A regulamentação das plataformas de transporte no Brasil
As plataformas digitais revolucionaram o transporte de passageiros e a logística para os fretes e cargas, dois serviços essenciais para a economia brasileira.
Sua chegada preencheu lacunas em soluções de mobilidade e reduziu custos historicamente produzidos pelo excesso de intervenção estatal (estatismo): cartelização dos serviços de táxi, insuficiência de transporte público em diversas rotas, itinerários e horários, sucateamento dos monopólios de transporte coletivo em várias cidades, escassez de alternativas modais nos níveis municipal, estadual e federal, insegurança nas estradas, rodovias precárias, restrições regulatórias, altos custos dos combustíveis e falta de incentivos para novos empreendimentos no setor.
Além de popularizar o acesso, reduzir o tempo de espera, agilizar corridas, criar novas rotas e horários e facilitar a intermediação entre clientes e prestadores, as plataformas diminuíram preços, aumentaram a segurança nas estradas e impulsionaram o crescimento do transporte logístico e de passageiros.
O Brasil se tornou um dos maiores mercados mundiais de mobilidade digital e logística, atrás apenas de China e EUA em volume de transações. Trata-se de um setor em plena expansão e com projeções para um crescimento acelerado nos próximos anos. O país já é o maior mercado da Uber no mundo em termos de quantidade de viagens realizadas, motoristas e entregadores cadastrados. Um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) indicou que, apenas em 2023, a operação da Uber movimentou mais de R$ 75 bilhões na economia brasileira.
A repercussão dessas plataformas no mercado de trabalho e na empregabilidade se insere no debate sobre formas de trabalho temporárias, itinerantes, intermitentes, freelancer ou petits boulots (gig economy), uma revolução trazida pela economia digital que facilitou, acelerou e aprimorou significativamente as relações de mercado, sobretudo no setor de serviços.
O grande debate que suscitam normalmente diz respeito aos riscos de “precarização”, à viabilidade de enquadrar essas relações nos modelos tradicionais de contrato de trabalho, à comparação entre benefícios e garantias de cada regime e, ainda, ao fato de que essa formalização impõe custos, engessa o funcionamento das operações e gera despesas adicionais para adequação, como novas regras previdenciárias ou inclusão em esquemas de “proteção social mínima”. Tramita na Câmara, atualmente, um projeto de Lei nº 152 de 2025 que procura enquadrar ainda mais as atividades das plataformas de aplicativos, acrescentando mais restrições ao código de Lei nº 12.587, de 3 de Janeiro de 2012, a dita política de mobilidade urbana, e prevendo uma intrusão ainda mais preocupante do estado na vida dos usuários, plataformas e motoristas autónomos: a criação de um contrato padrão, o enquadramento de vínculo empregatício e o desconto direto na fonte para participação compulsória nos fundos da previdência.
Nossa primeira preocupação, ao tratar da regulamentação das plataformas de serviços de transporte, é de natureza cautelar e visa a alertar para os riscos que essas medidas trazem ao setor: incentivos ruins ao empreendedorismo, desestímulo à inovação em um segmento intensivo em tecnologia e prejuízos ao potencial de valor agregado, crucial para o desenvolvimento dos serviços e da economia do país.
Nossa pergunta inicial é se há realmente necessidade de editar tais normas para que a atividade opere de maneira adequada e se as negociações entre motoristas, clientes e plataformas não seriam suficientes para orientar melhores contratos e uma alocação mais eficiente dos recursos materiais e humanos.
Em seguida, interessa-nos compreender se a regulamentação – com seus custos visíveis e previsíveis – é, de fato, a melhor resposta para os desafios relacionados a benefícios e garantias para motoristas, à prevenção da precarização, ao estímulo ao emprego, ao desenvolvimento das empresas e serviços da gig economy e à melhora das condições de vida dos jovens em suas primeiras experiências profissionais.
Nosso artigo busca oferecer uma reflexão sobre esses temas sob uma perspectiva econômica (ou liberal).
