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Investimento e saldo em transações correntes pelo mundo

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Peço aos amigos que assistam o vídeo abaixo:

Aos 42 segundos começa a seguinte conversa entre Bresser-Pereira e Alexandre Schwartsman que segue até 1:10:

– (Schwartsman). Se fosse verdade o que você está falando Bresser, você não veria uma relação negativa entre a taxa de investimento e o saldo em conta corrente. Essa relação existe.
– (Bresser). Não existe essa relação, absolutamente não existe não existe esta relação, não existe.
– (Schwartsman). Não estou nem dizendo que esta seja uma relação de causa e efeito, provavelmente as duas coisas estão acontecendo simultaneamente.
– (Bresser). Está mais do que verificado que quando maior o déficit em conta corrente…
– (Schwartsman). A relação existe e é negativa. Quanto maior o investimento, maior o déficit em conta corrente.
– (Bresser). Está mais do que verificado que quanto maior o déficit em conta corrente, menor o investimento.

As últimas frases ficaram confusas porque a conversa começa com o saldo em conta corrente e termina com o déficit em conta corrente, mas na conversa Bresser defende uma tese desenvolvimentista que critica o uso de poupança externa para financiar o investimento. Schwartsman pondera que se reduzirmos a poupança externa então nosso investimento, que já é baixo, vai cair ainda mais, pois não teríamos como financiar o investimento apenas com poupança interna. A conversa pode ser vista como um debate teórico, há uma série de detalhes que torna muito difícil testar tais hipóteses. Porém no trecho que destaquei a coisa muda de figura e a conversa passa a ter afirmações falseáveis. Schwartsman afirma que a correlação é negativa e Bresser afirma que é positiva. O que dizem os dados?

Um monte de gente mostrou que no Brasil a correlação é negativa, para quem estiver curioso recomendo olhar os comentários no post do Alexandre Scchwartsman ou nos comentários no post do Vitor Wilher. Porém, tomado pelo Espírito de Natal, decidi salvar o mentor do novo desenvolvimentismo e fui procurar por países onde a correlação é positiva. Como de costume peguei a base de dados do FMI e selecionei os países com mais de 10 milhões de habitantes com dados disponíveis para saldo em conta corrente e taxa de Investimento entre 1995 e 2015. Ficaram 67 países, para cada país fiz a regressão entre o saldo em conta corrente com proporção do PIB e a taxa de investimento, a figura abaixo mostra o coeficiente da conta corrente em cada regressão.

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Em 57 países, incluindo o Brasil e todos os países da América Latina, a correlação é negativa como afirmou Schwartsman e em 10 países Bresser estaria vingado, são eles: Bangladesh, Egito, Reino Unido, Uzbequistão, Iêmen, Quênia, Uganda, Arábia Saudita, Sudão e República Democrática do Congo. Resolvi então refinar minha busca e selecionei apenas os países onde o coeficiente era significante a 10%, ficaram 48 países dos quais cinco apresentam coeficiente positivo. Não satisfeito fiquei mais exigente e selecioneis países com coeficiente significantes a 5%, sobraram 40 dos quais 4 apresentaram coeficiente positivos. Por fim apelei e fiquei só com coeficientes significativos a 1%, sobraram 31 países, apenas Bangladesh e Reino Unido com coeficiente positivo.

Quais minhas conclusões? A primeira e mais robusta conclusão é que realmente sou muito chato, um sujeito normal acharia coisa melhor para fazer na semana de Natal e um sujeito apenas chato faria o gráfico para o Brasil. A segunda conclusão é que Bresser não estava errado nem mentindo, estava apenas perdido. Tivesse o debate ocorrido no Reino Unido ou em Bangladesh o ex-ministro de Sarney e FHC estaria certo e os defensores dele não estariam pagando mico tentando defender o indefensável nas redes sociais. Por fim, abusando da boa vontade do leitor e pegando carona na famosa Belíndia do Edmar Bacha concluo que o desenvolvimentismo de Bresser talvez seja a melhor política para um país imaginário chamado de Ingladesh, um país tão rico quanto a Inglaterra, tão exótico quanto Bangladesh e que só existe na imaginação de economistas muito criativos.

Roberto Ellery

Roberto Ellery

Roberto Ellery, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), participa de debate sobre as formas de alterar o atual quadro de baixa taxa de investimento agregado no país e os efeitos em longo prazo das políticas de investimento.

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