As histórias e os fatos
Como cabalmente comprovado em pleno ano 2023, não me parece haver dúvidas de que nós, humanos, acreditamos ser verdade aquilo que nos convêm. A história humana, evidentemente, foi e é escrita por mortais, sendo um relato daquilo que historiadores registram sobre determinadas épocas, seus governantes e seus governados.
A “lógica” se dá a partir de suas próprias perspectivas e premissas, objetivamente contaminadas por suas respectivas visões de mundo. Em especial, os indivíduos mais intelectualizados desejam e se grudam a uma ideologia para viverem. Portanto, a “verdade” está sempre mascarada pelos preconceitos pessoais.
Gosto muito de história e, como tenho o hábito de ler, impressiona-me muito o relato diferenciado de historiadores sobre os mesmos períodos históricos e seus eventos. Não é de hoje que o que nos faz agarrar páginas de papel sejam as histórias emocionantes sobre amores, traições, intrigas, mentiras, vitórias épicas, tragédias, e todo o psicodrama humano.
Penso que é da natureza humana a maior adoração e crença em sentimentalismos e em coisas abstratas do que nos efetivos fatos do processo histórico civilizacional. Marx afirmou que a história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa. Prefiro a assertiva de Mark Twain: “A história nunca se repete, mas rima”, pontuando que a história é, genuinamente, uma eterna repetição de algo que já ocorreu antes.
Pela própria natureza humana, é sabido que a reincidência de eventos no passado, em algum momento, irá operar. Tal qual na história do Império Romano – e em outras da antiguidade -, a do século XX e da atualidade reproduzem o desejo insaciável das massas pelas fortes emoções, pelas mesquinharias, pelas intrigas e pelos detalhes palacianos mais sórdidos. Evidente que não é por acaso – tenho lá minhas dúvidas da existência do acaso – que o BBB se encontre na sua edição de número 23.
Mesmo que distintas correntes de historiadores, animados por seus corações e mentes ideologizadas, possam escolher meticulosamente suas evidências, a fim de apoiar suas próprias convicções, em especial, na história recente, os fatos e a verdade são nus e crus. É singelo recorrer à internet, a documentos, a imagens, a gravações, a depoimentos, enfim, a farto material comprobatório de determinados eventos e situações.
Então, a fim de conhecer a verdade verdadeira, basta querer ser livre, autônomo, e despido de preconceitos de todas as ordens. Claro, se o espírito tribal o deixar… De forma sustentada, nosso mundo atual é a era da pós-verdade, em que os fatos objetivos são para lá de secundários, escamoteados, num profundo desrespeito pela verdade, imperando firmemente os apelos bizarros às emoções e às grotescas crenças pessoais.
Pois a repetição histórica parece ser fulminante. O pão e o circo dos tempos romanos se reproduz sistematicamente quando as elites palacianas divertem e acalmam o povo com espetáculos glamorosos – alguns literalmente sangrentos – e shows de músicos e de artistas teatrais progressistas, além, por óbvio, da distribuição de migalhas pecuniárias para a plebe, alegrando e a manipulando intensamente. Este tem sido o exercício preferido das atuais autoridades nacionais.
Nesse festivo contexto, a ignorância samba e impera de maneira brava. Todos sabem e/ou poderiam conhecer a verdade, ver a verdade, porém, ainda creem na mentira escrachada. Assim como os historiadores podem narrar pelas lentes de seus preconceitos, e não sabemos exatamente quais são suas motivações, os registros dos fatos objetivos, muitas vezes, são inegáveis.
Ao longo da história, percebe-se claramente que a decadência decorre de autoritarismos e da ânsia pelo poder de governantes enganadores do povo, em especial, dos mais necessitados e incautos. Lamentável que o povaréu aprecie o pitoresco em detrimento dos fatos e da verdade. O povo não tem conhecimento da história, por vezes é manipulado pelos que a controlam, no passado e no presente.
Tristemente, o “povo” pensa e age com o lado artístico do cérebro, quando deveria ser capaz de fazê-lo por meio do pensamento racional, ou seja, pelo lado esquerdo deste. A abstração na mente tupiniquim equivale à picanha na dieta brasileira.