Argumentos do vínculo empregatício
Cada motorista de aplicativo — ou “Uber” — é um trabalhador independente que oferece serviços de transporte utilizando seu próprio veículo para atender a uma demanda de fretes ou transporte de passageiros.
Independentemente de o veículo ser próprio, consorciado, financiado ou alugado, esses trabalhadores podem escolher livremente entre a diversidade de plataformas disponíveis, decidindo, segundo a atratividade dos contratos, o retorno financeiro das corridas e fretes, a disponibilidade de horários e outros critérios pessoais, quais delas utilizarão em determinado itinerário. Podem ligar, desligar, aceitar, iniciar, encerrar, retomar ou interromper corridas segundo decisão exclusivamente pessoal, independente e unilateral, sem incorrer em riscos de custas, sanções disciplinares ou punições administrativas na esfera corporativa, empresarial, associativa ou governamental.
A relação deveria ser exatamente a mesma e recíproca para as plataformas: todas as partes deveriam gozar das mesmas prerrogativas, e nenhuma terceira parte — alheia ou não envolvida — deveria criar barreiras, impor custos ou gerar desincentivos a transações comerciais consensuais, que não violam direitos e respeitam as normas de justa conduta, o Código Civil, o Código do Consumidor e, neste caso, as regras de trânsito.
No entanto, isso nunca se verificou plenamente, porque empresas e motoristas autônomos já arcam hoje com custos, enfrentam barreiras e cumprem normas que, embora não proibitivas, reduzem a flexibilidade natural do modelo de negócios possibilitado pelas novas tecnologias. Mas nada impede que a situação piore ainda mais caso consigam adequar essas relações ao modelo previsto no código trabalhista.
Existe um risco evidente na criação de um vínculo empregatício fictício, onde juridicamente ele não existe, já que não há “subordinação algorítmica” dos motoristas. A decisão sobre aceitar corridas permanece em suas mãos; as plataformas apenas intermedeiam serviços, e os contratos deveriam apresentar somente condições gerais necessárias a esse propósito, incluindo medidas mínimas — já existentes — relativas a idoneidade, combate à falsidade ideológica, antecedentes criminais e respeito ao Código Civil, ao Código de Trânsito e ao Código do Consumidor.
Os motoristas respeitam esses códigos porque sabem que isso é essencial para a manutenção de seu negócio e temem responder judicialmente em caso de desrespeito em qualquer dessas esferas.
Buscar subordinação nessa relação faria tanto sentido quanto afirmar que os proprietários de imóveis seriam “funcionários” da Airbnb simplesmente por disponibilizarem seus espaços a hóspedes via plataforma. Isso é manifestamente absurdo, pois não existe relação de subordinação: o algoritmo não impõe aceitação compulsória de hóspedes. As plataformas apenas intermediam serviços, sem vínculo empregatício, sem protocolos de recrutamento, sem oferta de empregos ou obrigações bilaterais que determinem início, término ou continuidade da relação.
Um argumento muito utilizado é o da frequência, como se o uso regular da plataforma — por decisão unilateral do motorista — criasse uma responsabilidade empregatícia. Isso é igualmente absurdo. Seria como exigir que anfitriões assinassem contrato CLT com a Airbnb apenas por utilizarem a plataforma com maior assiduidade – ou ainda que motoristas que realizam mais de dez corridas por dia no iFood fossem obrigados a assinar um contrato trabalhista que obrigasse a plataforma a lhes garantir esse volume de corridas e, por consequência, os custos da CLT.
Outro argumento é o da dependência: a ideia de que, por se tratar de uma atividade da qual o motorista “depende” para sua subsistência, ele estaria subordinado. Essa tese é talvez a mais frágil, porque não existe um perfil único de motorista autônomo, e nenhuma norma ou incentivo restringe esses trabalhadores de buscar outras atividades. Não há qualquer elemento que os torne “reféns” obrigatórios de determinada plataforma.[1]
Há ainda uma variação desse argumento, que não fala em subordinação algorítmica, mas em subordinação “telemétrica”. Os dispositivos de monitoramento de corridas e fretes servem, sobretudo, para aumentar a segurança dos usuários, garantir a fiscalização do cumprimento dos itinerários e evitar comportamentos oportunistas, assegurando transparência e qualidade do serviço. A mera existência desse monitoramento não implica obrigatoriedade na aceitação de rotas, fretes, preços ou itinerários, nem gera vínculo empregatício. Trata-se apenas de um mecanismo de confiança mútua, e não de subordinação.
