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Regulamentação da profissão de artista: a República das Guildas

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Estava marcado para ontem, mas foi retirado da pauta, parece que a pedido do Ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do processo (ADPF # 293) que questiona a constitucionalidade da “obrigatoriedade de diploma ou de certificado de capacitação para registro profissional no Ministério do Trabalho como condição para o exercício das profissões de artista e técnico em espetáculos de diversões.”

Resumidamente, a Procuradoria Geral da República (PGR), autora da ação, alega que são “flagrantemente incompatíveis com a liberdade de expressão da atividade artística, com a liberdade profissional e com o pleno exercício dos direitos culturais, porque em uma democracia constitucional não cabe ao Estado policiar a arte, nem existe justificativa legítima que ampare a imposição de requisitos de capacitação para o desempenho da profissão relacionada à arte cênica.”

A classe artística, liderada pelo Ministro da Cultura, está em polvorosa com a possibilidade de perder sua reserva de mercado. No último dia 06/04, o MinC divulgou nota afirmando que “O Ministério da Cultura defende o reconhecimento legal das profissões de artista, técnico de espetáculos e músico, fundamental para a consolidação da economia criativa no Brasil. A exigência de registro para o exercício profissional de atividades artísticas é importante não só para garantir a qualidade da produção mas, principalmente, permitir que os profissionais da cultura tenham seus direitos garantidos.”

Balela! Os artistas apenas defendem os privilégios de reserva de mercado, contra a concorrência de artistas não registrados na guilda, a exemplo de muitas outras entidades (ditas) profissionais. As guildas brasileiras são tão fortes e influentes que, recentemente, um atleta amador foi preso em flagrante, no estado do Mato Grosso, pelo prosaico crime de orientar um grupo de corrida de rua, sem diploma de Educação Física.

Na baixa Idade Média, recebiam o nome de  guildas  (ou  corporações de ofício) as associações formadas por profissionais, destinadas a proteger os seus interesses e manter os privilégios conquistados.

Os regulamentos das corporações se concentravam [pelo menos formalmente] em controlar a qualidade e a técnica da manufatura, e para manter o seu funcionamento, os trabalhadores associados eram obrigados a pagar uma determinada quantia regularmente. Havia um estatuto de técnicas a se utilizar e o trabalho era realizado em oficinas individuais, e caso houvesse um profissional que não estivesse ligado à sua respectiva corporação, este corria o risco de perder seu negócio e ser expulso da cidade. As guildas cobriam praticamente todas as atividades profissionais da época. Assim, havia guildas de alfaiates, sapateiros, ferreiros, artesãos, comerciantes, artistas plásticos entre várias outras.

Nada muito diferente, como se pode ver, dos famigerados conselhos profissionais que abundam em Pindorama, cujo objeto formal é a fiscalização das diversas atividades, com vista à manutenção da qualidade profissional e à proteção do consumidor. O problema é que essas modernas guildas, além de quase nada fiscalizar, funcionam, nitidamente, com o propósito principal de manter uma reserva de mercado para os seus integrantes, impedindo a concorrência de gente de fora. A coisa é tão absurda que a Câmara dos Deputados aprovou há pouco a regulamentação das profissões de (por favor, não riam) esteticista e cosmetólogos – cujas guildas já devem estar em pleno funcionamento.

A ideia das guildas, pelo menos no papel, é meritória: a defesa da qualidade dos serviços profissionais e dos interesses do consumidor (sempre ele!). Só que, como bem sabem os bons economistas, a melhor forma de defender os interesses dos consumidores é liberar ao máximo a concorrência, pois quanto maior a oferta de serviços, menor o preço e melhor a qualidade. Restringir a oferta de serviços profissionais, longe de facilitar a vida dos consumidores, principalmente dos mais pobres, acaba encarecendo os seus custos, muitas vezes inviabilizando a contratação.

Embora questionáveis, a existência de regulamentações rígidas e exigências formais para exercício profissional até se justificam quando se tratam de profissões altamente técnicas, em que eventuais erros podem causar danos à vida do consumidor ou terceiros.  Tais profissões, entretanto, se contam nos dedos de uma só mão – todas elas ligadas às áreas de medicina e engenharia.

Nada contra que entidades profissionais distribuam certificados de capacitação profissional, ou mesmo que realizem provas, como faz a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Mas que isso se restrinja apenas à certificação, a qual o profissional vai pendurar na parede junto com seu diploma de curso superior (se for o caso), para demonstrar ao cliente sua qualificação superior. Um “plus”, por assim dizer. Mas transformar certificados e burocracias várias em exigência legal para o exercício profissional, é um rematado absurdo.

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João Luiz Mauad

João Luiz Mauad

João Luiz Mauad é administrador de empresas formado pela FGV-RJ, profissional liberal (consultor de empresas) e diretor do Instituto Liberal. Escreve para vários periódicos como os jornais O Globo, Zero Hora e Gazeta do Povo.

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