O espírito empreendedor em tempos de intervenção

Print Friendly, PDF & Email

Empreender é criar onde não há espaço, é afirmar a liberdade humana diante da inércia dos sistemas e da resistência dos que temem a mudança. O empreendedor é o arquiteto do improvável, aquele que enxerga o invisível e o transforma em valor. Sua essência não é técnica, mas moral. Ele acredita na possibilidade de agir, de transformar e de produzir sentido através da ação. Em ambientes livres, esse espírito floresce naturalmente; em ambientes controlados, ele se torna resistência. Em tempos de intervenção, empreender é mais do que inovar: é desafiar a lógica do conformismo.

Jean-Baptiste Say, o primeiro grande teórico do empreendedorismo, definiu o empreendedor como aquele que transfere recursos de áreas de baixa produtividade para áreas de maior produtividade. Em outras palavras, é o homem que organiza o caos e cria riqueza onde havia apenas potencial. Essa visão, profundamente moral, entende o empreendedor como mediador entre o possível e o real. O problema é que, em sociedades dominadas pelo Estado intervencionista, o empreendedor deixa de ser criador e passa a ser um sobrevivente. Ele já não luta apenas contra o mercado, mas contra a estrutura que o impede de existir plenamente.

Joseph Schumpeter via o empreendedor como o agente da destruição criadora, o impulso vital que rompe a estagnação e renova o capitalismo. Ele é o verdadeiro motor da história econômica. Mas Schumpeter também alertava que a própria prosperidade gerada pelo empreendedor cria as forças que o ameaçam. Quando o sucesso se institucionaliza, surgem as burocracias, os monopólios e os planejadores que acreditam poder substituir a liberdade criativa pela eficiência centralizada. Essa é a essência dos tempos de intervenção: a crença de que o progresso pode ser administrado. O empreendedor, nesse contexto, torna-se o último homem livre, o símbolo da individualidade que o sistema tenta domesticar.

Peter Drucker, o grande intérprete moderno da gestão, dizia que o empreendedorismo é a prática sistemática da inovação. Ele não é fruto do acaso, mas de disciplina, observação e propósito. O verdadeiro empreendedor não é o aventureiro inconsequente, mas o homem que identifica mudanças e as transforma em oportunidades. Drucker afirmava que toda sociedade precisa cultivar empreendedores não apenas para gerar riqueza, mas para manter viva a capacidade de adaptação. A intervenção estatal destrói essa elasticidade ao impor uniformidade e previsibilidade. Quando o governo pretende administrar a economia, ele também administra o futuro, e o futuro administrado é um futuro sem surpresa.

Howard Stevenson, professor de Harvard, definiu o empreendedor como aquele que busca controlar recursos sem necessariamente possuí-los. Essa ideia revela que o empreendedorismo é, acima de tudo, uma forma de liderança. O empreendedor não espera condições ideais; ele cria as condições de que precisa. Sua força é interior, não institucional. É exatamente por isso que ele sobrevive em ambientes hostis. O Estado pode regulamentar, tributar e restringir, mas não pode extinguir o impulso humano de criar. Mesmo sob o peso da burocracia, o espírito empreendedor encontra frestas de liberdade. Cada pequeno negócio aberto em meio à incerteza é um ato de coragem civilizacional.

Ludwig von Mises via no empreendedor o coração do processo de mercado. Ele é o responsável por ajustar a economia à realidade, um explorador de erros e oportunidades. Quando o Estado interfere, ele distorce os sinais de preços e confunde o cálculo econômico, criando uma névoa sobre o caminho do empreendedor. Mas o homem criativo não se deixa paralisar pela incerteza; ele a transforma em desafio. O lucro, nesse sentido, é apenas o reconhecimento de que se previu melhor do que os outros. É a recompensa pela coragem de agir em um mundo incerto. Por isso, quanto maior o intervencionismo, maior o valor moral do lucro. Ganhar torna-se sinônimo de resistir.

