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Nem polícia, nem justiça: quem solta o bandido é o sistema

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jaimeO Rio de Janeiro se encontrou novamente em debate sobre o problema da segurança pública, muito em virtude da recente morte de um médico ocorrida na Lagoa, bem como as mortes resultantes da invasão de um grupo de traficantes ao Morro de São Carlos, na área central do Rio de Janeiro, quase em frente à sede da Prefeitura Municipal.

O destaque fica por conta do bate-boca promovido, ainda que involuntariamente, entre o Governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, e o Presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Carvalho.

Pezão tentou se defender da crise na segurança pública afirmando que a Polícia Militar, sob seu comando, prendia os criminosos, mas que os Desembargadores do TJ/RJ, sob comando de Carvalho, soltava os bandidos em seguida com liminares. Carvalho contra-argumentou dizendo que na verdade o que faltou foi policiamento ostensivo.

A troca de farpas entre ambos esconde uma verdade mais cruel. Não é a polícia, especificamente, ou a justiça, especificamente, que não combatem os criminosos ou os solta em seguida. É o sistema de política criminal brasileiro, como um todo, que faz isso, no qual todas essas partes estão envolvidas.

A primeira contribuição que o sistema faz é impedir que as pessoas possam realizar autodefesa com o direito de possuir e portar armas. Como expliquei em outro momento, o crime é uma ação humana descentralizada, e a única maneira de combatê-lo com eficiência é através de ações descentralizadas. A lógica do Estado é centralizadora e naturalmente ineficaz para atuar de maneira descentralizada. O Estado até tenta, mas sempre lutando contra sua própria natureza. Impedir que agentes livres e descentralizados possam se defender é um obstáculo à segurança pública.

Isso se torna ainda mais grave no específico caso do médico inocente morto na Lagoa. No ano passado, os condomínios desse bairro resolveram contratar seguranças particulares para combater os pequenos crimes que ocorriam lá. As pessoas estavam se sentindo seguras e as ocorrências haviam diminuído radicalmente. A Prefeitura e a PF resolveram impedir essa atividade, que era lícita, feita por empresas de segurança legalizadas e com pessoas com porte. Também relatei isso em outra oportunidade. O resultado, previsível, foi que a sucessão de pequenos crimes gerou um grande crime. Prefeito, Governador e Presidente podem ter esquecido. Eu não esqueço. Agora a família e os amigos do médico também não esquecerão.

Falando em pequenos crimes que geram grandes crimes, o sistema também traz uma grande contribuição para o estímulo ao crime, com o chamado “Princípio da Insignificância” ou “da Bagatela”, segundo o qual atividades ilícitas de pouca ofensividade, ou cujo valor econômico seja baixo, não devem ser consideradas criminosas. Poderíamos até concordar com a aplicação desse princípio, desde que ele não incidisse descaracterizando o crime. Ele devia no máximo ser motivo de inaplicabilidade de pena, e apenas na primeira vez. Em concreto, se o sujeito cometesse um crime menor, como bater uma carteira, ele deveria ser julgado e condenado pelo crime, apenas não se aplicando pena da primeira vez, ficando suspensa, e caso ele cometesse um crime menor numa segunda vez, ele responderia pela pena suspensa mais a pena do novo crime. Já como ocorre hoje, em que o criminoso sai do processo inocentado, é um completo absurdo.

Vale a pena citar ainda que os juízes que aplicam a lei tem pouco a ver com a liberação do criminoso, afinal, se a lei e a jurisprudência admitem a liberdade nesses casos, cabe aos julgadores cumprirem a lei.

A questão da maioridade penal é outra contribuição grande do sistema a essa insegurança. Como também já falamos em outra oportunidade, precisamos superar o modelo de imputabilidade penal com foco no critério biológico (idade) e focar mais no critério psicológico. Imputabilidade tem a ver com saber se o agente criminoso teria ou não condições de avaliar a gravidade da sua conduta ilícita, sendo portanto uma questão intrinsecamente psicológica. A idade mínima deveria ser apenas um meio de presunção de imputabilidade, e não um limite. Ou seja, a lei deveria trazer uma idade onde se presumiria que o agente é imputável, mas, caso fosse comprovado por meio de perícia que o agente sabia a gravidade do ato cometido, então, mesmo abaixo da idade legal, ele deveria responder como se adulto fosse, por ser medida de responsabilidade e justiça.

Outras ações são também muito importantes: um código de processo penal mais enxuto e objetivo, sempre preservando a ampla defesa e o contraditório; um lei de execução penal que não desse vazão a direitos excessivos, como indultos de natal; um código penal com menos tipos penais bobos, que podem ser resolvidos em esfera cível, e com mais foco e rigor nos tipos penais que envolvem violência; além de maior investimento nas polícias.

Em suma, o sistema deve ser repensado. Sem essa reflexão, polícia e justiça, meros produtos do sistema, vão continuar a fazer o que fazem, enquanto criminosos… bem, também continuarão a fazer o que fazem.

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Bernardo Santoro

Bernardo Santoro

Mestre em Teoria e Filosofia do Direito (UERJ), Mestrando em Economia (Universidad Francisco Marroquín) e Pós-Graduado em Economia (UERJ). Professor de Economia Política das Faculdades de Direito da UERJ e da UFRJ. Advogado e Diretor-Executivo do Instituto Liberal.

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