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A dívida pública no Brasil e em países emergentes

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No passado, fiz vários artigos comparando a dívida pública como proporção do PIB no Brasil com a mesma proporção observada em outros países emergentes. A intenção era colocar água no chopp de quem estava comemorando algum indicador como sinal de que não tínhamos um problema fiscal. Sim, sou chato e nunca neguei. De uns tempos para cá, vejo que está ganhando força aquela perigosa sensação de que o lado fiscal está deixando de ser um problema; não está, e, para colocar água no chopp de quem está comemorando, voltei com um artigo comparando a dívida pública do Brasil com a de outros países emergentes.
Começo com a versão atualizada de um gráfico que consta em outros artigos em várias apresentações que fiz para mostrar que a dívida pública do Brasil é alta quando comparada à de países emergentes. A figura abaixo mostra o PIB per capita (corrigido por PPC) e a dívida pública como proporção do PIB em países emergentes da Europa, emergentes da Ásia, da Comunidade Estados Independentes e da América Latina em Caribe. Estão listados 44 países. Foram excluídos os países com menos de cinco milhões de habitantes e, por óbvio, os que não tinham dados disponíveis.

Dos 44 países, apenas no Sri Lanka e no Laos a dívida pública é maior como proporção do PIB do que no Brasil. Em 2021, a média das dívidas como proporção do PIB nos países da amostra foi de 53,6%, a mediana foi de 50,3%, no Brasil foi de 93%. Alguém pode dizer que o grupo de comparação para o Brasil deveria ser o dos países ricos, onde a dívida pública costuma ser muito maior como proporção do PIB. Não creio que seja o caso. Não somos um país rico, nem chegamos perto; repare que nosso PIB per capita está no “meião” da turma dos emergentes.

Se nossa dívida é tão alta, de onde vem a ideia de que o problema fiscal está sendo resolvido? A dívida como proporção do PIB caiu? Seria razoável observar uma queda da dívida, afinal, em 2020, o PIB teve uma queda histórica e os gastos foram para o espaço por conta da pandemia. De fato, em 2020, a dívida como proporção do PIB foi maior do que em 2019 para todos os países da amostra com exceção do Haiti e do Turcomenistão. Em 2021, houve queda de dívida como proporção do PIB em 20 dos 44 países da amostra. O Brasil é um dos vinte.

Essa queda talvez seja a razão da sensação de que o problema fiscal está controlado. O problema é que 2020 está longe de ser um bom ano de referência. Se considerarmos a dívida como proporção do PIB em 2019, quando o atual governo reconhecia a existência de um grave problema fiscal, tão grave que motivou envio de PECs para tratar de emergência fiscal, a dívida como proporção do PIB aumentou de 87,9% para 93%. Entendo que a queda, que continua em 2022, dê uma sensação de alívio, mas é preciso lembrar que, assim como a disparada em 2020, quando a dívida chegou a 98,7% do PIB, a queda atual deve ser vista no contexto da pandemia.

A figura abaixo mostra a variação da dívida como proporção do PIB e do PIB per apita (o PIB ficaria melhor, mas eu já tinha pego o PIB per capita para a primeira figura…) entre 2019 e 2021. Apenas cinco países da amostra tiveram queda na dívida como proporção do PIB (Vietnam, Ucrânia, Haiti, Turcomenistão e Argentina). Em todos os outros, a dívida foi maior em relação ao PIB em 2021 do que em 2019. O Brasil fica bem no quadro, com um crescimento do PIB próximo da mediana (linha pontilhada vertical). Ficamos com a sétima posição no quesito menor crescimento da dívida como proporção do PIB.

O problema, sempre tem um, é que o segundo melhor no ranking é a Argentina! Como pode? Um possível candidato para explicar o bom desempenho da Argentina é a inflação descontrolada por lá. Se isso for verdade, a inflação de mais de 10% em 2021 pode explicar também nossa boa posição, afinal, nossa inflação em 2021 foi a oitava maior na lista de 44 países.

Estabelecer causalidade em macroeconomia é tarefa de gincana, e das difíceis. Não vou tentar fazer isso em um único artigo. Apenas como curiosidade, mais para provocação, fiz uma regressão entre a variação na dívida como proporção do PIB e o logaritmo da inflação em 2021. Deu uma relação negativa e significativa, ou seja, quanto maior a inflação, menor a variação da dívida como proporção do PIB. A figura abaixo mostra a regressão.

Isso significa que nosso bom desempenho, no sentido de pequena variação da dívida como proporção do PIB, é por conta da inflação? Não. Como disse acima, estabelecer causalidade em macroeconomia é complicado. Além do mais, quem chegou até aqui já deve estar cansado de saber que correlação não implica causalidade. Teoricamente a inflação pode ser o motivo da pequena variação da dívida como proporção do PIB no Brasil, afinal, com inflação alta, é mais fácil controlar o gasto para que cresça menos do que a receita. Isso não é suficiente para estabelecer a causalidade, mas a justificativa teórica, somada à correlação da figura acima, são boas para colocar lenha na fogueira. O objetivo do artigo não foi colocar água no chopp, mas uma lenha na fogueira, ainda mais em ano eleitoral – é oportunidade que não posso deixar passar.

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Roberto Ellery

Roberto Ellery

Roberto Ellery, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), participa de debate sobre as formas de alterar o atual quadro de baixa taxa de investimento agregado no país e os efeitos em longo prazo das políticas de investimento.

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