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Estado Islâmico: um califado de mil anos?

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Shiraz_Maher_no_GatestoneShiraz Maher é um paquistanês naturalizado britânico que dirige um centro de pesquisa sobre conflitos no Oriente Médio, do King’s College, em Londres.

Em entrevista exclusiva para a Folha de S. Paulo, falou sobre O EI (Estado Islâmico) que domina o norte do Iraque e sul da Síria.

Como sabemos, trata-se de uma facção islâmica que se tem mostrado mais radical do que a Al Kaeda, de Osama Bin Laden.

Desde que tomou posse de cidades na supramencionada região, tem executado sumariamente todos os infiéis, i.e não muçulmanos, e até mesmo muçulmanos dissidentes dos seus ditames radicais.

Segundo pensamos, esse grupo terrorista recém-formado só conseguiu se estabelecer nessa região graças à impotência das Forças Armadas iraquianas e à negligência do democrata Barack Obama.

Shiraz não diz isto, mas pensa que agora é tarde demais para acabar com o Estado Islâmico porque este está muito bem estruturado e armado.

“Não é a primeira vez que uma organização toma um território. Vimos isto no Afeganistão, no Paquistão, na Somália. Mas em todos esses casos o Ocidente interferiu e os grupos perderam terreno” (Folha de S. Paulo em 24/8/2014).

Todavia, segundo diz Maher, a diferença é que agora falta apetite para fazer qualquer coisa. Realmente, tudo que Obama recentemente fez foi alguns bombardeios aéreos a alvos estratégicos.

Em nosso ver, isto ocorreu graças à diferença entre as políticas externas do republicano Gorge W. Bush e do democrata Barack Obama.

A de Bush, mais inclinada para os conservadores americanos, e a de Obama, mais simpática aos socialdemocratas europeus.

Mas quanto ao papel do Iraque, Maher está bastante próximo do que já afirmamos.

“Além disso, as forças iraquianas e sírias são incapazes. O EI está muito fortalecido e é muito difícil fazê-los recuar”.

De acordo. Lembramos apenas que, no caso da Síria, Bashar Al-Assad está travando uma luta encarniçada contra os contestadores do regime que já produziu milhares de vítimas e refugiados.

E Maher acrescenta que não é impossível acabar com o EI, mesmo não contando ele com o apoio da maioria dos países muçulmanos.

No entanto, isso só se torna possível dentro de cinco ou dez anos. O EI não só possui bilhões de dólares como conta com combatentes vindos de todas as partes do mundo.

Não causa estranheza o EI possuir simpatizantes mesmo fora do mundo islâmico. Há muitos ocidentais que, por ideologia ou por desinformação, ou mesmo por ambas, dão apoio a terroristas islâmicos.

O que indagamos, e Maher não responde, é: de onde vem todo esse dinheiro? Seus financiadores são provenientes de países islâmicos ou não islâmicos, ou mesmo de ambos?

Ele pensa que o EI foi bastante influenciado pela guerra na Síria contra o regime de Al-Assad. Começou em território sírio e foi depois para o Iraque se apossando de poços de petróleo e gás.

Além disso, o exército do EI conta com muitos estrangeiros vindos da Chechênia (país muçulmano, uma das ex-Repúblicas Socialistas Soviéticas) e da Bósnia-Herzegovina (país com muitos muçulmanos, que se tornou independente com o desmembramento da Iugoslávia).

Na sua maioria, eram ex-combatentes em seus países e possuem experiência militar.

Maher afirma que o EI é diferente da Al Kaeda em dois aspectos importantes: primeiro é que a Al Kaeda era um grupo terrorista, ao passo que o EI pretende ser um Estado de fato, com todos os deveres e direitos inerentes a essa condição.

Maher não hesita em afirmar que o EI não só é mais radical do que a Al Kaeda, como também mais inteligente de um ponto de vista estratégico militar.

O problema para o Ocidente não consiste em erradicar o EI da área já conquistada por ele – coisa muito difícil, se não impossível -, mas sim em tentar impedir sua expansão.

De minha parte, penso que o EI tem pretensões semelhantes às do nazismo de Hitler mutatis mutandis: hoje a Europa, amanhã o mundo sob o domínio de um Terceiro Reich destinado a durar mil anos.

Nesta entrevista, a própria Folha insere uma nota importante:

“O Estado Islâmico executou, entre sexta e sábado (23/8) ao menos 18 pessoas na Síria, a maioria por crucificação, após serem acusadas de colaborar com Damasco, informou o Observatório Sírio de Direitos Humanos”. (Folha de S.Paulo, 24/8)

Na realidade, isso é apenas uma pequena amostra do massacre de minorias étnicas, religiosas e de dissidentes que tem sido feito pelo EI.

Quanto à forma de execução, coisa não costumeira entre islamitas radicais, temos a impressão de que entramos no túnel do tempo e regressamos a uma época em que o Império Romano costumava crucificar cristãos e dissidentes do regime.

James_Foley_in_2011Entre outras atrocidades, os membros do EI decapitaram o jornalista americano James Foley. Maher dá sua interpretação do ato criminoso:

“Foi feito para chamar a atenção do mundo, e eles conseguiram. É essencial para uma chantagem contra o Presidente americano Barack Obama”.