Encerrando, em nível internacional, algumas decisões em matéria regulamentar se pautaram, por exemplo, na ideia de que, na ausência de vínculo empregatício, os motoristas e autônomos de maneira geral enfrentariam desafios maiores para obtenção de determinados serviços, como acesso a crédito, por exemplo. Desnecessário dizer que, assim como aconteceu com a questão dos veículos, em que temos hoje programas de vantagens específicos para locadores que procuram trabalhar em plataformas de transporte, as instituições de crédito ou financeiras irão naturalmente oferecer linhas específicas para o setor, desde que não haja restrições impedindo-lhes de utilizar as declarações de renda das empresas como garantias de renda.[2]
Reais motivos para criação do fictício vínculo empregatício
A decisão de orientar uma oficialização de uma fictícia relação empregatícia veio de tribunais do trabalho em ações de motoristas contra as empresas. Nessa perspectiva, o vínculo empregatício atende apenas à demanda de grupos organizados em busca de “direitos” ou valores que encontram abundantemente nas extensas fileiras de normas do código trabalhista, ainda que isso não corresponda aos “deveres” que esse código impõe aos assalariados nem às “oportunidades” que poderia oferecer aos empregadores.[3]
Soma-se a isso um segundo motivo para essa busca pela criação do vínculo fictício: o oportunismo em matéria regulamentar, mais especificamente, a tentativa de utilizar o aparato normativo como uma solução para amenizar um problema orçamentário e fiscal do governo. O próprio interesse em oficializar um contrato nos padrões editados pelo governo para plataformas e motoristas demonstra a intenção de associar a criação do vínculo empregatício ao objetivo de aumentar a arrecadação previdenciária.
Isto se traduz na tentativa de abertura, enquadramento, expansão e criação de uma nova jurisprudência regendo litígios e tentando trazer normas de contratos individuais dos serviços das plataformas aos padrões que regem os contratos de trabalho, acordos de convenção municipal, estadual e federal de sindicatos, acarretando toda a cadeia de custos vinculados à atual e obsoleta legislação trabalhista vigente.
A existência desse vínculo empregatício não pode ser criada por via regulamentar e, na verdade, sua ausência é o que permite manter os baixos custos de adesão e saída para provisão dos serviços. Essa característica é um dos fatores que tornam o aplicativo e os serviços economicamente viáveis para todas as partes envolvidas, especialmente para as camadas de mais baixa renda.
Não foi necessário esse vínculo para estabelecer um regime de responsabilidade entre prestadores de serviços parceiros, a empresa e os clientes. O vínculo empregatício, por outro lado, cria um conjunto de obrigações adicionais e abre espaço para uma verdadeira subordinação hierárquica: as empresas poderão e deverão, para que não haja injustiça flagrante, usar essa ferramenta para fixar horários obrigatórios, condicionar rotas e fidelização, restringir a liberdade de escolha dos motoristas, realizar processos formais de recrutamento, alinhar tarifas ao salário mínimo, estabelecer perfis para os motoristas, determinar escalas, reservar valores para férias e décimo terceiro e ainda alterar taxas e preços em função de critérios que julgar oportunos de acordo com uma política comercial que passe a incorporar os custos e exigências típicos de um contrato trabalhista.
Isso tudo, na verdade, sequer faz parte do modelo de negócios dessas empresas, que se encontrariam confrontadas talvez com a necessidade de implementar uma mudança drástica em seus planos de organização, em um setor que se tornaria cada vez mais próximo do modelo fracassado que já encontramos, por exemplo, nos cartéis de taxistas. No melhor dos cenários, os serviços se encareceriam substancialmente até retirar a principal astúcia do aplicativo, que é a liberdade para adesão, a flexibilidade operacional e o custo acessível para todos.
