Liberalismo no Brasil?
Dá-me uma espécie de arrepio quando vejo gente falando e escrevendo sobre o império e a “ameaça hegemônica” do liberalismo no Brasil. Liberalismo implica liberdades individuais e econômicas.
Em relação às liberdades individuais, no país, constata-se a olhos nus que estas vêm sendo ceifadas tal qual se corta o tronco de uma árvore, a machadadas. Basta ver a presente preocupação de todo brasileiro ao opinar e fazer críticas à atuação dos onze semideuses do STF, que, apesar de afirmarem ser os guardiões da constituição, rasgam-na sistematicamente, como foi o caso na manutenção dos direitos políticos da “ex-presidenta” Dilma, ou na anulação dos processos do ex-presidente e ex-presidiário Lula, em Curitiba.
Bem, liberalismo pressupõe livre mercado, e falar em livre mercado no Brasil soa piada de mau gosto. O Brasil é o reino da alta concentração de indústrias, a terra verde-amarela dos oligopólios. Em uma estrutura de mercado oligopolista, poucas empresas controlam o mercado, ou seja, há baixa concorrência.
Este, de fato, é o calcanhar de Aquiles do país, e quem paga essa conta são, principalmente, os mais pobres. Todos conhecemos e sentimos a concentração no setor bancário: é abissal; são cinco grandes bancos, incluindo o Banco do Brasil e a Caixa. Há ainda a alta concentração na telefonia, no setor de bebidas, em aços especiais, no setor aéreo, na locação de veículos, enfim, a lista é grande.
Com esta concentração, evidentemente que esse controle, com menor concorrência, traduz-se em maiores preços e produtos e serviços de qualidade no mínimo questionável, com baixo nível de inovação. Interessante que quase sempre os preços dos produtos e serviços são muito parecidos, e quase sempre altos!
Ao mesmo tempo, a concentração dota esses players do mercado de grandes economias de escala, que se transformam em barreiras de entrada para novos competidores nestes setores. Muitas vezes, a supervisão de um oligopólio pode ser ainda mais complexa do que do próprio monopólio, já que pode existir a aparência de competição entre as empresas estabelecidas.
Alguns podem até argumentar que esses setores são “competitivos”; só resta definir para quem! O grande Adam Smith, ferrenho defensor do livre mercado, argumentava que não só os monopólios estatais eram indesejáveis – os privados também eram prejudiciais aos consumidores e à sociedade.
Eu diria que os oligopólios são compostos de empresas públicas ou privadas e também necessitam ser supervisionados a fim de atender às realidades e às necessidades dos consumidores.
Muito se fala em desigualdades sociais, contudo, pouco se discute sobre a enorme pressão e influência dos grupos de interesses no país, que, embora retoricamente se digam abertos à competição, trabalham nos bastidores para que a dinâmica competitiva permaneça exatamente como se encontra: estruturas oligopolistas com baixa competição.
Pois é, e o brasileiro descamisado segue arcando com preços mais altos por piores produtos e serviços, visto que existem poucos vendedores disponíveis. Além disso, e o que é o pior, sem concorrência, há pouco estímulo para as inovações em toda a cadeia de valor, trazendo ainda mais prejuízos para os consumidores e para o país. Triste, mas nada que não posso ficar pior: em tempos de crise como a da Covid-19, agora, o processo de concentração empresarial se acirra, podendo reverberar em menor competição empresarial de verdade.