB), foi diretor político da União Juventude e Liberdade de São Paulo (UJL-SP), coordenador político do núcleo do partido NOVO, na cidade de Guarulhos, e refundador do núcleo do Movimento Brasil Livre (MBL), na cidade de Guarulhos.

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Kayque Lazzarini

Kayque Lazzarini

Estudou ciências econômicas na FECAP e atualmente é estudante de relações internacionais na FECAP.

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