A crise climática como nova justificativa para a coerção estatal e o aumento de impostos

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A narrativa da crise climática se consolidou como uma das mais poderosas justificativas contemporâneas para a ampliação da coerção estatal e o aumento de impostos. Em nome da preservação ambiental e da chamada justiça climática, governos e organismos multilaterais vêm progressivamente assumindo funções que extrapolam a proteção da natureza e alcançam o controle direto da vida econômica, da produção e do consumo. O discurso da emergência planetária, ao mesmo tempo em que apela à consciência moral dos indivíduos, legitima o crescimento de uma estrutura burocrática global que busca regular, taxar e restringir a liberdade em nome de um bem comum que raramente se define de forma objetiva. Friedrich Hayek, em O Caminho da Servidão, já alertava que toda tentativa de centralizar decisões econômicas sob a alegação de fins nobres conduz inevitavelmente à perda da liberdade. Planejar a economia, dizia ele, é planejar as pessoas, e nenhuma autoridade que se pretenda capaz de conduzir um plano coletivo pode fazê-lo sem impor coerção.

Essa constatação se torna particularmente visível no contexto da COP 30, conferência do clima que será sediada em Belém do Pará em novembro de 2025. O evento é apresentado como símbolo de esperança e liderança global, mas, sob um olhar liberal, ele também representa a intensificação de um processo de centralização política e econômica sem precedentes. Sob o pretexto de fortalecer o multilateralismo climático e financiar a transição energética, discute-se a criação de novos mecanismos tributários, taxas de carbono, fundos de compensação e instrumentos de crédito verde que, na prática, ampliam a capacidade de arrecadação dos Estados e limitam a liberdade produtiva dos cidadãos. A proposta brasileira de mobilizar cerca de 1,3 trilhão de dólares anuais em financiamento climático até 2035 evidencia a escala do projeto e o potencial impacto fiscal que ele acarreta. Trata-se de uma engenharia financeira que, embora revestida de boas intenções, depende de novas formas de arrecadação e de maior intervenção estatal na economia.

Hayek antecipou com precisão o mecanismo moral que sustenta esse tipo de avanço autoritário. A servidão não nasce do desejo explícito de oprimir, mas da crença de que o bem coletivo exige obediência individual. Essa crença, quando transposta para o campo ambiental, cria o que se poderia chamar de “ecoestatismo”: um sistema em que a legitimidade do poder político se apoia no medo da catástrofe e na promessa de salvação climática. Assim como, no século XX, o socialismo científico invocava a justiça social para justificar o controle econômico, o ambientalismo tecnocrático do século XXI invoca a justiça climática para legitimar o mesmo controle, agora travestido de virtude moral. A consequência é semelhante à que Hayek denunciou: o indivíduo é reduzido a instrumento de um plano coletivo, e a liberdade econômica se torna uma variável subordinada à vontade política.

O aumento da carga tributária sob o pretexto ambiental é parte integrante dessa engrenagem. Em diversos países, a chamada “precificação do carbono” se transformou em um eufemismo para nova forma de tributação. Tarifas sobre combustíveis fósseis, ajustes de fronteira de carbono, impostos sobre emissões e taxas ambientais específicas compõem um sistema que se expande de forma quase invisível, mas constante. O objetivo declarado é corrigir externalidades negativas, mas o resultado concreto é o aumento do custo de vida e da dependência do cidadão em relação ao Estado. Frédéric Bastiat, em A Lei, descreveu esse fenômeno com precisão ao afirmar que, quando o Estado ultrapassa o papel de guardião dos direitos e se transforma em instrumento de redistribuição coercitiva, a espoliação torna-se legal. Sob essa ótica, o imposto verde é apenas a versão moderna da espoliação institucionalizada.

A COP 30 representa o ápice dessa lógica. Ao colocar o financiamento climático no centro do debate, a conferência propõe um modelo de governança global em que decisões econômicas passam a ser tomadas por organismos internacionais, muitas vezes distantes de qualquer controle democrático. A retórica da solidariedade planetária serve de cobertura para a criação de mecanismos vinculantes que afetarão diretamente o contribuinte comum. A promessa de um planeta mais sustentável se traduz, no plano prático, em mais tributos, mais regulamentações e menos autonomia. O Brasil, anfitrião do evento, já sinalizou sua intenção de propor novas regras para o comércio internacional e para investimentos ditos sustentáveis, que incluiriam não apenas critérios ambientais, mas também sociais e raciais. A ampliação desse escopo demonstra que o ambientalismo, em sua vertente institucional, tornou-se veículo para uma agenda política mais ampla de controle e redistribuição.

