Doing Business 2019: melhorou, mas nosso ambiente de negócios continua ruim

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Nesta semana tivemos a boa notícia de que o Brasil melhorou de posição no ranking de facilidade de fazer negócios elaborado pelo Banco Mundial (link aqui), conhecido como Doing Business (link aqui). Quem acompanha o blog sabe que considero o ambiente hostil aos negócios um dos maiores problemas de nossa economia. Isso é verdade porque um ambiente desfavorável aos negócios penaliza empresas menores e/ou que tentam entrar no mercado. Na prática, o ambiente de negócios acaba funcionando como uma barreira à entrada que protege empresas estabelecidas que já pagaram os custos fixos associados ao ambiente de negócios ruim da concorrência das empresas que seriam viabilizadas em um bom ambiente de negócios. Melhorar o ambiente de negócios significa facilitar a entrada de novas empresas no mercado, o que aumenta a competição e estimula a produtividade.

Apesar da melhora, ainda há muito a ser feito para melhorar o ambiente de negócios no Brasil. Neste post, comparo nossa classificação geral e nos vários indicadores que compõem a nota geral com a pontuação dos países do grupo de renda média alta, nosso grupo de comparação segundo o Banco Mundial. A figura abaixo resume a análise que segue e mostra as notas do Brasil no índice de facilidade de fazer negócios e nos diversos indicadores usados para construção do índice. Em vermelho estão os indicadores onde a nota do Brasil ficou abaixo da nota média dos países de renda média alta, em azul os indicadores em que nossa nota ficou acima da média.
Na classificação geral ficamos na 109º posição com um total de 60,01 pontos. Nossa pontuação ficou um pouco abaixo da média (63,57) e da mediana (63,59) do grupo; não é de todo ruim, mas também não é bom. A figura abaixo mostra a pontuação (nas barras) e a classificação (número ao lado da barra) e cada país do grupo de renda média alta. Estamos logo abaixo da Namíbia e acima do Paraguai.
Por interessante que seja, o índice geral não permite observar as razões que determinam o desempenho de cada país. Para resolver esse problema é necessário analisar os indicadores específicos de cada grande grupo: começar um negócio, permissões para construções, acesso à eletricidade, registro de propriedade, acesso ao crédito, proteção a investidores minoritários, pagamento de tributos, comércio internacional, impor contatos e solução de falências. Cada um desses indicadores pode ser decomposto em indicadores ainda mais específicos. Não analisarei essa decomposição mais fina nesse post para não forçar a paciência do leitor com muitos detalhes.
O primeiro indicador a ser analisado diz respeito à facilidade de começar um negócio. Quanto mais fácil for começar um negócio, mais ideias se transformam em empresas que podem introduzir novas tecnologias no mercado e trazer competição para empresas estabelecidas. Nesse indicador nossa pontuação foi de 80,23. Ficamos entre África do Sul e Costa Rica. A média do grupo foi de 82,36 e a mediana foi de 85,38, ou seja, estamos abaixo da média e é mais difícil começar uma empresa por aqui do que em mais da metade dos países de renda média alta. A figura abaixo mostra a pontuação e a classificação no ranking geral de todos os países do grupo:

O próximo indicador mede a burocracia necessária para construir. Nesse quesito ficamos em último lugar entre os países avaliados. Nossa pontuação foi de 49,86 contra uma média de 68,67 no grupo. É mais difícil conseguir permissão para construir no Brasil do que na Venezuela. Na prática, essa dificuldade age como barreira à entrada na medida em que dificulta a construção de novas plantas. A figura abaixo mostra esse indicador para os países do grupo. É importante registrar que melhorar esse indicador envolve mudanças na burocracia, o que pode impor um significativo custo político por ir contra grupos de interesse estabelecidos, mas não exige grandes custos financeiros. Um esforço para facilitar as construções também pode estimular a construção civil sem ter de apelar para incentivos de crédito ou fiscais.

 

No indicador de acesso à eletricidade, tivemos um bom desempenho. Nossa nota foi 84,37 contra uma média de 72,22 e uma mediana de 71,22. De fato ficamos em nono lugar nesse quesito entre todos os países do grupo e dentre os países da América Latina e Caribe ficamos atrás apenas da Costa Rica. A figura abaixo mostra esse indicador:
O quarto indicador mede a facilidade de registrar propriedades. A nota do Brasil foi 51,94 contra um média de 63,71 e uma mediana de 65,43. Ficamos logo abaixo de Belize e logo acima da Venezuela. Não estou enganado, olhei de novo para ter certeza: registrar uma propriedade no Brasil é quase tão difícil quanto na terra do Maduro. Mais uma vez temos um desempenho ruim em um quesito que envolve burocracia.  A figura abaixo mostra o desempenho dos países de renda média em relação à facilidade de registrar propriedades:
A nota do Brasil no quesito acesso ao crédito foi 50. A média do grupo nesse indicador foi 56,12 e a mediana 60,00. Mais uma vez ficamos na parte de baixo. Antes que alguém se anime e comece a pedir queda nos juros, informo que esse quesito está ligado a questões institucionais como proteção a direitos e registros de crédito e não a indicadores de volume de crédito e coisas do tipo; mais uma vez, é a burocracia que dificulta a vida dos empreendedores no Brasil.

