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Quebrados! O Rei disse que o Rei está nu

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Em 2014, após vencer as eleições jurando de pés juntos que não havia problema fiscal no Brasil, Dilma reconhece que os gastos públicos são insustentáveis e começa com a sequência de tentativas de cortes de gastos. Ainda naquele ano, com Mantega na Fazenda, são apresentadas medidas para reduzir pensões e dificultar acesso ao seguro desemprego.
 
Em 2015, ciente de que cortar gastos não era o forte de Mantega, Dilma coloca Joaquim Levy na Fazenda para aprofundar os cortes de gastos. Ali, a outrora campeã da defesa de gastos reconhecia de forma inequívoca que a trajetória de gastos era insustentável. Sem conseguir fazer os cortes de gastos que desejava e às turras com a presidente e o PT, Levy sai do governo.
 
No lugar de Levy entra Nelson Barbosa. Meu colega de departamento e professor da FGV é uma referência entre economistas heterodoxos do país, inclusive entre os que negam a necessidade do ajuste fiscal. O contexto em que entrou no governo e o pouco tempo tornam difícil comentar a passagem de Nelson Barbosa no comando da economia, mas é fato que tomou medidas de ajuste fiscal e controle dos gastos. Uma delas foi adiar reajustes de servidores públicos. Lembro porque foi naquela época que consegui ser acusado pela mesma pessoa e na mesma semana de golpista e defensor do governo.
 
Dilma caiu e Temer tomou posse como presidente. Para a Fazenda foi Henrique Meirelles, famoso pelo excelente trabalho à frente do Banco Central na época de Lula. Meirelles seguiu a linha dos cortes de gastos. Uma de suas mais famosas medidas foi o Teto de Gastos que, apesar de ser acusado de causar uma crise que existia antes de ele ser criado, é um dos responsáveis pela queda de juros e inflação durante o governo Temer, quando a economia deixou de cair e começou a lenta recuperação. Meirelles saiu para se candidatar a presidente; no lugar dele ficou Eduardo Guardia, que seguiu as linhas de política econômica do antecessor.
 
Em 2019, foi a vez de Bolsonaro chegar ao Planalto e Paulo Guedes assumir o comando da economia. A necessidade de cortes de gastos foi reforçada pelo novo governo, que também apresentou medidas para contenção de despesas. Faço esse histórico para o leitor ter em mente que, desde o final de 2014, todos os presidentes, de Dilma a Bolsonaro, e todos os comandantes da área econômica do governo, de Mantega a Paulo Guedes, apontaram a necessidade de controlar gastos e/ou apresentaram medidas de ajuste fiscal. Todos, sem exceção.
 
Foi nesse estado que a pandemia nos pegou trazendo queda das receitas e aumento de gastos do governo. Para usar os termos da moda, pegamos Covid com várias comorbidades. Como de costume, Bolsonaro foi infeliz na escolha da hora e dos termos, mas, ao dizer que o Brasil está quebrado, apenas reforça o que já vinha sendo dito em declarações e ações de governantes e por ministros desde 2014. O Rei disse que o Rei está nu.
 
Porém, não se desespere, meu amigo, com os horrores que eu lhe digo: apesar de não ser apenas uma canção, como no caso do poeta, estarmos quebrados sem o presidente saber o que fazer não é o pior dos mundos. A considerar as propostas como as apresentadas por Ciro Gomes, um governo que não faz nada talvez seja uma benção.
Roberto Ellery

Roberto Ellery

Roberto Ellery, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), participa de debate sobre as formas de alterar o atual quadro de baixa taxa de investimento agregado no país e os efeitos em longo prazo das políticas de investimento.

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