Os Pais da América e o Brasil de hoje

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Os Federalist Papers, uma série de ensaios escritos por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay, foram essenciais para a criação e ratificação da Constituição dos Estados Unidos, que, vale lembrar, jamais precisou ser substituída e conta com apenas 27 emendas desde 1789. Enquanto isso, o Brasil encontra-se em sua sétima Constituição, e a atual já acumula 136 emendas desde 1988, o que revela um cenário de instabilidade normativa e política. Essa diferença estrutural se explica, em grande parte, porque os fundadores americanos promoveram os ideais do liberalismo: liberdade individual, proteção da propriedade privada e limitação efetiva do poder governamental.

Os ensaios defenderam um governo central forte, porém limitado, cuja função principal seria proteger a liberdade dos cidadãos e assegurar a estabilidade necessária ao florescimento econômico e social. A criação de um sistema robusto de freios e contrapesos visava a evitar a tirania e impedir que qualquer ramo do governo ultrapassasse seus limites, o que permitiria uma sociedade liberal na qual a democracia depende da participação ativa e informada dos indivíduos. Além disso, o modelo norte-americano oferece mecanismos institucionais capazes de resguardar o povo do eventual surgimento de líderes com tendências autocráticas.

Quando observamos o Brasil por meio das lentes propostas pelos fundadores da América, torna-se evidente a existência de múltiplas barreiras à nossa prosperidade, em contraste nítido com os princípios defendidos nos Federalist Papers. A instabilidade política, muitas vezes resultado da fragmentação partidária e de um conjunto de ideologias dispersas frequentemente desvinculadas de uma agenda liberal clara, compromete o desenvolvimento do país. A corrupção, que fere diretamente o liberalismo ao distorcer mercados e minar a confiança pública, continua sendo um dos maiores entraves ao progresso nacional. Não por acaso, cresce a percepção de que “o país não tem jeito” ou de que o sucesso empresarial só pode ocorrer mediante apadrinhamento político.

Casos emblemáticos reforçam essa visão, como as “campeãs nacionais” e o episódio mais recente envolvendo os irmãos Batista na importação de tilápias, exemplo perfeito de como interesses privados podem se articular com movimentos políticos para garantir vantagens. A desigualdade persistente e a falta de acesso a uma educação de qualidade revelam falhas graves na promoção do mérito e da igualdade de oportunidades, elementos essenciais para qualquer sociedade liberal próspera.

Somam-se a isso os atuais desmandos da Suprema Corte, que evidenciam um funcionamento deficiente do sistema de freios e contrapesos. O caso mais emblemático é a decisão monocrática de um ministro do STF que declarou inválido o rito constitucional de impeachment de ministros, regra que se aplicaria a ele próprio. Esse ato colocou a Corte acima dos demais Poderes da República e fragilizou a capacidade de fiscalização e limitação recíproca entre Executivo, Legislativo e Judiciário.

Para que o Brasil se aproxime dos princípios liberais que contribuíram para a prosperidade dos Estados Unidos, seria necessária uma reforma política orientada à estabilidade governamental, a um intervencionismo reduzido e à proteção efetiva dos direitos individuais. A luta contra a corrupção precisa ser intensificada para garantir um mercado verdadeiramente livre, sem distorções artificiais ou favorecimento aos “amigos do rei”. Investimentos sérios em educação, entendida não apenas como serviço estatal, mas também como área aberta à inovação do setor privado, seriam essenciais para formar uma sociedade preparada para competir no mercado global.

Outra mudança crucial seria a adoção de um federalismo verdadeiro, com autonomia real para que estados possam inovar em políticas econômicas e sociais. Nos Estados Unidos, essa autonomia se manifesta claramente na diferença entre estados tradicionalmente alinhados aos Democratas e aos Republicanos. Califórnia e Texas, por exemplo, materializam abordagens opostas: a primeira mais próxima de políticas progressistas e de acolhimento a imigrantes ilegais, a segunda mais inclinada ao livre mercado, ao reforço de fronteiras e à atração de grandes empresas, como a Tesla. Nada disso seria possível no Brasil atual, cuja estrutura centralizadora impede experimentos regionais, apesar das marcantes diferenças culturais e ideológicas entre seus estados.

Assim, qualquer reforma política séria no Brasil teria de incluir uma revisão profunda do pacto federativo, permitindo que decisões relevantes considerem as particularidades regionais e evitando que soluções uniformes sejam impostas a um país continental que, muitas vezes, mais se assemelha a um Leito de Procusto institucional.

É importante ressaltar que essa análise não desmerece nossos próprios fundadores, pois o estado atual do país não deriva de falhas deles, mas de escolhas políticas equivocadas feitas ao longo da história. O Brasil repetidamente “matou” seus heróis, como José Bonifácio de Andrada e Silva e o Barão de Mauá. Seus valores e projetos de país, se tivessem sido adotados, possivelmente teriam nos conduzido a uma posição muito mais próspera.

Em resumo, os Federalist Papers oferecem uma visão liberal de organização governamental e social que, se adaptada ao contexto brasileiro, poderia transformar o país em uma nação mais próspera, na qual liberdade individual, responsabilidade governamental e inovação econômica sejam realmente protegidas. Seria um país onde o Estado serve ao cidadão e oferece mecanismos para defendê-lo de si próprio, caso deixe de cumprir sua função, e não a situação atual, em que o brasileiro se vê cada vez mais refém e impotente diante de um governo marcado por personalidades autocráticas, grandes egos e pouco apreço pela Constituição e pelo próprio povo.

*Alexandre Sorensen é formado em Ciências Contábeis pela Universidade de São Paulo, atua como Head de Finanças e Operações e como consultor para finanças corporativas.

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