Deirdre McCloskey ampliou esse argumento ao mostrar que o florescimento econômico da modernidade dependeu não de capital ou de técnica, mas de uma mudança cultural: o respeito pelo empreendedor. O progresso nasceu quando a sociedade começou a admirar quem cria e não apenas quem governa. O Brasil, infelizmente, ainda não completou essa transição. Aqui, o empreendedor é tratado como culpado até provar sua inocência. Ele carrega o estigma do privilégio, quando, na verdade, é o real motor da prosperidade coletiva. A cultura intervencionista produz desconfiança, e a desconfiança gera paralisia. É preciso recuperar a dignidade do ato de empreender.

Ayn Rand, em A Revolta de Atlas, retratou o empreendedor como o herói moral da civilização, aquele que carrega o peso do mundo enquanto os demais vivem de suas criações. O Estado parasitário, incapaz de produzir, sobrevive explorando o talento dos que produzem. A autora descreveu com precisão o que ocorre quando a sociedade passa a punir o mérito: os criadores retiram-se, e a máquina do progresso entra em colapso. Sua alegoria não é ficção moralista, mas diagnóstico recorrente. Toda nação que transforma o empreendedor em vilão está condenada à estagnação, porque destrói sua fonte de vitalidade.

Napoleon Hill, por sua vez, tratou o empreendedorismo como força mental. Em Quem Pensa Enriquece, ele afirma que o sucesso é o resultado da crença inabalável no propósito e da persistência diante da adversidade. Essa dimensão psicológica do empreendedor é o que o distingue do conformista. O ambiente pode ser hostil, mas o espírito permanece fértil. O empreendedor é movido por uma energia interna que transcende o cálculo econômico: a necessidade de realização. Quando o Estado o impede de agir, ele improvisa; quando o sistema o ignora, ele se reinventa. Seu poder está em não depender da permissão alheia para existir.

William Baumol destacou outro aspecto essencial: o destino de uma sociedade depende do tipo de empreendedorismo que ela incentiva. Em ambientes livres, o empreendedor busca a inovação produtiva; em sociedades controladas, ele busca privilégios e licenças. A mesma energia criativa pode se tornar destrutiva se canalizada para o rentismo. Essa é a tragédia do intervencionismo: ele não mata o empreendedorismo, mas o desvia. O talento deixa de servir ao mercado e passa a servir à política. O empreendedor autêntico é obrigado a competir com o empresário de gabinete, aquele que prospera por influência, não por eficiência.

Em tempos de intervenção, portanto, o verdadeiro empreendedor é mais do que um agente econômico. Ele é uma força moral, um educador social, um lembrete de que o progresso nasce da liberdade e não da tutela. Cada empresa aberta sem incentivo estatal é uma declaração de independência. Cada inovação que sobrevive à burocracia é uma forma de resistência. O empreendedor não busca destruir o Estado, mas provar que a sociedade é capaz de funcionar apesar dele. Sua vitória é silenciosa, mas transformadora.

O espírito empreendedor é a manifestação mais pura da fé na liberdade humana. Ele é a recusa em aceitar que a história possa ser planejada por tecnocratas, que a criatividade precise de licença e que o mérito deva se curvar ao privilégio. Empreender, em tempos de intervenção, é um ato filosófico e espiritual. É a prova de que a chama da liberdade não se apaga mesmo quando o vento da opressão sopra mais forte. Enquanto houver um homem disposto a agir por conta própria, a criar com as próprias mãos e a sonhar sem autorização, haverá esperança de reconstrução. O Estado pode sufocar a economia, mas nunca conseguirá domesticar o espírito que a faz pulsar.

 

Faça uma doação para o Instituto Liberal. Realize um PIX com o valor que desejar. Você poderá copiar a chave PIX ou escanear o QR Code abaixo:

Copie a chave PIX do IL:

28.014.876/0001-06

Escaneie o QR Code abaixo:

João Loyola

João Loyola

Formado em administração pela PUC Minas e em Gestão de Seguros pela ENS, Pós-Graduado em Gestão Estratégia de Seguros pela ENS, é sócio sucessor da Atualiza Seguros, trabalha no programa Minas Livre para Crescer na Secretaria de Desenvolvimento Econômico de MG e é associado do IFL-BH.

Deixe uma resposta

Pular para o conteúdo