Cada modelo de negócio funciona sob custos e vantagens, tanto do ponto de vista empresarial quanto laboral; essa diversidade de oportunidades e modos de organização é justamente o que garante liberdade aos agentes para definir autonomamente acordos, contratos e rotinas de produção e organização que lhes sejam mais vantajosos, inclusive do ponto de vista normativo.
A liberdade de entrada e negociação
Em vez da uniformização e engessamento evidentes no modelo estatal de contrato ou de requisitos basilares pretendidos em reivindicações por grupos organizados, temos a alternativa da preservação da liberdade contratual, do estímulo a novas organizações em empreendimentos concorrenciais, da ausência de restrições tributárias e regulamentárias, bem como da ampla e irrestrita liberdade de entrada nos mercados.
Quando existem genuína liberdade e baixos custos para entrada nos negócios, qualquer renda considerada monopolista atrai concorrência e novos empreendedores em busca de oportunidades de lucro, além de pressionar a queda nos preços dos serviços, aumento na demanda por trabalho e alinhamento das remunerações à produtividade nos respectivos segmentos, melhora na qualidade, diversidade e oferta de serviços. Isso se coaduna com a alocação mais proveitosa dos recursos disponíveis, e o caso das plataformas digitais foi bastante ilustrativo dessa evolução consistente da concorrência nos últimos 10 anos.
O papel do governo nesse cenário, então, é o de assegurar e estimular políticas que procurem fomentar essa liberdade de entrada e minimizar custos para empreendedores, o que se traduz, na prática, em políticas de redução de impostos sobre veículos e carburantes, melhores infraestruturas, mais segurança, iluminação e sinalização nas estradas, simplicidade tributária e regulamentária, equilíbrio orçamentário e fiscal permitindo a poupança e abundância de crédito.
No que tange à relação entre plataformas e motoristas autônomos, a liberdade de negociação e associação nos baliza que as tratativas relativas às negociações entre associações, grêmios ou sindicatos de trabalhadores autônomos “plataformizados” sejam feitas diretamente, individualmente ou em conjunto com as plataformas de transporte de cargas e passageiros, aceitando ou não as tarifas, remunerações para prestações de seus serviços e os termos previstos para sua utilização.
Na ausência de acordo entre ambos, seja porque as corridas não remuneram suficientemente bem os motoristas a ponto de cobrir seus custos operacionais e remuneração pessoal, por exemplo, esses mesmos motoristas ou grêmios e tecido associativo podem, graças à liberdade que nos restou de empreender no país, propor novas empreitadas empresariais capazes de remunerar melhor os profissionais, oferecendo maiores garantias aos “motoristas parceiros”, além de preços e qualidade de serviços superiores para seus usuários, assim como regimes de benefícios previdenciários, médicos, sanitários, de segurança e de emprego mais robustos.
Caso a empreitada se apresente demasiadamente arriscada para si, eles poderão buscar no mercado, na concorrência que aí já está, pelo jogo da procura e venda de serviços de plataforma, condições mais vantajosas, contratos e maneiras organizacionais mais apropriadas e convenientes para si ou para aqueles grêmios associativos que não estejam satisfeitos com as condições de determinada plataforma.
Na medida em que as empresas têm capital aberto, podem igualmente buscar participação nesse capital, nos lucros e buscar representatividade nos conselhos administrativos, contribuindo para orientar melhor as decisões de gestão das empresas, com vistas à melhora nas remunerações ou condições dos próprios associados.
Desde que as normas de justa conduta se apliquem no ambiente institucional, em caso de desacordos, quebras de contrato, comportamento oportunista, estratégias unilaterais, atentado ao código civil, código de trânsito ou direito do consumidor, encontramos resolução dos diferendos em tribunais de justiça.
