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O capitalismo depois da crise

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‘Meu objetivo é lançar um alerta’

Assim o Professor Luigi Zingales[1] respondeu a uma pergunta do auditório em palestra* promovida pelo Instituto Millenium[2] depois de ter apresentado o quadro atual das idéias que predominam a opinião pública americana pós-crise de 2008.

Em resumo: se o país que, por excelência, é o melhor exemplo do capitalismo – ainda que não seja nem tenha sido um modelo perfeito de economia de mercado – pensa hoje que é melhor o governo intervir no mercado do que deixar que este se auto-regule tanto para solucionar os graves problemas decorrentes da crise quanto para evitar que outras do gênero ocorram, então o resto do mundo perderá um paradigma de ordem econômico-social que conduziu não só os EUA, mas diversos países nas últimas décadas ao progresso inigualável que hoje conhecemos.

O Prof. Luigi Zingales, destacando a natureza da crise ocorrida no setor financeiro -centro do capitalismo americano -, e a resposta que o governo deu a ela, procurando salvar grandes instituições financeiras, alertou que esse quadro ameaça minar a percepção que o público tem de equidade, justiça e legitimidade do capitalismo em uma democracia. Ao propiciar os meios para a concentração de poder em algumas instituições grandes e alocar importantes recursos públicos para o resgate dessas mesmas instituições, os EUA correm o risco hoje de entrar no caminho do corporativismo europeu e do capitalismo de favorecimentos específicos (“cronismo”), tão comum em países onde há maior intervenção estatal. Enquanto no resto do mundo o capitalismo está associado ao compadrio entre governo e grandes empresários, à corrupção, historicamente não foi assim nos EUA onde era raro o sentimento popular anticapitalista.

“Os empresários são gananciosos e causam dano à sociedade”. Hoje esta é a visão de:

  • 70% dos brasileiros
  • 40% dos alemães
  • 54% dos americanos

Por paradoxal que seja, a opinião pública, que também critica o governo, pede mais intervenção do governo.

Para que o capitalismo sobreviva, é importante conscientizar a sociedade das vantagens de uma organização social democrática voltada para a verdadeira economia de mercado fundamentada no Estado de direito. Os EUA foram e ainda são o melhor exemplo dessas vantagens.

Ao contrário da maioria dos países do Ocidente, a democracia nos EUA é anterior à industrialização. Quando ocorreu a Segunda Revolução Industrial, ao final do século XIX, os EUA já usufruíam de décadas de sufrágio universal (masculino) e de várias décadas de elevado índice de escolarização. Isso criou uma população com alto grau de expectativas e pouco propensa a tolerar comportamento inadequado na arena da política econômica.

Não é por coincidência que o real sentido da lei antitruste – uma idéia pró-mercado, mas algumas vezes antiempresarial – desenvolveu-se nos Estados Unidos no final do século XIX, início do século XX. Por essa época, e também não por coincidência, surgiu um movimento populista (mas não antimercado) nos EUA que aumentou a regulamentação do mercado visando evitar a concentração de poder. Isso fez com que os americanos logo entendessem que nem sempre os interesses do mercado coincidem com os interesses empresariais.

As idéias socialistas só entraram nos EUA depois que o capitalismo já era um sucesso; talvez por essa razão, nunca tenha conquistado muitos adeptos.

Um outro aspecto a favor do capitalismo americano é o religioso. Com orientação calvinista para o sentido de lucro, a idéia de que é um pecado – tão difundida nos países católicos – não serviu de pedra de tropeço para o cidadão comum.

Entretanto, o que o Prof Zingales chama de “excepcionalismo americano”, vital para a prosperidade dos EUA, pode estar prestes a sofrer uma grande mudança, sob influência de fatos que se originaram no século XX, e em especial no atual governo de Obama.

Um dos fatos significativos foi a concentração de poder no setor bancário. Em 1980, o número de bancos nos EUA era quase o mesmo que em 1934; em 2009, esse número havia caído para menos da metade. Em 1984, os 5 maiores bancos americanos controlavam 9% (nove por cento) do total de depósitos bancários; hoje esse número chega perto de 40%.

Um dos graves efeitos de tamanha concentração é sua influência sobre Washington, a influência dos financistas sobre o governo. Quando estourou a crise nos EUA, eles conseguiram convencer o governo de que, se este não entrasse com o socorro financeiro necessário, seria o fim do mundo. Na verdade, do mundo deles, financistas, segundo o Prof. Zingales.

O favorecimento explícito e volumoso foi uma brutal quebra das regras do jogo. Por incrível que pareça, não só os financistas pediram por ela, mas grande parte da população. Havendo quebra de regras, surge a insegurança, especialmente com relação aos direitos de propriedade. O favoritismo gera acordos e negócios especiais.

O que começa a ocorrer nos EUA é a difusão de uma concepção antiga nos países europeus e em países em desenvolvimento: que as idéias pró-mercado são também idéias pró-empresários. Muitas vezes elas se opõem.

As idéias pró-mercado favorecem a entrada de novos, com novo potencial. A economia de mercado vê os subsídios não apenas como um desperdício, mas como um estímulo à ineficiência e uma barreira aos jovens talentos empresariais – que deverão provar sua eficiência.

A mentalidade do lobby desvirtua as melhores mentes para sugar riqueza, ao invés de criá-la. Aí pode estar a selva, não na economia de mercado.

Na economia de mercado, as regras têm que ser respeitadas e elas dão equilíbrio e confiabilidade nas relações. É uma idéia poderosa para o desenvolvimento.

As empresas fazem e sempre tentarão fazer lobby, é inerente ao interesse da empresa. O que não deve haver é uma idéia generalizada de que essa atitude é a mesma que orienta uma verdadeira economia de mercado.

“O objetivo de minha batalha”, conclui Zingales, é levantar este alerta: para a sobrevivência do capitalismo, das forças que produzem riqueza de fato,

É PRECISO HAVER O LOBBY PRÓ-MERCADO

mostrando o papel fundamental das instituições, das boas regras do jogo. Uma regulamentação ruim distorce os incentivos. A economia de mercado defende um mínimo de regulação, necessária, mas que seja a melhor possível.

*RESUMO POR LIGIA FILGUEIRAS, INSTITUTO LIBERAL


[1] Professor de Empreendedorismo e Finanças na University of Chicago Booth School of Business e co-autor de “Saving Capitalism from the Capitalists”, junto com Raghuram Govind Rajan. Ainda sem versão em português.

[2] Palestra “Capitalism after the Crisis”, patrocinada pelo Instituto Millenium, Chicago Booth, VALE e Insper. 26.05.2011, Rio de Janeiro.

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