A chave do poder está com a cúpula do Judiciário
O que ocorreu no domingo é grave, assim como outros tantos acintes de radicais bolsonaristas que merecem, sim, responder com todo o rigor da lei; mas não podemos permitir que isso ofusque outros acintes que ocorrem em paralelo. Sem que sequer alguém apresentasse pedido nesse sentido, o ministro do STF, Alexandre de Moraes, decidiu monocraticamente afastar um governador. Como tem ocorrido, a decisão foi depois referendada por maioria no plenário da corte. Há quem, cego pela gravidade dos atos de depredação, não enxergue o problema disso.
Como pode o povo ser convocado de tempos em tempos para ir às urnas, fazer sua escolha, e então, assistir, passivo, a um magistrado simplesmente decidindo, por conta própria, afastar do cargo quem nele chegou por processo do qual a própria lisura e legitimidade se gaba Moraes, aliás, presidente do TSE? De que valem os discursos proferidos e reverberados aos quatro ventos de respeito à democracia e ao voto popular, quando um burocrata de plantão pode afastar o chefe do Executivo de um ente federativo sem mais nem menos?
O pulo do gato é que na verdade “não pode”, assim como o TSE não poderia ter se autoconcedido o poder de censura, como o fez às vésperas das eleições – assistimos ali ao momento mais lamentável da carreira de Cármen Lúcia, quase pedindo desculpas por seu voto absurdo. Mas que diferença faz o que pode ou não pode, o que a Constituição diz ou deixa de dizer, em um país em que um ministro, com a cumplicidade vergonhosa de seus pares, reinventa ou inventa leis a cada dia? Talvez faça mais sentido nos livrarmos do teatro, da ilusão dos pesos e contrapesos, e entregar a chave do país para o STF de uma vez. Quem sabe, Moraes se autoconceda a presidência da República (Lula que tome cuidado). O “poder moderador”, defendido por diferentes hostes de radicais, ele já se concedeu faz tempo.