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Tatuar bandido na testa é errado e não pode ser aplaudido

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Não havia me manifestado até agora sobre o ladrão que acabou se dando mal ao roubar o cara errado, um tatuador, que escreveu em sua testa uma mensagem para marcá-lo para sempre com a pecha de ladrão e vacilão. O motivo: absorver com um pouco mais de calma a coisa, ter tempo para refletir, algo cada vez mais raro na veloz era das redes sociais, em que todos precisam ter opinião instantânea sobre tudo.

Assim que soube do caso, achei errado. Na verdade, considero o ato inaceitável. Não é justiça, é vingança. Não é civilização, é barbárie. E por que não dei meu veredicto na hora? Porque eu consigo compreender o que levou o tatuador a isso, e aos aplausos de muita gente, inclusive de leitores e amigos meus. É um fenômeno cada vez mais preocupante, de total saturação com a bandidagem, de perda completa de confiança em nossas instituições.

Por que não fazemos justiça com as próprias mãos, transferindo ao estado tal função? Justamente para garantir o devido processo legal, as garantias de todos, um mecanismo impessoal que será o árbitro de nossas disputas. Ou é isso, ou o cada um por si, com base em seus próprios julgamentos, e o velho “olho por olho, dente por dente”, sendo que no caso parece estar claro a falta de proporção da reação. Institucionalizamos a justiça para não cairmos na terra sem lei.

Mas eis o problema: não há justiça no Brasil! Nosso país é a própria terra sem lei. São 60 mil assassinatos por ano, milhões de roubos, abusos constantes e uma ousadia cada vez maior dos marginais. E mais de 90% dos casos de homicídio seguem sem solução! E, apesar dessa quantidade enorme de crimes, a esquerda fala em reduzir a população carcerária, em retirar armas dos cidadãos corretos, em transformar bandido em “vítima da sociedade”. E isso tudo é revoltante demais da conta!

Eis aí o Zeitgeist, então: os brasileiros decentes não aguentam mais, estão de saco cheio, cansados, sem esperanças, e não conseguem mais olhar para o guardião da lei como um aliado, menos ainda sentir “peninha” de bandido. Essa sensação de anomia, de impunidade reinante, é um problema grave, um convite ao crime e aos atos de vingança pessoal, de justiçamento. Daí o bandido amarrado no poste, o marginal linchado, ou o ladrãozinho com a testa tatuada. E os aplausos.

Mas insisto: está errado! Não podemos compactuar com essa atitude, pois dela chegaremos na barbárie de vez. O esforço deve ser pelo resgate das leis, não para rasgá-las de vez. Helio Beltrão comentou sobre o caso:

Esse aí achou que a propriedade privada era de graça e tomou injeção na testa. Sim, temos ódio dos ladrões, com toda a razão. Estamos fartos da violência que sofremos. Todos já fomos assaltados ou coisa pior. O que estes tatuadores fizeram é compreensível dada a barbárie que vivemos. No entanto, não devemos projetar nosso ódio acumulado e descontar em uma só pessoa. Não podemos fazer justiça pelas próprias mãos. Cada caso é um caso e deve ser apurado por gente que nao esteja no calor do conflito. O custo de uma sociedade civilizada é o devido processo legal, a temperança, a punição devida e proporcional, após julgamento (salvo óbvio se for em legítima defesa no momento da ameaça). Olho por olho, lembremos, deixa todos cegos.

Meu primeiro comentário sobre o assunto foi justamente nessa postagem, em que simplesmente concordei: “Apesar de compreender a ação, não posso aplaudi-la ou rir dela como tantos andam fazendo. É errado”. E a reflexão com o tempo apenas solidificou essa opinião. O certo era chamarem a polícia e prenderem o assaltante. Mas aí começam os problemas: ele provavelmente logo estaria solto. E aí, descrentes no estado, os indivíduos partem para a “justiça” com as próprias mãos.

E o tiro ainda sai pela culatra, pois depois do que o tatuador fez, o ladrão virou vítima de vez, esqueceram do seu crime, e a esquerda foi para cima como um abutre em cima de carniça, lançando até uma “vaquinha” para ajudar o pobrezinho, enquanto o tatuador acabou preso. A tal “vaquinha”, que pretendia levantar R$ 15 mil, já arrecadou R$ 20 mil. A iniciativa é assinada por um troço chamado Coletivo Afroguerrilha, o que, creio, dispensa maiores comentários.