O governo deve oferecer respaldo judicial pautado nesse arcabouço institucional existente e fiscalizar o cumprimento das regras vigentes nesses códigos. Assim, torna-se essencial reconhecer os acordos firmados espontaneamente entre os envolvidos como norteadores da relação.
Essa flexibilidade é, na verdade, uma das grandes astúcias do segmento. A possibilidade de realizar ajustes recorrentes em tarifas ou horários e proceder à revisão das cláusulas em função das mudanças do ambiente, da incerteza, dos riscos, da evolução da valoração dos ativos envolvidos ou das necessidades das partes constitui a própria natureza do negócio desde o início da relação de produção.
Essa flexibilidade é justamente aquilo que a regulamentação tende a comprometer. A regulamentação irá engessar, em alguma escala, as relações entre plataformas e motoristas autônomos, reduzindo precisamente o elemento que atrai as partes envolvidas na relação comercial. Isso repercutirá na relação entre usuários e as plataformas, bem como na relação entre o usuário e os motoristas.
Conclusão: os custos e a dispensabilidade da regulamentação
Nas relações de mercado, o mecanismo de preços é o principal norteador dos processos alocativos. Ele é suficiente. Em qualquer que seja a circunstância ou setor de atividade econômica, a intervenção governamental na economia (intervencionismo) acaba, quase sempre, por deslocar as instituições, os mecanismos, os incentivos, a coordenação e a alocação espontânea de recursos — característicos do mercado — para um modelo de organização no qual prevalecem regras administrativas e exigências regulamentares, muitas vezes menos eficientes do que aquelas que emergem da própria dinâmica mercantil.
Uma das principais críticas aos modelos de negócio trazidos pelas novas tecnologias, frutos da engenhosidade humana e da criatividade no mundo empresarial, está vinculada ao impacto que produzem sobre as formas tradicionais de trabalho. As empresas e o segmento como um todo são acusados de promover precarização, pressionar contra “direitos” trabalhistas e oferecer poucas garantias mínimas. Esquece-se, porém, de que grande parte da precarização percebida — bem como do desemprego e da instabilidade — deriva do próprio peso fiscal, regulatório e trabalhista que há décadas incide sobre as sociedades e cria barreiras estruturais ao desenvolvimento econômico.
No Brasil, a história recente da edição de normas enquadrando o funcionamento das plataformas de transporte rodoviário de cargas e de passageiros responde exatamente, de um lado, à tentativa do Estado de ampliar controle, arrecadação e padronização operacional, e, de outro, à pressão de grupos organizados — como taxistas, empresas de aplicativos ou motoristas autônomos — que disputam privilégios regulatórios e proteção contra a concorrência, seja por meio de autorizações exclusivas para atuar, seja por meio de refúgio legal para se blindar de novos entrantes no mercado.
O ativismo sindical, judicial e o lobby socialista, pela utilização de retórica marxista infundada, tenta generalizar padrões, normas, contratos, produtos, valores, países e pessoas, e fazer com que todos os “trabalhadores” tenham acesso às mesmas “oportunidades” e “direitos”, para aplicar nas comunidades, de maneira universal, uma realidade institucional cada vez mais inevitável da socialdemocracia, o que se aplica nesse caso específico à regulamentação das plataformas e à criação do fictício vínculo empregatício.
Contudo, no jargão dos economistas, a regulamentação apresenta custos marginais crescentes, e, para evitar todos os efeitos desse acúmulo de custos associados à regulamentação, é necessário retomar uma agenda que privilegie as instituições da propriedade privada e ensejar a dinâmica da concorrência, da livre associação, da liberdade contratual, do empreendedorismo, da liberdade de entrada e saída para empresas e trabalhadores do setor de plataformas de serviços de transporte.[4]
Em um cenário de livre iniciativa favorável ao empreendimento, assim como acontece com os preços, as cláusulas e as condições de adesão às plataformas são estabelecidas de forma privada entre motoristas e plataformas e se definem naturalmente nos mercados.
