“A Vida Intelectual”: o intelecto precisa de constância e de método
Antonin-Dalmace Sertillanges (1863-1948) foi um frade dominicano, filósofo e teólogo francês, notável por sua dedicação à filosofia tomista e por buscar integrar a vida espiritual e intelectual. Em A Vida Intelectual, ele não apenas descreve a importância do cultivo da mente, mas também apresenta práticas concretas, como a organização meticulosa do tempo para leituras, momentos de reflexão silenciosa e a escrita como exercício contínuo de clareza e memória. O autor sugere, por exemplo, que se leia pouco, mas com profundidade, selecionando obras de valor e anotando reflexões pessoais, de modo a transformar a leitura em verdadeira formação. Além disso, ressalta a necessidade de pausas para contemplação, sem as quais o conhecimento não se sedimenta. Trata-se de um guia que combina espiritualidade, método e disciplina, mantendo sua atualidade mesmo em sociedades contemporâneas marcadas pelo ritmo acelerado e pelo excesso de informações.
Resenha
A Vida Intelectual é um clássico sobre o cultivo de uma mente disciplinada. Sertillanges nos lembra que o intelecto precisa de constância e de método: organizar o tempo em blocos de estudo, ler com profundidade em vez de superficialidade e cultivar o hábito de escrever diariamente para ordenar os pensamentos. Esses conselhos ecoam em práticas que continuam essenciais para qualquer líder ou profissional que deseja pensar estrategicamente e evitar a dispersão.
No campo do liberalismo, a obra ganha grande valor ao enfatizar a autonomia intelectual e a responsabilidade do indivíduo em cultivar sua liberdade interior. A disciplina mental proposta reforça o ideal liberal de indivíduos capazes de pensar criticamente e agir de acordo com princípios éticos sem depender de tutela externa. Sertillanges nos recorda: “A vida intelectual é uma vida de ordem; sem ordem, não há progresso” (SERTILLANGES, 1921).
Esse mesmo espírito pode ser observado em figuras históricas como Winston Churchill, que conciliava suas funções políticas com longos períodos de leitura e escrita, ou em Thomas Jefferson, cuja robusta formação intelectual foi decisiva para sua liderança no campo político e filosófico. Ambos representam líderes que demonstraram, na prática, que pensamento e ação são inseparáveis.
A disciplina mental e a integridade intelectual defendidas por Sertillanges dialogam diretamente com outras obras já estudadas no IFL, como As Seis Disciplinas do Pensamento Estratégico de Michael D. Watkins, que também destaca a necessidade de visão clara, reflexão disciplinada e execução consistente. Assim, delineia-se um fio condutor entre leituras que comprovam como a formação intelectual está intrinsecamente ligada à boa liderança.
Do ponto de vista crítico, cabe questionar se o modelo de estudo proposto por Sertillanges é plenamente aplicável a contextos contemporâneos marcados pela velocidade tecnológica, pela multitarefa e pela comunicação digital em tempo real. O ideal de longas horas de leitura silenciosa e contemplação é nobre, mas pouco praticável na realidade atual de líderes e profissionais. Contudo, é justamente esse contraste que realça o valor do livro: ao desafiar o imediatismo e a superficialidade modernos, a obra se torna um convite a recuperar a profundidade em meio ao turbilhão de estímulos digitais.
Portanto, mais do que um manual de estudo, A Vida Intelectual é um chamado à responsabilidade intelectual e à liderança ética, mostrando que sem disciplina de pensamento não há verdadeira liberdade nem liderança duradoura.
Aplicação
A aplicação prática de A Vida Intelectual se manifesta na vida cotidiana de líderes e profissionais que desejam aliar clareza de pensamento à ação eficaz. O hábito de organizar o tempo, separar momentos de leitura, reflexão e escrita pode ser aplicado tanto ao ambiente empresarial quanto ao político. Líderes que dedicam parte de sua rotina a leituras críticas e ao planejamento de longo prazo tomam decisões mais consistentes do que aqueles que se deixam guiar apenas pelas urgências imediatas.
No campo do empreendedorismo, a disciplina intelectual favorece uma criatividade consistente: não a ideia passageira, mas aquela gestada ao longo do tempo, por meio da maturação reflexiva. No âmbito político, figuras como Abraham Lincoln, que conciliava o estudo do Direito com leituras filosóficas e históricas, ilustram como a preparação intelectual sólida é indispensável para enfrentar dilemas complexos.
Para o IFL, o livro de Sertillanges reforça a importância de formar lideranças capazes de unir excelência intelectual, liberdade de pensamento e responsabilidade ética. Ele nos recorda que o progresso profissional e social não nasce apenas de resultados imediatos, mas de uma mente disciplinada e íntegra, capaz de transformar princípios em ação e pensamento em legado.
*Victoria Duarte é jornalista formada pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) e pós-graduada em Marketing e Mídias Digitais pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Também é associada ao Instituto de Formação de Líderes de Brasília (IFL-BSB).