A fuga dos que produzem
O chamado “custo Brasil” nunca foi apenas um problema econômico, mas uma expressão de um Estado que se tornou imprevisível, voraz e hostil ao mérito. Trata-se de um conjunto de barreiras estruturais (tributárias, burocráticas e institucionais) que transformaram o ato de empreender em um exercício de resistência. O problema maior, porém, não está apenas na alta carga de impostos, mas na ausência de previsibilidade. O Brasil não cobra demais, ele muda as regras o tempo todo. Onde a lei é volúvel, o investimento é passageiro.
Em três décadas, o país produziu mais de quatrocentas mil normas tributárias, segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação. Nenhum outro Estado moderno revisa tantas vezes suas próprias leis. O empresário brasileiro não teme pagar tributos; teme acordar e descobrir que aquilo que era legal ontem se tornou passível de multa hoje. Vive sob um sistema em que o Legislativo multiplica impostos com novos nomes, o Executivo cria contribuições emergenciais que nunca expiram, e o Judiciário interpreta a Constituição conforme o humor das circunstâncias. A insegurança jurídica se tornou a mais cara de todas as tarifas.
O resultado é previsível: o capital foge. Segundo a Henley & Partners, mais de mil e duzentos milionários brasileiros devem deixar o país até o final de 2025, o que representa um aumento de cinquenta por cento em relação ao ano anterior. Levam consigo aproximadamente oito bilhões de dólares em patrimônio, mas o valor simbólico é ainda maior. É o capital que produz, emprega e inova dizendo ao Estado que já não confia em suas promessas. O Brasil não está perdendo apenas riqueza; está perdendo credibilidade.
O fenômeno, contudo, não se limita ao dinheiro. A insegurança jurídica também afasta cérebros, talentos e mentes criadoras. O pesquisador que depende de um edital que nunca é pago, o médico que enfrenta um sistema regulatório confuso, o profissional liberal que vive entre alvarás e interpretações contraditórias: todos compartilham a mesma sensação de impotência diante de um Estado que muda as regras a seu bel-prazer. O Brasil forma profissionais brilhantes, mas não oferece solo fértil para que floresçam. A fuga de cérebros, assim como a de capitais, é um gesto de autopreservação diante de um ambiente que pune o sucesso e premia a submissão.
O aumento de impostos aprofunda esse ciclo de desconfiança. O governo, incapaz de conter seus próprios gastos, insiste em tributar o patrimônio, o lucro, a herança e até o investimento produtivo. Cada nova proposta fiscal é apresentada como justiça social, mas, no fundo, é uma tentativa desesperada de financiar a própria ineficiência. O Estado não reduz despesas, apenas muda a forma de arrecadar. Essa espiral arrecadatória empurra os que produzem para fora e sufoca os que permanecem, corroendo a base produtiva que sustenta o país.
A consequência é um círculo vicioso. A saída de milionários e de profissionais qualificados reduz a arrecadação, o que leva o governo a criar ainda mais tributos para compensar as perdas, o que, por sua vez, incentiva novas fugas. O Estado se transforma em um Leviatã de olhos vendados, que atira em todas as direções para manter-se de pé, sem perceber que destrói justamente o alicerce que o sustenta. Nenhuma economia sobrevive quando quem produz riqueza é tratado como suspeito e quando a previsibilidade se torna um luxo.
O verdadeiro custo Brasil não está apenas no valor dos impostos, mas na imprevisibilidade de quem os cobra. Países com tributos altos, como Suíça ou Dinamarca, continuam prósperos porque respeitam o princípio fundamental da segurança jurídica. No Brasil, a tributação se tornou um instrumento de poder, não de gestão. Cada nova regra, medida provisória ou interpretação judicial adiciona uma camada de incerteza que faz o capital migrar para onde a lei é estável e a palavra do Estado tem valor.
A liberdade econômica, essência do progresso, exige confiança. Nenhum empresário investe onde o retorno depende da vontade de um burocrata, e nenhum talento permanece onde o esforço é punido pela imprevisibilidade. Se o país quiser reter seus melhores, precisará compreender que estabilidade jurídica é mais importante do que arrecadação momentânea. É preciso trocar o instinto de confiscar pelo compromisso de garantir.
O Brasil não precisa apenas de menos impostos, precisa de leis que valham amanhã. O desenvolvimento não é um decreto, é uma construção que nasce da confiança entre Estado e cidadão. Enquanto o governo enxergar o contribuinte como inimigo e o sucesso como privilégio, continuará exportando o que tem de mais valioso: seus empreendedores, seus talentos e o seu futuro. A segurança jurídica é o primeiro e último pilar de uma nação livre. Sem ela, toda prosperidade é apenas passageira.