O crescimento polonês silencioso

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Tenho acompanhado os debates sobre economia no submundo da internet (especialmente no X) e percebi uma coisa curiosa: existe um foco enorme em mostrar o quão maravilhoso é o crescimento do “socialismo” chinês.

Este texto não tem a intenção de debater se o que há na China é socialismo, capitalismo, economia politicamente guiada ou qualquer termo econômico que possa ser adotado para explicar a economia chinesa. A intenção deste texto é, na verdade, questionar por que tantas pessoas estão maravilhadas com o “socialismo” chinês quando o milagre polonês levou o país a um patamar de renda muito mais alto, apoiado em instituições de uma democracia liberal e em uma economia de livre mercado.

PPC; (US$ internacional per capita)

Fonte: World Bank Group

A China (27,104.9) está um pouco melhor que o México (25,688.1), abaixo da Argentina (30,175.5) e Costa Rica (30,062.8). Já a Polônia (50,378.1) pode ser comparada com Portugal (50,616.6) e Japão (51,685) e está atrás da Nova Zelândia (55,093.5).

A Polônia tem uma história trágica de invasões, massacres, pobreza e autoritarismo. Em 1939, nazistas e comunistas invadiram, dividiram e passaram a controlar uma nação inteira.

Por motivos diferentes, nazistas e comunistas expulsaram, escravizaram e executaram poloneses por todo o território ocupado. Do lado soviético, o massacre de Katyn é um dos crimes mais famosos e abomináveis cometidos nessa invasão. Do lado nazista, Hitler deu início à sua política de limpeza étnica com ações como a Operação Tannenberg, a Intelligenzaktion, a criação de guetos judaicos e o uso da Polônia como epicentro da Solução Final.

Na economia, o lado nazista fazia a sua Gleichschaltung (sincronização) – um nome bonito para controlar as ações das empresas e bancos sem dizer que controlava as ações das empresas e bancos. Resumindo: os donos podiam continuar sendo proprietários desde que seguissem os comandos do Estado.

No lado comunista, a nacionalização da propriedade privada começou de forma indireta, por meio de pesadas taxas de caráter confiscatório que chegavam a 85% da renda. A nacionalização direta teve início em 1944, com leis aprovadas pelo Comitê Polonês de Libertação Nacional.

Por quatro décadas, os socialistas subjugaram a economia polonesa. Os socialistas capturaram o processo democrático, instalaram uma ditadura de partido único e, uma vez no controle, socialistas socializaram propriedades, nacionalizaram empresas, fazendas e terras.

Durante a maior parte desse período, a economia polonesa permaneceu estagnada. Os salários reais cresciam lentamente, as pessoas tinham pouco acesso a itens básicos, a dívida externa era altíssima e a inflação, galopante — até que, em 1980, a economia entrou em colapso.

As grandes mudanças começaram em 1989, com importantes planos de liberalização. Uma figura decisiva nessa história foi o papa João Paulo II, que se tornou um símbolo da resistência ao regime comunista. A tarefa de liderar as reformas econômicas foi entregue a Leszek Balcerowicz.

Em 1990, o país realizou a primeira eleição direta, na qual Lech Wałęsa foi escolhido como presidente. A primeira eleição parlamentar livre veio um ano depois, em 1991.

O novo governo adotou a “terapia de choque” juntamente com as sugestões do Consenso de Washington para transicionar de uma economia socialista para uma economia de mercado. Nota: do ponto de vista da Escolha Pública, a terapia de choque se baseia na ideia de que, se a mudança for gradualista, os políticos vão desistir das reformas por conta do custo político. Além disso, conforme o tempo passa, os grupos de interesse podem sequestrar as reformas a fim de preservar ou criar privilégios.

Houve uma ampla liberalização institucional, com eliminação de controles de preços, regulações excessivas, burocracia e restrições à entrada de novas empresas nos mercados. À medida que empresas privadas com fins lucrativos foram tomando o lugar das estatais, a economia passou a crescer rapidamente.

A situação fiscal foi estabilizada em 1991, quando o déficit orçamentário girava em torno de 4% do PIB. A implementação de um imposto sobre valor agregado (VAT, comparável a um IVA) ajudou o governo a tornar a arrecadação tributária mais eficiente e previsível.

Nem tudo foram flores, a economia polonesa passou por momentos difíceis, principalmente com desemprego, mas, uma vez estabilizada, a economia polonesa cresceu e hoje já se aproxima, por exemplo, do Reino Unido – que, na opinião do autor, não demorará muito para ser ultrapassado contra o antigo refém do socialismo.

PPC; (US$ internacional per capita)

Fonte: World Bank Group

A economia polonesa apresenta um grau relativamente elevado de liberdade econômica. Há impostos e regulações, é claro, mas, ainda assim, em intensidade menor do que na maior parte dos países.

Em termos puramente econômicos, a Polônia é claramente mais bem-sucedida. Enquanto a Polônia começa a se aproximar dos países desenvolvidos, a China permanece no clube dos países com sérios problemas institucionais e democráticos, alta regulação e pouca liberdade econômica – que performam economicamente no mesmo patamar.

Então, por que a esquerda – sobretudo a extrema-esquerda – endeusa tanto a China? Talvez porque lá as pessoas tenham melhores condições de trabalho, sem jornadas abusivas, sem escala 6×1, com mais tempo livre para “aproveitar a vida”?

Também não parece ser o caso. O trabalhador chinês médio trabalha cerca de 2.300 horas por ano, enquanto o trabalhador polonês médio trabalha em torno de 1.800 horas por ano.

Horas trabalhadas por ano por trabalhador

Se o objetivo declarado é a dignidade humana, não deveríamos olhar com mais atenção para as experiências que realmente elevam a renda, ampliam a liberdade e reduzem a miséria? Por que, então, tantos coletivistas se deslumbram com demonstrações de poderio militar e arranha-céus bem iluminados, mas não se preocupam com aquilo que dizem ser sua prioridade: a vida concreta das pessoas comuns?

Fonte: World Bank Group

Reino Unido: 60,620.4
Polônia: 50,378.1
China: 27,104.9

*Adriano Dorta é estudante de Economia, com foco de pesquisa em Escolha Pública e Economia Política.

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