E, em seguida, ele explica no que consiste essa chantagem…

“É algo poderoso porque eles têm outros reféns cuja vida dizem depender de Obama”.

Ora, por mais odioso que seja, isso não é novidade em grupos terroristas islâmicos com seu grande desprezo pela vida humana, tanto a dos outros quanto a sua própria, como evidenciam os atentados dos unabombers, encarados como “mártires do Islã”.

Quanto a esse horripilante modo de fazer propaganda política, Maher faz uma importante observação:

A Folha pergunta se a mídia social contribui para o recrutamento de membros do EI, tanto na região como no mundo inteiro, e Maher responde:

“Com certeza, a mídia social humaniza os combatentes”.

Como? Dizendo que o diabo não é tão feio quanto se pinta? Ou dizendo que eles estão lutando em nome de Deus (Allah) por uma causa nobre e justa? Maher especifica:

“Antes você lia sobre o Iêmen, mas não sabia muito. Agora esse jovem pode mandar mensagem de Manchester e pensar: ele é como eu. Isso é muito poderoso”.

Realmente, embora eles sejam hostis à civilização ocidental, eles empregam muito bem algumas tecnologias geradas no Ocidente, principalmente a internet, por meio da qual fazem propaganda do EI.

A esta altura, a Folha indaga se há uma forma possível de evitar o recrutamento de jovens para as hostes do EI e Shiraz Maher responde:

“É muito difícil porque não é ilegal pegar um avião para a Turquia. É muito difícil rastrear, move-se muito fácil com passaporte europeu”.

Para completar, Maher faz uma afirmação que vem ao encontro do que tínhamos afirmado no tocante à semelhança do novo califado e às do Terceiro Reich de Hitler…

“Os britânicos são parte de uma estratégia de ambição global do EI. Os europeus são importantes porque têm passaporte, podem se mover facilmente.”

E Maher fornece um exemplo de recrutamento de um jovem pacifista islâmico vivendo na Inglaterra.

“Vinha conversando com um [islamita] no ano passado desde fevereiro, ele parou de conversar comigo. Ele estudou na Queen’s University. Foi convencido a ir para a luta. Não era extremista, dizia que era terrível sequestrar, e lá se transformou em radical.”

Como vemos, a propaganda do EI produz fortes apelos não só em pessoas ignorantes dos povos do deserto como também em pessoas portadoras de nível superior de educação.

Como hoje sabemos, no estado maior da Al Kaeda de Bin Laden quase todos eram diplomados por universidades europeias e americanas. Mas tudo indica que os líderes do EI possuem pós-graduação até em atrocidades.

Finalmente, Shiraz Maher presta um depoimento importante a seu próprio respeito:

“Em 2001, eu era extremista, não terrorista, de um grupo chamado Hizb ut-Tahrir, em defesa de um Estado islâmico. Era um movimento global e político. Fiquei até 2005, e deixei porque vi que era perda de tempo.

No extremismo, é preto ou branco, não tem cinza. Mas o mundo tem muitas coisas cinzas”.

De fato, tanto na diplomacia quanto na política, uma das lições que se costumam aprender, como ossos do ofício, é que há muito mais de cinquenta tons de cinza…

[divide]

imagens: Gatestone Institute, Wikipédia

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Mario Guerreiro

Mario Guerreiro

Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor do Depto. de Filosofia da UFRJ. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Membro Fundador da Sociedade de Economia Personalista. Membro do Instituto Liberal do Rio de Janeiro e da Sociedade de Estudos Filosóficos e Interdisciplinares da UniverCidade.

Um comentário em “Estado Islâmico: um califado de mil anos?

  • Avatar
    28/08/2014 em 11:00 am
    Permalink

    As pessoas só veem o que é tangível. E é comum negligenciar o intangível, como neste caso. Reparem que se satisfazem unicamente em dar combate físico ao combatente radical, mas sequer perguntam de ondem vem as ideias que os alimentam e como combatê-las. O mundo todo está enredado em uma filosofia que prega que os interesses são irreconciliáveis e antagônicos; que o individuo tem interesses antagônicos a de seu semelhante; que uma cidade também com sua cidade vizinha; igualmente uma nação se vê inimiga de outra nação. Os EUA tem sido o campeão deste modo de ver e pensar. Não é de admirar que radicais surjam de todo lado e em profusão como cogumelos depois da chuva. Se rastrearmos estas ideias, este modo de pensar, esta filosofia,chegaremos na filosofia dominante que é o marxismo que prega o antagonismo e a irreconciliabilidade dos interesses entre indivíduos. Este modo de pensar leva à guerra, ao conflito e a destruição da sociedade sobre todos os pontos de vistas. E está em contradição com a realidade que é o contrário. A sociedade é a conciliação e harmonia de interesses entre indivíduos baseado na divisão de trabalho. Neste tocante, sociedade e mercado são sinônimos. O combate a este estado de coisa só terá sucesso não com uso exclusivo da força bélica, mas com a força das ideias corretamente entendida. Ideia baseada no capitalismo. Outra maneira não há e é vã esperança.

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