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Liberdade é um valor inegociável

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Na obra Política do filósofo grego Aristóteles, do século IV a.C., há preocupação com a formação moral do cidadão, cujo cerne é a estima individual; mas também com a conformação do arranjo social, que supostamente deveria resultar em um grau mais elevado de satisfação coletiva. Aristóteles entendia o ser humano como um ser pensante, capaz de se comunicar e viver em sociedade, onde a cooperação social lhe traria mais benefícios que adversidades. Para tanto, ao longo do tempo, foi preciso cultivar leis, costumes e um conjunto de valores morais que pudessem diferenciar o bem do mal e o que é certo do que é errado. Esses valores compõem um código de conduta moral que permite ao indivíduo integrar-se e ajustar-se à vida em comunidade, para benefício geral de seus integrantes. Dessa forma, são os hábitos, as crenças e os princípios, transmitidos de geração em geração, no interior dos núcleos sociais, que formam a teia cultural de uma sociedade, tão importante para sua evolução quanto para o delineamento do comportamento individual e gregário.

Evidente que, apesar da existência de valores universais e da influência mútua entre os povos, há uma grande diversidade de aspectos culturais que definem as peculiaridades de cada nação. Além disso, é razoável esperar que a cultura de um povo sofra modificações ao longo do tempo, por um processo natural de adaptação às transformações ambientais e de ajuste à aspiração de maior bem-estar. É exatamente por isso que é possível dizer que a cultura de um povo tem atributos de cumulatividade e dinamismo. Se por um lado esse complexo conjunto de práticas e comportamentos absorve e sedimenta o que foi transmitido pelas gerações anteriores, ao mesmo tempo incorpora características inéditas, que transportam as novas gerações a um padrão mais avançado de vivência. Assim, a humanidade evolui entre a consolidação de práticas bem-sucedidas e a reconsideração do que ainda causa tribulação. Para Russel Kirk, esse é o segredo da conservação de uma nação: nada deve ser totalmente velho, tampouco, nada precisa ser necessariamente novo por completo.

Claro que a família, como núcleo social primário, é fundamental na transmissão dos valores de uma cultura. É no convívio familiar que se aprende a respeitar, partilhar, ter compromisso, ter disciplina, ter liberdade e responsabilidade e ainda administrar conflitos, pois o transcurso do desenvolvimento humano, que a psicologia define como o conjunto de processos sistemáticos de mudanças e estabilidade, do nascimento à morte, ocorre no seio da família. Portanto, não parece sensato o interminável ataque dos progressistas a essa instituição, por mais imperfeita que ela possa ser. As transformações físicas, cognitivas e psicossociais que todos experimentam certamente têm colaboração e reforço dos entes familiares. A formação da personalidade, o pensamento reflexivo, a visão de mundo, os relacionamentos interpessoais e a convivência em sociedade, todos evidenciam aspectos familiares. Aliás, há muito se estuda a influência do ambiente e da família na formação do indivíduo. Famílias que encorajam a criança a enfrentar os desafios de seu crescimento contribuem para a formação de uma personalidade de maior autoestima e maturidade para suportar as adversidades e frustrações comuns à existência do ser humano. Por outro lado, a superproteção aliada à pré-disposição biológica pode contribuir para a formação de adultos inseguros, propensos a superestimar os riscos naturais do existir.

Outras organizações como as escolas, as empresas e a mídia também têm influência na formação do indivíduo e na composição cultural. Infelizmente, há tempos, psicanalistas e filósofos vêm denunciado que as novas gerações passam por um prolongado processo de infantilização e de distanciamento da realidade. Luiz Felipe Pondé afirma que a geração do Ipad e das mídias sociais, intolerante às frustrações e à dureza da vida, adia seu amadurecimento e autonomia, ao permanecer mais tempo protegida na casa dos pais. Para Pondé, amadurecer significa aprender a lidar com a angústia, com a ansiedade, com a insegurança e com a incerteza e, assim, finalmente admitir que a perfeição não existe. A psicanalista Viviane Mosé afirma que somente o rastro do sofrimento, que acompanha a existência, é capaz de transformar uma criança em um adulto equilibrado. Logo, assumir o protagonismo da própria vida é para aqueles que têm coragem. Não faz sentido negar permanentemente os percalços do ser. O psicólogo Jordan Peterson, no livro 12 Regras para a Vida: um Antídoto para o Caos, alerta que a única forma de uma criança se tornar um adulto saudável é permitir sua exposição ao risco e ao perigo. Muitos pensadores e pesquisadores, portanto, parecem concordar que, na vida e no ambiente empresarial, a antessala do sucesso é repleta dos desafios e das adversidades enfrentadas pelos indivíduos. As cicatrizes que se formam no transcurso vital têm o mérito de prepará-los para os novos embates do porvir.