Na explicação, o garoto que assaltava é visto como uma vítima indefesa, enquanto o tatuador é tratado como um torturador cruel e terrível, um criminoso incurável. E é essa a imagem que muita gente faz da coisa, motivo pelo qual a situação brasileira chegou a esse grau de absurdo. Quando vamos começar a tratar bandido como bandido, não como vítima ou coitadinho? Quando teremos vaquinhas para ajudar as vítimas de marginais, não os próprios marginais? Todos estamos enojados de ver as ONGs de “direitos humanos” só defenderem bandidos. Quando vão defender as vítimas?

No dia em que isso acontecer, talvez haja menos aplausos para atos isolados de “justiceiros”. Nesse caso, repito, houve clara falta de proporção na reação, o que dá margem para esse tipo de campanha da esquerda, capitalizando em cima da revolta de muitos. Essa opinião foi compartilhada por Roberto Rachewsky:

Se fosse uma mulher que tentasse furtar uma bicicleta e o tatuador e seu amigo a pegassem, iriam deixar sua marca estuprando-a? Como era um rapaz, eles resolveram puni-lo tatuando-o. Na testa! A diferença entre a barbárie e a civilização pode ser encontrada exatamente na maneira como uma sociedade trata um criminoso. Defender o que é seu é legítimo. Agir para proteger a vida ou a propriedade com todos os meios que se dispõem é um direito inalienável. No entanto, agir em autodefesa não pode ser confundido com um revide violento depois que o criminoso está dominado e não oferece mais ameaça. Ninguém deve fazer justiça com as próprias mãos sob pena de agir errado por perder a objetividade. Essa é a diferença entre civilização e barbárie. É para isso que serve o governo, para aplicar a justiça através do devido processo legal. Dois crimes não restabelecem a justiça. O que o tatuador e quem estava com ele fizeram é, foi e sempre será uma covardia, um absurdo, uma desumanidade pior do que o suposto atentado contra a propriedade de alguém que teria sido frustrado por eles. A anarquia que o país vive está nos levando ao caos. Isso é o que dá termos no poder uma máfia inescrupulosa que espolia e, com escárnio, finge estar a serviço da população. Políticos, juízes, burocratas, corporativistas em geral perderam a vergonha e expõem seu caráter sem medo de passar vexame, como esses que tatuaram na testa de um adolescente o que quiseram. É isso, a gente conhece a índole das pessoas quando elas têm o poder nas mãos sobre a vida alheia. Uns agem como bárbaros, outros como gente civilizada, coisa cada dia mais rara de se ver por aqui. Não é à toa que um senegalês honesto ganha notoriedade pelo simples fato de ter agido com integridade.

O ato de tatuar a mensagem de ladrão na testa nos remete automaticamente ao filme “Bastardos Inglórios”, com Brad Pitt. Todos devem ter pensado o mesmo, sem dúvida.

Mas reparem no contexto: era uma guerra mundial; era um nazista assassino; era um filme de Quentin Tarantino, que adora violência. Não era um ladrão de bicicleta adolescente. Imitar tal gesto nessas circunstâncias, portanto, é simplesmente inaceitável. Não é possível combinar isso com qualquer ideia de civilização que possamos ter. E não é desse jeito que vamos construir uma. Ao contrário: vamos acabar de vez na total barbárie. Se já não estivermos lá…

PS: Num país mais sério e livre, como os Estados Unidos, o marginal poderia ser recebido à bala, e isso seria preferível, pois legítima-defesa. É diferente de, depois de dominá-lo, passar ao ato de tortura. São coisas bem diferentes, e que nem todos compreendem. Aqui não se defende marginal, e sim a justiça. E todo cidadão deveria ter, por justiça, o direito de se defender de bandidos.

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Rodrigo Constantino

Rodrigo Constantino

Presidente do Conselho do Instituto Liberal e membro-fundador do Instituto Millenium (IMIL). Rodrigo Constantino atua no setor financeiro desde 1997. Formado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), com MBA de Finanças pelo IBMEC. Constantino foi colunista da Veja e é colunista de importantes meios de comunicação brasileiros como os jornais “Valor Econômico” e “O Globo”. Conquistou o Prêmio Libertas no XXII Fórum da Liberdade, realizado em 2009. Tem vários livros publicados, entre eles: "Privatize Já!" e "Esquerda Caviar".

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