Mesmo aquelas regras mais preciosas, vinculadas, por exemplo, ao respeito de diretivas do código civil, código de trânsito e direito do consumidor, foram aplicadas antes mesmo da existência de alguma regulamentação. Isso é, na verdade, uma demanda de mercado, e a produção dessas convenções emergiu no setor de plataformas e se aplicou nas relações previamente entre todos os envolvidos: contratantes, passageiros, plataformas e motoristas autônomos – o que demonstra que, ao final das contas, a regulamentação estatal promotora de escassez é perfeitamente dispensável.
[1] Por puro exercício de consequência lógica, isso conduzira o governo a ter que oferecer uma carteira de trabalho no governo com direito a férias e décimo terceiro a todos aqueles que, por decisão individual própria, se julgarem inaptos ao trabalho em qualquer ramo na esfera privada, ou por julgarem as condições de trabalho em algum ramo demasiadamente penosas para aceite, ou que sua predisposição em não fazer nada lhes confira o direito de não precisar opinar ou trabalhar, se encontrariam em situação de dramática dependência em relação ao governo, prestador incorrigível de serviços sociais “gratuitos”.
[2] As próprias empresas de cartões de crédito, hoje em dia, utilizam declarações de autônomos baseadas em documentação de renda proveniente de serviços de transporte, e muitas vezes sequer precisam dessa documentação para oferecer, para bons clientes, cada vez mais vantagens e linhas de crédito, de acordo com a solvência, o perfil de risco e o histórico de pagamento. Muitas das dificuldades de crédito encontradas hoje devem-se, na verdade, a questões políticas e regulamentárias, que ora asfixiam a poupança, ora dificultam o acesso a linhas de microcrédito para trabalhadores, enquanto privilegiam, em normas, outros setores..
[3] Ver, por exemplo, a decisão da 6ª Turma do TST (2025) que reconheceu vínculo empregatício para um motofretista de aplicativo com base na chamada “subordinação telemática” (controle via aplicativo, como monitoramento de desempenho e definição de preços). O acórdão destacou que a autonomia aparente não exclui subordinação quando há fiscalização e controle, mesmo não havendo controle de jornada no caso de motoristas do iFood, que realizam apenas as corridas que escolhem no aplicativo. O impacto da decisão obrigou pagamento de verbas rescisórias, FGTS e INSS e abriu um precedente significativo para entregadores e motoristas. Recursos coletivos julgados pelo TST (2024–2025) confirmaram o vínculo quando comprovados controle de jornada, exclusividade e fiscalização, entendimento considerado aplicável a motoristas da Uber e a entregadores do iFood/Rappi, ampliando esquemas de “proteção social”. O STF pautou julgamento definitivo para dezembro de 2025 (RE 1.446.336 e RCL 64.018), com repercussão geral, o que pode uniformizar o entendimento nacional.
[4] É importante ressaltar que a regulamentação implica diversos custos e pode produzir efeitos dissuasivos tão importantes quanto os impostos para a economia. Entre os principais, destacamos as restrições à entrada e saída dos mercados causadas pelas normas, os custos vinculados a todo o processo de criação, oficialização e fiscalização dessas diretivas pelos diversos organismos do governo, os custos de colocação em conformidade e aplicação para empresas e pagadores de impostos, bem como diversos custos escondidos vinculados, ilustrativamente, à limitação de soluções voluntárias, à perda de competitividade, empregos e investimentos, e à desaceleração dos níveis de desenvolvimento dos setores regulados – um verdadeiro freio ao crescimento. A regulamentação responde a uma ambição de controle e à escolha pela subjugação das empresas e indivíduos aos ditames do Estado, ao pagamento de impostos e à centralização do poder de decisão, de modo que todos estejam sempre sob dependência direta de políticos e burocratas para poder simplesmente exercer uma atividade profissional. Novos arranjos organizacionais, planos de negócio e melhores soluções inovadoras são frequentemente desestimuladas por impedimentos regulamentares, notadamente quando se trata de atender a clientes específicos, novas rotas, tipos de frete, horários ou preferências associativas, organizacionais e de serviços.



