O que os anarcocapitalistas realmente querem?
Quando ouvem a palavra “anarquismo”, a maioria das pessoas provavelmente pensa em extremistas de esquerda ou em teóricos como Mikhail Bakunin, rival de Karl Marx. No entanto, há uma tradição histórica do anarquismo que não tem ligação com o pensamento esquerdista ou anticapitalista e que, ao contrário, une o capitalismo puro na economia a uma liberdade completa em relação a qualquer forma de dominação.
O economista e filósofo americano Murray Rothbard, por exemplo, é um dos mais proeminentes defensores dessa perspectiva. O presidente argentino Javier Milei também se descreve como um “anarcocapitalista” e fez um discurso muito aclamado em Davos no início deste ano, declarando: “O Estado não é a solução. É o problema.” Um dos principais anarcocapitalistas alemães é o economista Antony Peter Mueller, que acaba de publicar um livro intitulado Anti-Politik.
Abordei esse livro com certo ceticismo, pois me considero um radical anti-utópico que questiona a eficácia de sistemas sociais construídos por intelectuais em suas torres de marfim. No entanto, a análise de Mueller acerta em muitos pontos: “o aparato estatal está consumindo uma quantidade cada vez maior de recursos, levando à exploração dos membros produtivos da sociedade. Isso, por sua vez, resulta em uma queda no desempenho econômico e em um aumento da agitação social. Cada vez mais pessoas estão rejeitando o governo, e cada vez menos estão dispostas a trabalhar para sustentar os outros … a solução não está em mais governo e mais política, mas sim em um governo menor e menos política.”
Nos últimos 15 anos, temos testemunhado praticamente em toda parte — na China, nos Estados Unidos, na América Latina e na Europa — como as forças de mercado estão sendo cada vez mais restringidas, enquanto a intervenção do governo na vida das pessoas, especialmente na economia, está em ascensão.
Segundo Mueller, o Estado intervencionista passou a controlar a economia. A política econômica do governo, em vez de resolver os problemas que diz combater, está, na verdade, agravando muitos deles. Em vez de estabilizar o ciclo econômico, como alegam os políticos e os bancos centrais, os efeitos dessa política estão enfraquecendo e desestabilizando a economia.
Mueller descreve como a propriedade privada dos meios de produção, embora tecnicamente ainda exista no papel, está sendo cada vez mais corroída e se tornando uma casca vazia, já que os proprietários não podem mais decidir o que fazer com seus bens e ativos. É o Estado que agora dita as decisões de produção, como quais carros as empresas devem fabricar e quais sistemas de aquecimento os proprietários devem instalar.
E qual solução Mueller propõe? A despolitização. Ele sugere que o sistema partidário é prejudicial e deveria ser substituído por assembleias selecionadas aleatoriamente. Com o tempo, segundo ele, a maioria — senão todas — as funções do Estado, inclusive as relacionadas à segurança, deveriam ser privatizadas. Ele afirma que o objetivo deve ser facilitar a convivência entre as pessoas, em grande parte sem a intervenção do Estado.
Meu problema com isso é que, embora tais conceitos possam ser formulados no papel, se você perguntar onde eles existem — ou já existiram — no mundo real, a resposta será a mesma que se obtém ao fazer essa pergunta à maioria dos marxistas: em lugar nenhum. No entanto, comparar a realidade a uma ideia ou visão desenvolvida em um livro é tão injusto quanto comparar um casamento real a um livro de romance. A história serve como um lembrete de que as tentativas de transformar visões utópicas de um mundo perfeito em realidade não melhoraram a vida das pessoas, mas frequentemente a transformaram em um inferno.
Em defesa de Mueller, no entanto, é importante destacar que ele se opõe firmemente a uma “abordagem radical para implementar o anarcocapitalismo de uma só vez”. Ele reconhece que essa é, de qualquer forma, uma opção totalmente irrealista. Em vez disso, ele vê essa ideia como um “objetivo”, e seu propósito é “conduzir a economia e a sociedade, tal como existem na realidade e no presente, em direção a uma maior liberdade econômica e pessoal”. A ideia do anarcocapitalismo serve a Mueller mais como uma estrutura de referência do que como uma ideologia rígida que deva ser implementada na realidade tal como foi concebida, sem modificações.
Mueller argumenta que é inútil especular sobre um mundo baseado em ideais libertários anarcocapitalistas — e, ainda assim, é exatamente isso que ele faz em algumas partes do livro. Mas concordo com ele plenamente quando escreve: “Nossas conclusões são duas: primeiro, a tese de que abordagens orientadas pelo mercado teriam levado a uma melhoria nos padrões de vida; segundo, os dados empíricos que mostram que economias e sociedades controladas pelo Estado não alcançaram o sucesso propagado por seus defensores.”
Embora as consequências do estabelecimento de uma ordem libertária fossem equivalentes a uma revolução, Mueller explica que não há nada de revolucionário no processo de criação dessa ordem. O caminho que ele descreve envolveria apenas um processo gradual de privatização. Começando pela venda de empresas semiestatais e serviços públicos, a privatização seria então ampliada para incluir a educação e a saúde e, por fim, os sistemas de segurança e justiça. “Nesse sentido, o anarcocapitalismo não será imposto, mas surgirá naturalmente à medida que as barreiras que dificultam seu desenvolvimento por meio da intervenção estatal e da política forem sendo removidas.”
O capitalismo puro não existe em nenhum lugar do mundo — e não é necessário para melhorar massivamente a vida das pessoas. Mesmo algumas gotas de capitalismo fazem uma enorme diferença: as reformas de economia de mercado introduzidas por Deng Xiaoping na China reduziram a proporção de chineses vivendo na extrema pobreza de 88% em 1981 para menos de 1% hoje. Da mesma forma, no Vietnã, que era o país mais pobre do mundo no início da década de 1990, o número de pessoas vivendo na extrema pobreza caiu de 80% para menos de 5%, tudo graças à introdução da propriedade privada e das reformas de economia de mercado.
A história é dinâmica, sem um estado final definitivo. Nem a liberdade nem a opressão são duradouras ou eternas. Na verdade, ao longo da história, testemunhamos uma batalha contínua entre as forças da liberdade e da falta de liberdade. Houve períodos, como nas décadas de 1980 e 1990, em que a liberdade econômica avançou significativamente graças a reformadores como Ronald Reagan, Maggie Thatcher, Leszek Balcerowicz e Deng Xiaoping, e outras fases — como a atual — em que a livre iniciativa está sendo restringida em escala global.
O mundo seria um lugar muito melhor se os governos voltassem a se concentrar naquilo que deveria ser sua responsabilidade central: garantir a segurança interna e externa e fornecer uma estrutura estável como Estado de Direito. Em vez disso, onde quer que olhemos, vemos que o Estado é forte demais onde deveria ser fraco, especialmente em áreas como regulação econômica e formação da opinião pública, e, como as prioridades do Estado se deslocaram para a redistribuição e o intervencionismo, ele se mostra fraco demais onde deveria ser forte e já não consegue sequer proteger suas próprias fronteiras.
Se o anarcocapitalismo é um ideal que serve para limitar a influência dos políticos e do Estado na economia e na vida intelectual, então deve ser valorizado. No entanto, se for apresentado como um plano para uma sociedade perfeita, devemos ser céticos, como em relação a todas as visões utópicas.