O filósofo francês Pascal Bruckner, em O Fanatismo do Apocalipse, analisa esse fenômeno como a transformação da ecologia em religião secular. O sentimento de culpa substitui a razão, e o sacrifício econômico passa a ser exaltado como virtude moral. O economista dinamarquês Bjørn Lomborg, em False Alarm, reforça a crítica ao demonstrar que o pânico climático custa trilhões, prejudica os mais pobres e falha em resolver o problema das emissões. Ambos convergem para a mesma conclusão de Hayek: a política movida pelo medo e pela moralização conduz à servidão. O medo da catástrofe climática legitima a ampliação do poder governamental, e a moralidade verde fornece o álibi para o aumento de impostos e restrições econômicas.

O impacto dessa tendência sobre a liberdade econômica é mensurável. Estudos do Fraser Institute e da Heritage Foundation demonstram que os países mais livres economicamente também são os que melhor preservam o meio ambiente. A explicação é simples: economias abertas estimulam inovação, eficiência energética e responsabilidade empresarial, enquanto economias controladas tendem à estagnação, ao desperdício e à corrupção. A competição, e não o decreto, é o verdadeiro motor da sustentabilidade. A coerção estatal, ao contrário, cria dependência de subsídios e reduz os incentivos à inovação. O liberalismo entende que o mercado, quando livre, corrige seus próprios excessos porque cada agente tem interesse em reduzir custos, otimizar recursos e atender à demanda do consumidor de forma eficiente.

O problema, portanto, não reside na preocupação ambiental, mas na instrumentalização dessa preocupação para justificar políticas de controle. A COP 30, embora revestida de discurso técnico e científico, é também um fórum político que consolida uma arquitetura de poder global. O risco é que, ao adotar metas e compromissos vinculantes, os Estados se vejam autorizados a ampliar impostos e regulações sem respaldo popular, sob a alegação de estarem apenas cumprindo obrigações internacionais. A sociedade civil, por sua vez, é persuadida a aceitar essas imposições como preço inevitável da salvação planetária. Assim, o medo da catástrofe substitui o debate racional e a liberdade cede lugar à obediência moral.

A verdadeira sustentabilidade não nasce da coerção, mas da liberdade. O ser humano, como argumenta Julian Simon em The Ultimate Resource, é o maior recurso do planeta, e sua criatividade é capaz de superar qualquer limitação material. Quando governos restringem a liberdade em nome de metas climáticas, sufocam a própria força inovadora que poderia resolver os desafios ambientais. É a liberdade, e não o planejamento central, que gera soluções tecnológicas, energias mais limpas e prosperidade. O liberalismo não nega o problema ambiental; apenas recusa a sua solução autoritária.

O século XXI assiste ao surgimento de uma nova forma de servidão, mais sutil e mais aceita: a servidão ecológica. Diferentemente da tirania explícita dos regimes totalitários do século XX, ela se apresenta como moralmente superior, adornada com a linguagem da ciência e da solidariedade global. Mas, no fundo, ela conserva o mesmo vício: a concentração do poder e a redução da liberdade individual. Quando impostos, regulações e burocracias passam a ser justificados por uma causa inquestionável, a cidadania é substituída pela sujeição. Hayek advertiu que o caminho da servidão é pavimentado por boas intenções. A crise climática, se tratada como dogma e não como desafio técnico, pode muito bem ser a estrada verde que leva a esse destino.

Em última instância, proteger o meio ambiente é um dever ético e civilizatório, mas fazê-lo à custa da liberdade é uma contradição fatal. A prosperidade e a sustentabilidade exigem instituições livres, mercados abertos, propriedade privada e responsabilidade individual. Quando o Estado se coloca como salvador do planeta, ele se torna também o carcereiro das vontades humanas. A COP 30, com toda sua pompa e retórica, será um marco simbólico desse embate entre liberdade e tutela, entre mercado e planejamento, entre inovação e coerção. O verdadeiro desafio do nosso tempo não é apenas reduzir emissões, mas impedir que o medo climático seja usado para resfriar as liberdades, pois um mundo sustentável só o será se também for livre.

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João Loyola

João Loyola

Formado em administração pela PUC Minas e em Gestão de Seguros pela ENS, Pós-Graduado em Gestão Estratégia de Seguros pela ENS, é sócio sucessor da Atualiza Seguros, trabalha no programa Minas Livre para Crescer na Secretaria de Desenvolvimento Econômico de MG e é associado do IFL-BH.

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