Legado Olímpico: o caso grego
O governo grátis fez mais uma vítima. O Estado do Rio de Janeiro, na última sexta-feira, decretou estado de calamidade pública devido a problemas de fluxo de caixa. Os gastos exorbitantes realizados pelo Governo do Estado, principalmente para a realização dos Jogos Olímpicos e da Copa do Mundo, deixaram o caixa do governo do Estado do Rio de Janeiro com um déficit de R$ 19 bilhões, segundo previsão do secretário estadual de Fazenda, Júlio Bueno, em entrevista ao portal G1[[1]].
Não é a primeira vez que vemos falta de planejamento dos governos – e suas consequências – na realização de eventos esportivos. Na Grécia, os Jogos Olímpicos de 2004 deixaram rastros na economia do país e o tal “legado das Olimpíadas” foi uma dívida praticamente impagável e problemas na economia grega que se mantém até hoje.
Em 1997, os gregos conquistaram o direito de sediar as Olimpíadas de 2004, ganhando de candidaturas de capitais como Roma (Itália), Estocolmo (Suécia), Cidade do Cabo (capital legislativa da África do Sul) e Buenos Aires (Argentina). A cidade escolhida foi Atenas, capital do país e local da primeira Olimpíada da era moderna em 1896.
A Grécia, um dos berços culturais da humanidade, tem uma grande riqueza em sua história e na cultura, todavia nunca foi um país rico. A principal fonte de riquezas do país helênico sempre foi o turismo, já que não dispõe de riquezas naturais, agricultura desenvolvida e de grande escala e, muito menos, de um forte setor industrial. Diante desse cenário, o governo da Grécia não teve outra opção senão contrair empréstimos para poder honrar o compromisso da realização dos Jogos Olímpicos. Do total de €8,9 bilhões que foram gastos para a realização dos jogos, que também contemplou a construção de arenas e de infraestrutura, € 7,2 bilhões vieram do Estado, que arrecadou esse dinheiro através de impostos, venda de títulos da dívida pública, retirada de fundos da União Europeia e em empréstimos contraídos com bancos franceses e alemães.
O governo grego esperava recuperar uma parte do dinheiro com a venda ou concessão das arenas utilizadas nos Jogos Olímpicos, para poder começar a quitar os empréstimos. Porém conseguiu levantar apenas 25% do valor esperado. E muitas arenas faraônicas construídas para a realização dos Jogos, como o Ginásio da Paz e Amizade, que sediou as competições de vôlei, tornou-se um elefante branco. E foi em 2009 que a bolha grega começou a estourar. A realização dos Jogos em 2004 foi o ponto de inflexão da política de irresponsabilidade fiscal que tomou conta da Grécia entre 1997 e 2009 e que teve repercussão mundial com a eleição de Alexis Tsipras, do partido de extrema esquerda Syriza para o cargo de primeiro-ministro em 2015. Porém, a situação da Grécia estava tão calamitosa que Tsipras não teve outra opção senãorever alguns conceitos de sua campanha e passar a realizar ajustes fiscais por pura necessidade. O chamado legado Olímpico para Atenas e para a Grécia se resumiu a alto endividamento público e a elefantes brancos espalhados pela capital.
O Rio de Janeiro está colhendo as consequências de gastos irresponsáveis e superfaturamentos de obras, tanto dos locais para realização das provas quanto das obras de infraestrutura na cidade. E a conta chegou agora, faltando apenas poucos dias para a abertura dos Jogos. E, com o encerramento das Jogos Olímpicos e Paraolímpicos, ficarão as dívidas, que continuarão aumentando cada vez mais, irão saltar aos olhos de todos os sempre famosos “elefantes brancos” na capital fluminense, já que muitos locais de provas provavelmente serão praticamente inutilizados no pós-Olimpíada. Isso sem contar a lista de obras inacabadas espalhadas pela capital. Então, finalmente, todos irão se perguntar: seo maior legado olímpico para o Estado do Rio de Janeiro foi a irresponsabilidade fiscal, será que realizar a Olimpíada valeu mesmo a pena? É evidente que não.
[1] http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2016/06/se-fosse-empresa-pedia-recuperacao-judicial-diz-secretario-sobre-rj.html