Por que só o capitalismo permite o verdadeiro cálculo econômico?

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O problema do cálculo econômico sob o socialismo é um dos pontos mais decisivos para compreender porque sistemas centralmente planejados tendem, invariavelmente, ao fracasso. Ludwig von Mises, em seu famoso ensaio de 1920, mostrou que, na ausência de preços formados em mercado pela interação livre entre oferta e demanda, não há como determinar racionalmente a alocação de recursos escassos. Os preços são mais do que números: são sinais de informação condensada sobre preferências, custos, alternativas e usos possíveis. Quando o Estado assume o controle absoluto dos meios de produção, esses sinais desaparecem, substituídos por planilhas artificiais de metas e cotas, incapazes de refletir a realidade viva das trocas humanas.

Essa falha estrutural se manifesta de maneira concreta na ausência de personalização e de atendimento ao consumidor. Em sistemas socialistas, os indivíduos deixam de ser clientes com preferências únicas e se tornam “usuários” indistintos de um serviço padronizado, fruto da homogeneização do planejamento estatal. O consumidor não dita mais o que deve ser produzido, mas deve se adaptar ao que o plano estatal determinou. A padronização burocrática destrói não apenas a eficiência, mas também a qualidade da experiência humana de consumir. O resultado é a escassez, a má qualidade e a falta de inovação, como ficou evidente nas longas filas para comprar pão na União Soviética ou na monotonia de produtos de Cuba, todos uniformizados e sem diversidade.

Mises não se limitou a demonstrar a inviabilidade matemática do cálculo econômico sem preços de mercado, mas antecipou que tal falha levaria ao caos administrativo. Nos arquivos da antiga URSS, há registros de fábricas que cumpriam metas em toneladas de aço sem que isso correspondesse a trilhos utilizáveis para ferrovias ou chapas adequadas para a indústria naval. O cumprimento do plano substituía a lógica da utilidade, e assim toneladas de produtos se acumulavam sem função real. Esse exemplo prático ilustra a crítica misesiana: sem cálculo econômico, não há coordenação eficiente dos meios com os fins.

Hayek complementa essa visão ao destacar que a informação econômica não é apenas numérica, mas contextual e dispersa, existente na mente dos indivíduos. Uma dona de casa que escolhe um sabão em pó pelo custo-benefício, um pequeno comerciante que ajusta seus horários de abertura segundo a clientela do bairro ou um agricultor que decide plantar mais milho após observar o aumento da demanda local — todos esses agentes detêm conhecimentos que nunca poderiam ser centralizados por um comitê. No socialismo, ao tentar transformar essa diversidade de informações em um único plano estatal, o resultado é um sistema cego, incapaz de reagir com a mesma velocidade e precisão do mercado.

Ao se observar a experiência cubana, nota-se que a ausência de cálculo econômico resultou em décadas de estagnação. Enquanto, em países de economia mista ou capitalista, o setor agrícola multiplicava a variedade e a produtividade, em Cuba, o racionamento de alimentos se tornou regra, com cartilhas mensais determinando o que cada família podia consumir. A padronização não se restringe ao que falta; atinge também a uniformidade daquilo que sobra. Não há concorrência que estimule inovação, e a personalização do atendimento inexiste, porque todos recebem o mesmo produto ou serviço.

No contraponto capitalista, a inovação e a personalização tornam-se não apenas possíveis, mas necessárias. Amazon, Netflix e mesmo bancos digitais brasileiros como Nubank só existem porque o sistema de preços e a concorrência exigem cada vez mais adequação ao gosto individual. A personalização de algoritmos de recomendação é, no fundo, um refinamento da lógica do cálculo econômico: usar preços, preferências e padrões de consumo para ofertar aquilo que o cliente de fato deseja. Essa dinâmica é inconcebível em um ambiente socialista, em que os indivíduos são reduzidos a categorias estatísticas.

Dados históricos reforçam os ganhos do sistema capitalista. O Banco Mundial mostra que, entre 1990 e 2019, a pobreza extrema caiu de mais de 35% da população mundial para menos de 10%, resultado diretamente associado ao crescimento de economias que se abriram ao comércio e ao investimento privado. Na mesma linha, índices como o Global Innovation Index revelam que os países que lideram em inovação (Suíça, Estados Unidos, Suécia) são justamente aqueles em que o mercado tem espaço para funcionar e onde a livre concorrência permite a rápida difusão de novas tecnologias. Essa relação entre liberdade econômica e prosperidade reforça o argumento liberal de que o capitalismo não é apenas mais eficiente, mas também mais capaz de melhorar vidas em escala massiva.

É verdade que o capitalismo produz desigualdades, mas aqui se impõe uma ponderação necessária: desigualdade não é sinônimo de pobreza. Ao contrário, em sistemas dinâmicos, a concorrência cria diferenciais de renda ao mesmo tempo em que eleva a linha de base do bem-estar. Isso explica por que sociedades capitalistas, mesmo com diferenças internas, apresentam níveis de vida médios muito mais elevados do que países socialistas. O consumidor pobre em uma economia de mercado ainda encontra variedade de produtos básicos e serviços acessíveis que seriam impensáveis em um regime de planificação central.

O cálculo econômico, portanto, não é apenas um conceito abstrato. Ele traduz a essência da liberdade humana na esfera econômica: a possibilidade de escolher, comparar e preferir. Sua ausência sob o socialismo corrói a individualidade, padroniza a vida social e perpetua erros produtivos. Sua presença no capitalismo gera inovação, diversidade, crescimento e respeito às preferências pessoais. É nesse contraste que reside a crítica liberal mais forte: onde o socialismo vê números a serem administrados, o capitalismo enxerga pessoas a serem atendidas.

Assim, o debate sobre o cálculo econômico sob o socialismo não é apenas uma questão teórica, mas um diagnóstico prático das razões pelas quais experiências coletivistas fracassaram ao longo da história. A ausência de preços de mercado destrói a possibilidade de escolhas racionais, e a ausência de escolhas racionais destrói a liberdade individual. O capitalismo, com todas as suas imperfeições, é o único sistema que garante tanto prosperidade material quanto espaço para a diversidade e a personalização, reconhecendo que cada consumidor é, em última instância, um indivíduo que deve ser atendido e respeitado.

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João Loyola

João Loyola

Formado em administração pela PUC Minas e em Gestão de Seguros pela ENS, Pós-Graduado em Gestão Estratégia de Seguros pela ENS, é sócio sucessor da Atualiza Seguros, trabalha no programa Minas Livre para Crescer na Secretaria de Desenvolvimento Econômico de MG e é associado do IFL-BH.

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