Sob a Constituição de 1988: quem foram os presidentes mais liberais do Brasil?
No meu último artigo, discuti uma questão frequentemente levantada: quem teria sido o presidente mais liberal da história do Brasil? Entre Campos Sales e Prudente de Morais, destaquei suas políticas econômicas como exemplos de liberalismo em um contexto histórico marcado pelo intervencionismo estatal. No entanto, ao nos voltarmos para o período posterior à Constituição de 1988, encontramos um cenário diferente, com novos desafios e um ambiente político e econômico mais complexo.
A partir daí, surge uma nova pergunta: quais presidentes, desde a redemocratização, seguiram princípios liberais em suas políticas econômicas? Neste artigo, vou explorar como Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer e, em menor medida, Jair Bolsonaro, adotaram elementos do liberalismo em seus governos, ao mesmo tempo em que enfrentaram obstáculos para implementar plenamente essa agenda.
Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), apesar de ser um acadêmico de tradição social-democrata, implementou diversas reformas econômicas que favoreciam o livre mercado. Entre suas principais iniciativas, estão a privatização de grandes estatais, como a Vale e as empresas de telecomunicações, e a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal, que buscava impor maior controle sobre os gastos públicos, reduzindo o intervencionismo estatal. As privatizações e a abertura econômica marcaram seu governo como um dos mais liberais no Brasil contemporâneo.
Michel Temer (2016-2018) também seguiu uma agenda de viés liberal, principalmente ao buscar reformas estruturais. Além da Reforma Trabalhista de 2017, que flexibilizou as relações de trabalho, sua gestão também foi marcada pela implantação do Teto de Gastos, uma medida essencial para conter a expansão dos gastos públicos, limitando o crescimento das despesas do governo. Isso trouxe maior previsibilidade econômica e uma tentativa clara de ajustar as contas públicas, consolidando o compromisso de Temer com uma política econômica liberal. Embora tenha tentado a Reforma da Previdência, seu curto mandato não permitiu a aprovação dessa importante medida.
Jair Bolsonaro (2019-2022) iniciou seu governo prometendo uma agenda fortemente liberal sob a liderança de Paulo Guedes. Além da aprovação da Reforma da Previdência em 2019, um marco importante de sua gestão foi a aprovação do Novo Marco Legal do Saneamento, que abriu o setor para maior participação privada, impulsionando investimentos e ampliando a concorrência no setor. Outro avanço significativo foi a conquista da autonomia do Banco Central, sancionada em 2021, que garantiu maior independência à instituição para conduzir a política monetária, uma demanda antiga do mercado financeiro e uma medida típica de uma política liberal. Contudo, a pandemia de Covid-19 forçou o governo a adotar medidas intervencionistas, como o auxílio emergencial e pacotes de estímulo fiscal, que comprometeram a agenda liberal de Guedes. Grande parte do impacto positivo das reformas acabou ofuscada pela necessidade de enfrentar uma crise global sem precedentes, o que fez com que o governo Bolsonaro não conseguisse ser tão liberal quanto inicialmente planejado.
No entanto, é importante notar que, mesmo com essas tentativas de implementar políticas de viés liberal, nenhum desses governos foi plenamente coerente com uma agenda liberal clássica. A resistência política, o peso das instituições e as crises econômicas e sociais forçaram a adoção de medidas intervencionistas em diversos momentos.
Portanto, Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer se destacam como os presidentes mais liberais no período pós-1988, com Bolsonaro também adotando uma agenda liberal, mas enfrentando obstáculos significativos, especialmente devido à pandemia e à resistência política, que impediram a execução completa de suas propostas.