Por que a unificação das eleições é uma péssima ideia?
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ) acaba de aprovar o texto-base de uma PEC que visa a acabar com o instituto da reeleição para os cargos do executivo. Esta, certamente é uma pauta louvável e, em momento mais oportuno, até penso em discorrer sobre o mal que a reeleição tem representado no Brasil; por ora, no entanto, eu gostaria de tratar de outro ponto que também está contido na proposta: a unificação das eleições. Pelo texto, a partir de 2034, passaríamos a ir às urnas a cada cinco anos em vez de dois.
Falemos antes das vantagens de uma possível unificação. Primeiro, teríamos uma redução dos custos, já que uma única eleição, com uma periodicidade mais longa, em tese, custaria menos do que o modelo atual. Há também a vantagem de que veríamos o fim do péssimo hábito de mandatários abandonarem o cargo pelo qual foram eleitos para concorrerem a outro (prefeitos deixando a administração municipal para concorrerem ao governo estadual ou legisladores abandonando o mandato na metade ao serem eleitos em alguma esfera do executivo). Por fim, estou certo de que muitos cidadãos veriam com bons olhos a possibilidade de não terem mais que lidar com o transtorno do período eleitoral a cada dois anos.
Em que pesem esses pontos positivos, penso que há desvantagens que os contrabalanceiam e justificam uma rejeição dessa parte do texto. Nas eleições federais/estaduais, nas quais votamos para presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual, já vemos um fenômeno desagradável, que é o fato de que muitos eleitores (talvez até a maioria) devotam toda sua atenção à presidência, no máximo ao governo estadual, negligenciando a escolha dos legisladores — em minha opinião, os votos mais importantes. O resultado disso é a escolha por mera indicação de amigos e parentes, por aparente proximidade do candidato com o preferido para presidente/governador, sem qualquer atenção às ideias ou à biografia; não faltam eleitores que decidem seus respectivos votos para senador e deputados no próprio dia das eleições. Agora, imaginem se adicionarmos a isso o voto a prefeito e vereador; o eleitor, já não habituado a ponderar com atenção seus votos, terá que escolher até nove candidatos (considerem que a renovação do Senado também seria unificada e, a partir de 2039, teríamos que escolher três senadores em cada eleição).
Se a predileção pela escolha do presidente já costuma dominar a atenção do eleitorado, também convém pensar que, especialmente em momentos de forte polarização, muitos acabariam escolhendo candidatos locais sem qualquer consideração fora o apadrinhamento por candidatos populares na esfera federal. Ora, não reclamamos, com frequência e com razão, da excessiva centralização em Brasília? Não advogamos que deveríamos rever o pacto federativo, dando maior autonomia aos estados e municípios? Pois essa proposta vai em sentido oposto. As eleições municipais serem separadas nos obriga, em tese, a olhar para a cena local, para a realidade mais imediatamente em nosso entorno, estando mais afastados daquelas paixões tão comumente afloradas durante o pleito federal/estadual. A unificação corroeria essa vantagem, submetendo a realidade local à política nacional.
Por fim, em que pese muitos considerarem uma “chatice” ter que ir periodicamente às urnas, isso tem um efeito pedagógico no espírito popular. Ora, se, mesmo votando a cada dois anos, negligenciamos, muitas vezes, a importância do voto popular e nos fazemos de desentendidos quando certos personagens da República usurpam as funções daqueles a quem legitimamente confiamos nosso voto (que deve ser entendido como uma procuração), expandir o intervalo das eleições poderia apequenar ainda mais nossa já minguada altivez popular e alienar nossa dita consciência cidadã. Ir às urnas é uma oportunidade para lembrar que o poder emana do povo, não só como abstração, mas na prática, já que não há Estado sem o suor do cidadão.
Não tratarei aqui da duração das propagandas eleitorais, para não me estender, mas basta dizer que, já considerando os atuais míseros 45 dias de campanha insuficientes para que o eleitor escolha seus candidatos com a calma e reflexão necessárias, uma eventual unificação necessariamente teria que vir acompanhada de um período mais longo de campanha.
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