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O Brasil está longe de ter agências reguladoras independentes da politica, diz estudo da FGV

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Um estudo produzido pela Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas de São Paulo, coordenado por Bruno Salama e Arthur Barrionuevo, analisou a dinâmica de nomeações das agências reguladoras em nosso país. Segundo a teoria, elas deveriam ser técnicas, para preservar o caráter de independência necessário para sua boa atuação, evitando assim capturas políticas. Na prática, estamos longe desse ideal.

Primeiro, uma breve explanação sobre aquilo que deveríamos ter:

Os principais setores de infraestrutura do país estão sujeitos à ação das Agências Reguladoras. A lei determina que estas tenham independência hierárquica, decisória e técnica, e que a seus dirigentes seja atribuído mandato a termo fixo, tudo a fim de melhor implementar políticas permanentes de Estado. As leis instituidoras das Agências Reguladoras estabeleceram um procedimento particular de nomeação: indicação pelo chefe do Poder Executivo após aprovação pelo Legislativo. No caso das Agências Reguladoras federais, incumbe ao Senado Federal chancelar a escolha da pessoa indicada pelo Presidente da República para o cargo de Diretor ou Conselheiro.

Agora, um pouco sobre aquilo que efetivamente temos:

Este não é um caminho típico na burocracia brasileira. Em regra, as nomeações para os cargos comissionados se efetivam internamente, no âmbito do próprio Executivo, sem depender do crivo de algum dos outros Poderes. Não é qualquer cargo de nomeação política que requer aprovação do Senado. Na lista estão os cargos de diplomata, Presidente do Banco Central, Ministros dos Tribunais Superiores, Ministros do STF e do STJ e Procurador-Geral da República.

O estudo analisou 18 agências reguladoras, basicamente voltadas para o fundamental setor de infraestrutura. Seis são federais, o restante estadual. Agências cruciais, com excessivo poder para definir o futuro de seus setores, como ANAC, ANATEL, ANEEL, ANP E ANTAQ, fizeram parte da pesquisa. E os resultados estão longe de serem positivos. A começar pela transparência na hora de colher dados e informações:

Deve-se registrar que boa parte das solicitações de informações dirigidas às Agências Reguladoras, ao TCU, ao Ministério do Planejamento e à CGU não obteve resposta, ou recebeu resposta insatisfatória.

O grau de influência política, sem dúvida, é um dos maiores problemas nessas agências. Diz o estudo:

A disposição de partidos políticos por Agência Reguladora não segue um padrão. Há Agências em que há distribuição de nomeados filiados a diferentes partidos políticos, como a ANEEL. Outras, no entanto, têm um perfil partidário muito claro, como a ANP: durante o Governo FHC, os nomeados com filiação eram do PSDB, ao passo que no Governo Lula e Dilma os nomeados com filiação eram predominantemente do PC do B.

O motivo de preocupação é evidente, e destacado pelo estudo:

Um dirigente com filiação político-partidária dificilmente adotará uma postura diferente daquela esperada pelo partido político, a despeito de estudos técnicos, debates com atores do mercado regulado por meio de audiência e consultas públicas ou mesmo pela abertura ao diálogo no colegiado. Por outro lado, a submissão do nomeado ao ideário do partido político ao qual se filia pode ser uma condição para nomeação, seja na fase de indicação, seja na fase de aprovação no Senado. Toma-se, aqui, a ideia de que as nomeações são, via de regra, lastreadas em apoio de partidos políticos. Ainda, as consequências pela “rebeldia” em não seguir as diretrizes do partido político podem ser fatais à vida pública do nomeado, o qual simplesmente pode deixar de ser indicado para cargos de maior importância no futuro.

E eis o resultado de politização direta encontrado: Pela pesquisa do banco de dados disponibilizado pelo TSE, constatamos que 27% dos nomeados têm filiação político-partidária. […] Há dirigentes com filiação político-partidária em todas as Agências Reguladoras, sendo a ANP a Agência com maior incidência de filiados partidários em seu colegiado (37%). A ANTT é a segunda Agência com maior incidência de dirigentes filiados a partidos políticos (29%). ANAC e ANEEL contam, ambas, com 28% de dirigentes com filiação político-partidária. A ANATEL teve em seu Conselho 19% de dirigentes filiados. A ANTAQ é a Agência Reguladora com menor contingente de Diretores filiados (17%).

Para poupar o leitor dos detalhes, vamos direto para as considerações finais dos pesquisadores:

A pesquisa aponta problemas relacionados ao funcionamento das Agências Reguladoras. Dentre eles, devem ser sublinhados aqueles relacionados à vacância e à baixa previsão de impedimentos e de requisitos subjetivos para a escolha de dirigentes. Há também falta de publicidade nas deliberações e divulgação de dados oficiais, especialmente nas Agências estaduais. É importante que estudos futuros possam avaliar a relação entre o tipo de dirigentes nomeados e a atuação das Agências em suas diferentes dimensões, tema que não foi abordado no presente estudo.

Na conclusão para o resumo em inglês publicado pelos pesquisadores, a essência do problema fica ainda mais evidente (tradução livre):

A elaboração de um plano através da legislação é uma questão; implementá-lo é outra bem diferente. Como qualquer outra iniciativa legislativa que possa ser significativamente considerada “radical”, a criação de Agências Reguladoras Independentes (ARI) no Brasil evoluiu de forma diferente do plano original. De fato, talvez a característica definidora das ARIs brasileiras seja que seu regime legal ainda não está claro. O que se poderia chamar de institucionalização plena, no sentido de ter um conjunto legal e previsível de regras legais, ainda está faltando. E pelo que parece, a consolidação levará tempo.

Ou seja, ainda é preciso realizar novos estudos mais profundos sobre as agências, mas este já deixa claro que estamos longe do ideal traçado na teoria. Normalmente é assim mesmo: a teoria diz que não há diferença entre teoria e prática, mas na prática, há. A “captura” política das agências é uma realidade, e isso afeta o funcionamento dos setores e gera risco de corrupção.

É por isso que os liberais entendem que, se um estado empresário é algo totalmente condenável, um estado muito regulador não é tão melhor. A regulação deve ser clara e simples, a menor possível, transparente, conhecida por todos ex-ante, e o mercado deve funcionar da forma mais livre possível. Concentrar tanto poder nas agências reguladoras, mesmo com sua independência supostamente garantida, não é uma receita de sucesso.

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Rodrigo Constantino

Rodrigo Constantino

Presidente do Conselho do Instituto Liberal e membro-fundador do Instituto Millenium (IMIL). Rodrigo Constantino atua no setor financeiro desde 1997. Formado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), com MBA de Finanças pelo IBMEC. Constantino foi colunista da Veja e é colunista de importantes meios de comunicação brasileiros como os jornais “Valor Econômico” e “O Globo”. Conquistou o Prêmio Libertas no XXII Fórum da Liberdade, realizado em 2009. Tem vários livros publicados, entre eles: "Privatize Já!" e "Esquerda Caviar".

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