Não obstante, não é por acaso que Pondé cita o século XIX como o início do processo de infantilização da sociedade. Foi a partir do marxismo cultural proposto por Gramsci e pela Escola de Frankfurt e da criação de um evangelho de defesa das causas dos oprimidos que a responsabilidade individual começou a ser diluída. Então, toda dificuldade, toda frustração, todo insucesso é sempre culpa do outro, que o impediu de alcançar a plena felicidade, como se esta fosse um direito inalienável. É exatamente por isso que o Estado sempre cresce. A demanda por justiça social em prol dos “indefesos” nada mais é que uma justificativa para a intervenção do poder estatal, em detrimento das liberdades individuais. Sem liberdade e responsabilidade, não resta outra alternativa senão clamar pela tutela estatal, que promete saúde, educação, segurança, aposentadoria e que até define o limite de sódio nos alimentos que alguém pode ingerir. Afinal, cidadãos infantis sempre precisarão de que pais responsáveis os direcionem. Não faltam exemplos da intromissão estatal na vida do cidadão e das empresas: do seguro obrigatório para veículos ao salário mínimo, para proteger o trabalhador-criança, que não sabe negociar seu salário com a empresa contratante. Fique em casa e não se atreva a circular pelas ruas sem máscara, brada o Grande Irmão, ainda que haja dúvida sobre a eficácia de máscaras na proteção contra o contágio pelo Corona vírus.

O fato é que, sem liberdade, a existência humana saudável se torna impraticável. A dependência estatal converte a humanidade em seres incompletos, infelizes, fúteis, servos, sem entusiasmo. A utopia marxista de um mundo melhor, arquitetado por um poder central, se revela um enorme engodo. Nada funciona como esperado. A arte perde sua beleza e o poder de encantar, substituída pelo comum. A fé e o sagrado são depreciados em nome do prazer autocentrado e fugidio. A cooperação é trocada pela submissão à autoridade. A economia é enclausurada na armadilha da baixa produtividade, do crescimento pífio e da falta de inovação. O empreendedorismo definha em meio ao emaranhado de leis imprestáveis. A justiça se torna um filme de ficção, onde os bandidos e seus capangas debocham do homem comum, abandonado à própria sorte. A juventude, sem autoestima, duvida de sua própria força e não vislumbra outra alternativa senão retirar-se para plagas onde ainda houver algum vento de liberdade.

Com tudo isso, é ainda possível ter esperança de alguma reversão? Thomas Jefferson, um dos pais fundadores da nação americana, respondeu a essa questão ao dizer que “o preço da liberdade é a eterna vigilância”. A livre iniciativa, o respeito aos direitos individuais à vida e à propriedade privada, o capitalismo de mercado, que espalhou prosperidade aos quatro cantos do mundo, e os demais valores da civilização ocidental foram forjados por séculos de muito esforço, novas ideias, atitudes e coragem para rechaçar as ameaças ao mundo livre. Nenhum sofisma progressista resiste à firmeza de caráter e à lucidez da razão. O famoso discurso inaugural de Winston Churchill ao parlamento britânico, em 1940, expressa o estilo de liderança necessária para a defesa da liberdade e dos valores civilizatórios, que reconhecem a imperfeição do homem, mas preservam o livre arbítrio e a possibilidade de se arriscar, de sair da zona de conforto e de falhar talvez, mas de sempre aprender com os próprios erros, como é habitual na vida de cidadãos maduros e responsáveis.

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Vinícius Montgomery de Miranda

Vinícius Montgomery de Miranda

Graduado e Mestre pela Universidade Federal de Itajubá, MBA em Gestão Financeira pela UNITAU. Consultor de Empresas e Professor de Economia e Finanças.

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