Na proteção a investidores minoritários o Brasil teve um bom desempenho: ficou com nota 65,00 contra uma média de 54,51 e uma mediana de 55,00. Dentre os países de renda média alta da América Latina e Caribe, apenas a Colômbia teve um desempenho melhor que o do Brasil. A proteção a investidores minoritários é importante para atrair financiadores dispostos a apostar em negócios promissores. A figura abaixo mostra esse indicador.

Facilidade em pagar tributos é um quesito em que o Brasil costuma se destacar negativamente. Não se trata do tempo para conseguir o dinheiro e sim do tempo para preencher a papelada. No Brasil uma empresa precisava dedicar cerca de 2.600 horas para conseguir pagar tributos; o segundo pior desempenho nesse quesito era da Bolívia com 1.025 horas, menos da metade do Brasil. Este ano, o tempo gasto com papelada para pagar tributos no Brasil caiu para 1;958 horas, um valor ainda absurdamente alto. Considerando o indicador como um todo, o desempenho do Brasil também é muito ruim: nossa nota foi 34,40 contra uma média 68,09 e uma mediana de 76,14 dos países de renda média alta. De fato, apenas a Venezuela, com 15,35, teve um desempenho pior que o Brasil nesse indicador. Não há razão aceitável para justificar a dificuldade para pagar impostos no Brasil. Não bastasse a carga tributária ser alta para um país emergente ainda criamos dificuldades desnecessárias para que empresas fiquem em dia com fisco. A figura abaixo mostra esse indicador:

Muito se fala nas barreiras tarifarias que tornam o Brasil uma economia excessivamente fechada; já tratei do assunto (link aqui) em um post onde mostrei que nossas tarifas são mais altas que a do grupo de países de renda média alta e comparáveis às de países pobres. Para além da tarifa, a dificuldade de fazer comércio também pode explicar o isolamento econômico brasileiro. Nossa nota no quesito comércio internacional foi 69,85 contra uma média de 71,93 e uma mediana de 74,26 no grupo de países de renda média alta. Não é o horror do tempo de pagar tributos e do registro de propriedades, mas é um desempenho que nos coloca na parte de baixo da distribuição. A figura abaixo ilustra esse indicador:

Para fazer valer contratos estamos na parte de cima da distribuição, nossa nota foi 66,00 contra uma média de 58,37 e uma mediana de 58,59 no grupo de países. Considerando os países da América Latina e Caribe que estão no grupo de comparação, apenas o México tem um desempenho melhor que o nosso. A figura abaixo ilustra esse indicador:

O último indicador trata da solução de falências. Por certo ninguém abre um negócio pensando em ir à falência, mas essa é uma realidade que não pode ser esquecida. Facilitar processos de falência é importante para incentivar a criação de novas empresas e para permitir a realocação de fatores alocados em empresas que deram errado. Nossa nota nesse item foi 48,48, o que nos deixa um pouco acima da média dos países do grupo que foram avaliados nesse quesito, 47,44, e acima da mediana, 45,93. A figura abaixo ilustra o indicador.

Em resumo: o Brasil obteve nota inferior à média do grupo de países de renda média alta no indicador geral de facilidade de fazer negócios e nos indicadores que medem a facilidade para começar um negócio, fazer comércio internacional, registrar propriedades, acessar crédito, obter permissão para construir e pagar tributos. Ficamos acima da média nos quesitos: acesso a eletricidade, fazer valer contratos, proteção a investidores minoritários e solução de falências. Não é um bom desempenho. Temos muito a melhorar se quisermos um ambiente de negócios saudável e capaz de permitir o nascimento e crescimento de novas empresas que trarão inovações e, por meio da competição, vão induzir as empresas estabelecidas a adotar tecnologias mais modernas e usar de maneira mais eficiente as tecnologias existentes. Um dos grandes desafios para melhorar nosso ambiente de negócios é enfrentar grupos de interesse formados pela burocracia estatal e por empresas estabelecidas no mercado.

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Roberto Ellery

Roberto Ellery

Roberto Ellery, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), participa de debate sobre as formas de alterar o atual quadro de baixa taxa de investimento agregado no país e os efeitos em longo prazo das políticas de investimento.

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