Leviatã desacorrentado: sobre conter o crescimento dos gastos

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É difícil admitir que um dos meus heróis intelectuais estava errado, mas infelizmente é o caso. Milton Friedman era “a favor de cortar impostos em qualquer circunstância e por qualquer motivo, sempre que possível”. Ele não estava errado em relação à importância de reduzir impostos em si, mas em acreditar que isso seria suficiente para conter o crescimento dos gastos do Leviatã.

Na prática, apenas o corte de impostos não foi suficiente para produzir um Estado menor; pelo contrário, houve uma expansão persistente da dívida para financiar mais gastos e ampliar o escopo de atuação do Estado.

Isso acontece porque, na condição de beneficiários do gasto público, os eleitores tendem a querer maximizar os benefícios que recebem do governo, mas, na condição de pagadores de impostos, procuram minimizar o tamanho da conta que financia esses mesmos benefícios.

É uma decisão racional por ambas as partes. O endividamento permite que os eleitores demandem mais serviços estatais hoje do que demandariam se fossem obrigados a pagar por todo serviço demandado. Pelo mesmo motivo, os eleitores da cidade de Santos demandariam mais serviços estatais se a conta fosse paga majoritariamente pelas pessoas da cidade de São Paulo.

Do outro lado do balcão, os políticos também tendem a preferir aumentar os gastos para satisfazer à demanda dos eleitores, já que futuras dívidas podem ser roladas e, talvez, esses políticos nem venham a estar na próxima legislatura para resolver esse problema.

Para atender a essa demanda, quando a arrecadação de impostos não é suficiente, o governo recorre ao endividamento, pedaladas fiscais, gambiarras ou até “contabilidade criativa” (Mendes, 2023).

Não é como se já não tivéssemos sido alertados: “As grandes nações nunca empobrecem devido ao esbanjamento ou à imprudência de particulares, embora empobreçam, não raro, como efeito do esbanjamento e da imprudência cometidos pela administração pública” (SMITH, A riqueza das nações, p. 290, 1776).

Em 2024, segundo análise do Tesouro Nacional, a carga tributária brasileira alcançou 32,3% do PIB – a maior entre os países da América Latina e do Caribe. Já o Ministério da Fazenda informou que, nos nove primeiros meses de 2025, a arrecadação registrou uma elevação de 3,49% em termos reais (Ministério da Fazenda, 2025).

As contas públicas também se encontram deterioradas. Em setembro deste ano, último resultado divulgado pelo Tesouro Nacional, a dívida alcançou o valor de R$ 8,253 trilhões. É o maior nível da série histórica, atrás apenas do pico registrado em 2020, durante a pandemia (Tesouro, 2025).

Se essa dinâmica continuar — com a geração atual querendo viver às custas das gerações futuras —, a dívida federal chegará a um nível insustentável. Os credores passarão a perceber um risco maior e exigir taxas de juros cada vez mais altas, o que tornará o fardo para os contribuintes do futuro ainda mais pesado.

Friedman tinha razão ao desconfiar de governos com muito dinheiro no bolso, mas subestimou a criatividade fiscal do Leviatã.

Uma boa estratégia é exigir que os gastos públicos correntes sejam pagos com a receita tributária corrente. Ou seja: que todas as demandas dos eleitores atuais sejam pagas pelos contribuintes atuais. Desse modo, não matamos o Leviatã, mas, ao menos, podemos acorrentar esse monstro.

Referências

MENDES, Marcos. Governo do PT faz contabilidade criativa outra vez. Folha de S.Paulo, São Paulo, 21 ago. 2023. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcos-mendes/2023/08/governo-do-pt-faz-contabilidade-criativa-outra-vez.shtml\>. Acesso em: 27/11/25

BRASIL. Ministério da Fazenda. Arrecadação de receitas federais alcança R$ 216,727 bilhões no mês de setembro, informa a Receita. Brasília, 23 out. 2025. Disponível em: <https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2025/outubro/arrecadacao-de-receitas-federais-alcanca-r-216-727-bilhoes-no-mes-de-setembro-informa-a-receita\>. Acesso em: 27/11/25

BRASIL. Ministério da Fazenda. Secretaria do Tesouro Nacional. Relatório Mensal da Dívida Pública Federal — Outubro de 2025. Brasília, 27 nov. 2025. Disponível em: <https://static.poder360.com.br/2025/11/relatorio-divida-publica-27nov2025.pdf\>. Acesso em: 27/11/2025

*Adriano Dorta é estudante de economia, com foco de pesquisa em escolha pública e economia política.

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